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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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abria olhares espantados, se se sentia ferido pela vida, como quem acorda deum sonho para a realidade agressiva.Há nos seus papéis uma parte que decerto se refere a essa época. Todas asfolhas que deixou são encadeadas de pedaços amargos onde por vezes luz oouro da quimera.«Tive esta noite uma sensação de frio no coração: não havia cobertor quemo agasalhasse... Que vale viver? Ilusão morta, ilusão nascida, até que se vaipara a cova, transido e ainda absorto o olhar!... Ponho-me a repassarsensações antigas pela minha alma de agora, e é sempre a mesma coisa, sócom o tédio em lugar da candura... Da juventude ficou-me uma recordaçãoamarga: correria de botas rotas atrás da ilusão. Quem foi que disse que erauma coisa que toda a gente sabia — viver? E por certo a mais duraaprendizagem, para quem tiver nervos e coração...»Com que sorriso de piedade se desesperava por ter acreditado na arte e navirtude, quando só existe, hirto, o ouro. Aqueles que nascidos sem ilusão, ouque cedo a tinham arrancado, triunfaram, mercê da tenacidade: ele, quepassara a juventude absorvido no Sonho, quando acordou, já tarde, viu-sevelho, cambado e escarnecido. E só tinha sofrido...«Porque é que me secaram?», pergunta num dos seus papéis: ilusão ainda,pelo menos por esse tempo. Desta forma procura enganar-se, iludir-sesempre, numa prosa bravia, quase em literatura o tipo que se talhara na vida:

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