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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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avança a fila dos noivos, branca e resignada. Quantos beijos perdidos semorressem! Quantas horas perdidas se o Deus os recolhesse!Olhei para o alto. Nunca o céu foi mais belo nem as estrelas mais lindas.Eis a harmonia dos mundos... Porque a harmonia subsiste. Não há nada que aaltere — pensei. Ou será aquilo lá em cima também dor que não se ouve? Seráaquilo doirado dor tumultuária, imensa, frenética, cujos gritos não chegam cáabaixo?...Brancura de luar ou brancura de neve, é indiferente para o caso. Sãomuitos. São inocentes e morrem. Os seus olhos debalde interrogam estemesmo céu, onde as estrelas parecem faúlhas do meu lume atiradas para oespaço... Será tudo dor? Será tudo aquilo só dor?O frio aumentara na noite côncava e tão branca como a neve das estepes.Adivinho no silêncio um «ah!» de pasmo: as árvores contraíram-se e gritaramde aflição (toda a flor morreu); mas, como não têm boca para gritos, o gritonão se ouve. E que importa gritar, se o som vai só até cem passos dedistância? Depois passou não sei que comunicação misteriosa, que corrente desensibilidade, de tronco para tronco, de raiz para raiz. Uma interrogação no ar:— Porquê? Mas porquê?... As árvores, surpreendidas, não entendemporque sofrem. Ninguém sabe porque sofre. E o silêncio glacial, a atmosferacada vez mais contraída de frio, quase a estalar como um vidro, e lá no alto,sempre, o inalterável panorama celeste... Todas as flores murcharam.

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