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A MORTE DO PALHAÇO

Untitled - Luso Livros

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Oh, os meus amigos! Eis que hoje, porque um deles é feliz, me ponho araciocinar sobre a amizade, e muitas coisas que sentira sem saber exprimi-las eque lera sem saber compreendê-las, me aparecem agora nítidas. É que eu jáalguma vez me alegrei com a felicidade de um amigo? Que é que senti, senãoesta alegria exterior, adquirida e ensinada, quando alguém com quem vivo éfeliz? Inveja ou raiva — e sorrio, a boca seca, o olhar perdido numa quimerade desastres e de amarguras... E no entanto sinto a necessidade de me dedicar,de amar, de sofrer com a dor alheia. É isto afinal: eu só sou amigo dos outrosquando eles sofrem, e preciso que me sejam inferiores, que sejam perseguidospela desgraça, para eu os amar.Que os indiferentes ou os meus inimigos sejam jovens, belos, ricos, que meimporta? Mas que aqueles que vivem comigo sejam mais felizes do que eu,tenham mais talento, calquem a minha vaidade a todos os minutos e mevenham contar, para eu me alegrar, os estúpidos!, como são felizes, enraivecemee faz-me sofrer. Quem odeio são os meus amigos — se triunfam...E isto obriga-me a pensar nos desgraçados e nos grotescos, na dor dosimpotentes, na miséria dos que têm de ser nulos toda a vida; neste roer dainveja, que enche de rugas, que entorna fel na alma e faz das noites ummonologar contínuo, cortado de ilusões e de quedas, e da vida um desespero.Que livro, o livro de um incompleto, que narrasse a sua ambição e os seusódios, que estatelasse com orgulho toda a sua alma, para que os outros serissem da sua impotência! Revoltante e humano, surpreenderia pelos recantos

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