Andréa Máris Campos Guerra - CliniCAPS
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A estabilização psicótica na perspectiva borromeana: criação e suplência<br />
escapa. Quando Lacan nos convida a entrar na fineza dos campos de ex-sistência, pois é<br />
aí que uma análise opera, e localiza na ex-sistência a incidência do gozo em relação aos<br />
dois registros que se lhe opõem, convida-nos por conseqüência ao estudo da topologia.<br />
Apresenta-nos, nessa faceta, o que mais se encontra ao se deparar com os nós. Para ele,<br />
o nó borromeu é a melhor topologia para tratar do furo, pois a ex-sistência permite<br />
exatamente conceber o limite, a não-relação.<br />
E, enfim, na mesma via aberta pela relação à lingüística e pela relação ao tratamento do<br />
gozo, Lacan (1974-75, aula de 15/04/1975) nos fala do encontro, através da descoberta<br />
do nó, com uma realidade operatória. A realidade psíquica, a estrutura do mundo,<br />
consiste em se conseguir palavras, enquanto a realidade operatória trata disso que<br />
foge 70 , do Real. O inconsciente apenas permite que se veja haver um saber não no Real,<br />
mas suportado pelo Simbólico, concebível pelo limite, pelo furo. O Simbólico gira em<br />
falso e consiste apenas no furo que faz. Foi preciso que se fosse ao Real, suposto, para<br />
se ter um pressentimento do inconsciente no sentido do que dá corpo ao instinto.<br />
Trata-se, como se vê, de uma questão clínica por princípio a do encontro de Lacan com<br />
o nó borromeano. O deslocamento de perspectiva operada por Lacan nesse período de<br />
seu ensino encontra na teoria matemática dos nós uma sustentação real, hors de la<br />
langage, mas por ela amparada, que interessa à clínica de maneira geral, e à clínica da<br />
psicose, em particular.<br />
“A formalização matemática é nosso fim, nosso ideal. Por quê? Porque só ela é<br />
matema, quer dizer, capaz de transmitir integralmente” (LACAN, 1972-73/1982, p.<br />
161). Mas se a formalização matemática é a escrita dessas pequenas letras em relação<br />
umas às outras, ela só subsiste à condição de que seja lida, falada, e, com isso, algo já<br />
está de saída perdido. Daí o matema apresentar-se, antes de tudo, como ideal<br />
metalingüístico. E donde, por conseqüência, Lacan ir além e fazer consistir um saber na<br />
medida em que ele se suporta na ex-sistência mostrada nos nós.<br />
Podemos, enfim, dizer que a recorrência de Lacan aos nós se deveu ao seu desejo de<br />
fazer valer uma clínica sustentada pelo Real no sentido de fazer operar o inconsciente<br />
como savoir y faire do sujeito. Tratava-se, à época, de mostrar as condições de<br />
possibilidade do discurso analítico, enquanto redução semântica, mas também redução<br />
70 “E é inclusive no que o mundo é mais fútil (futile), quero dizer, que foge (fuit)” (LACAN, 1974-1975,<br />
aula de 15/04/1975). Lacan ironiza de novo com a homofonia para tratar do que, “fútil”, foge ao<br />
simbólico e se apresenta, ao contrário, como determinação real.<br />
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