Andréa Máris Campos Guerra - CliniCAPS
Andréa Máris Campos Guerra - CliniCAPS
Andréa Máris Campos Guerra - CliniCAPS
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
A estabilização psicótica na perspectiva borromeana: criação e suplência<br />
As palavras se acomodam numa seqüência de pautas, como as notas musicais numa<br />
partitura, sendo o movimento interno do texto assegurado por setas ou pássaros/aviões,<br />
que religam as palavras, movimentando o texto internamente. Seja remetendo a leitura<br />
para a linha seguinte, seja ligando uma palavra à outra, criam uma estética<br />
absolutamente original em sua caligrafia. Interessante notar a brasilidade como aspecto<br />
cultural absorvido por sua estética. Ele alterna, nas pautas de marcação de seu texto, as<br />
cores verde e amarelo sobre um fundo branco, escrevendo suas palavras e signos em<br />
azul, e pousando a bandeira nacional ao final da primeira linha de cada escrito do<br />
Viaduto.<br />
“Na composição de sua escrita e na expressão de sua simbólica, o profeta cria arranjos de<br />
letras dentro de letras. Esse acréscimo ou ‘reforço’, como dizia, explicita ainda mais o<br />
acento divino que ele confere ao texto. Algumas palavras criam uma arquitetura caligráfica,<br />
cifrada somente para aqueles que desconhecem o teor de sua mensagem” (GUELMAN,<br />
2000, p. 74).<br />
Já se adivinha, em termos psicanalíticos, o que está em jogo: letras dentro de letras (ou<br />
significantes suportados por letras); reforço ou acréscimo (do que pode fazer suplência);<br />
arquitetura caligráfica que faz cifra (de gozo) ao decifrar o acento divino do texto...<br />
Guelman não poderia ser mais lacaniano!<br />
É, ao mesmo tempo, uma escrita que faz laço com a crise do mundo contemporâneo,<br />
com a crítica à ética capitalista, evidenciando a tensão entre um mundo em crise e a<br />
possibilidade de sua superação pela acolhida da gentileza. Possui, portanto, endereço<br />
certo.<br />
No início dos anos 90, finaliza sua obra no Viaduto e, com ela concluída, passa a se<br />
assentar numa cadeira, geralmente ao lado da Pilastra 1, acenando para todos como se<br />
estivesse na varanda de sua casa. Na ECO 92, realizada no Rio de Janeiro, conclama as<br />
nações e os presidentes ao uso da gentileza. E de 1993 em diante, com a saúde<br />
fragilizada após uma queda que lhe ocasionou uma fratura na perna, é acometido<br />
também por problemas circulatórios, sentindo cada vez mais dificuldade em andar.<br />
Retorna a Mirandópolis, sua cidade natal, em 1996 e morre em 29 de março com 79<br />
anos, tendo dedicado os últimos 35 anos de sua vida à sua missão.<br />
No dia 20 de Janeiro de 1999, é oficializado o projeto “Rio com Gentileza”,<br />
recuperando a primeira das pilastras do Viaduto do Caju que, após serem pichadas,<br />
haviam sido pintadas de cinza pela Prefeitura. Em outubro do mesmo ano, é realizado<br />
206