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Andréa Máris Campos Guerra - CliniCAPS

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A estabilização psicótica na perspectiva borromeana: criação e suplência<br />

Há uma versão do pai que a “sedi di shacina” ensaia escrever como reguladora de gozo<br />

num nó. Ela, porém, não parece encontrar um ponto de amarração estável. Ao mesmo<br />

tempo em que o “departamento executivo” teria forjado a expressão “sedi di shacina”,<br />

A. se diz autor dessa “criação espontânea”, como rei que é... Ele oscila entre posições,<br />

sem a certeza paranóica de um eu imaginário, narcisicamente investido. Por<br />

conseqüência, o gozo resvala para o corpo, superfície que não o contém pois não<br />

encontra seus pontos de limite para se fazer continente e buraco (zonas erógenas).<br />

“A ‘sedi di shacina’, por exemplo, a frase que revolucionou a vida, revolucionou, né? O<br />

verbo executivo da vontade do pai, né? O departamento executivo. [...] O executivo... É o<br />

Departamento da vontade do pai. Pai, Deus, né? Aí essa ‘sedi de shacina’. [...] Por<br />

exemplo, o Philippe Lyon era um objeto de reto do Departamento do... e o... Ele uma vez<br />

furou a mandioca sem me tocar, quer dizer... E tinha o verbo. E o máximo que eu pude<br />

fazer sobre o departamento executivo foi criar essa frase que é ‘sedi de shacina’. Quer<br />

dizer mata vaca, mata porco, mata franguinho pra comer. Quer dizer, isso tudo é a ‘sedi di<br />

shacina’ em ação. Então, isso é que é, a coisa pode se renovar através dessa frase, sabe<br />

como é que é?” (Relato de A. em entrevista).<br />

Pai e falo aparecem aqui disjuntos e negativizados em relação às suas funções quanto à<br />

castração e à nomeação também. Ao pai mítico, capaz de fustigar e abusar do próprio<br />

filho, A. interpõe o “sedi di shacina”; foi o máximo que ele pôde fazer em relação ao<br />

pai. Seria essa sua père-version?<br />

E. Gozo e corpo<br />

Seu corpo, na ausência da significação fálica, da extração que lhe conferiria uma<br />

unidade narcísica e simbólica, encontra-se à mercê do gozo do Outro.<br />

“Ele dizia que tava com uma dor no peito, uma dor no peito. Até levei ele, na ocasião, ao<br />

cardiologista e tinha nada. Aí diz o psiquiatra que é psicológico. Eu não sei. Mas ele sente<br />

uma dor, ele sente mesmo. Aí ele fala que Jesus tá fincando a cruz dentro do peito dele,<br />

quer dizer que é uma dor forte, né? Que seja psicológico, mas é uma dor. Jesus tá fincando<br />

a cruz nele, ali no peito dele, que ele não gosta do pai, que ele quer acabar com o pai, que é<br />

ele. Mas tem muito tempo que ele não faz isso” (Relato da mãe de A. em entrevista).<br />

O sobrenome paterno de A. é Cruz, A. Cruz. Sem uma significação orientada pelo<br />

apagamento do traço unário ou pela escrita da letra, enquanto condição para a<br />

identificação que funda o nome próprio, este aparece como pedaço real de nome,<br />

retornando como gozo do corpo atormentado. O que não faz nó, articulando real,<br />

simbólico e imaginário, distribuindo uma maneira de gozar, retorna como pedaço de<br />

carne molestada, como cruz que se afunda na carne do corpo. Ali onde sua articulação<br />

não se estabelece, nasce todo o sofrimento do corpo, potencializado pelo uso da droga.<br />

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