Andréa Máris Campos Guerra - CliniCAPS
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A estabilização psicótica na perspectiva borromeana: criação e suplência<br />
faz amarração, faz nó, que respondemos com esta tese. Como pensar a escrita do nó nas<br />
psicoses? Como fazer dela um uso clínico, retornando ao que lhe deu causa? Quando<br />
Lacan apresenta o fenômeno das frases interrompidas em Schreber remetido à escrita do<br />
nó, e não mais aos fenômenos de código e de mensagem, ele localiza ali o<br />
desencadeamento provocado por uma desamarração, ou seja, pelo fato de que alguma<br />
coisa, na escrita do sujeito, não será mais capaz de suplenciar a inexistência do gozo do<br />
Outro. Quais as conseqüências que podemos extrair dessa escrita? Para avançarmos,<br />
será necessária uma breve interpolação sobre a teoria dos gozos em Lacan a fim de que<br />
possamos assinalar, nessa escrita, sua contribuição ao trabalho de estabilização<br />
psicótico.<br />
2.3 Gozo: da Satisfação à Topologia<br />
Com Valas (2001, p. 07), lembramos que Lacan (1969-70/1992), no Seminário 17, O<br />
Avesso da Psicanálise, desejava que o campo do gozo fosse chamado de campo<br />
lacaniano. Lacan utilizou o termo, nos primeiros anos de seu ensino, tal qual Freud o<br />
fazia com Lust, enquanto sinônimo de alegria, prazer, êxtase e volúpia. O caráter<br />
excessivo do prazer, conotado ao júbilo mórbido ou ao horror, era tomado por Freud<br />
pelo termo Genuss. Este não conceituou o gozo, ainda que tenha delimitado seu campo<br />
pelo mais-além do princípio do prazer, regulador do aparelho psíquico.<br />
Para Lacan, prazer e gozo se opõem. O gozo é um conceito que, com ele, ganhou<br />
diferentes vicissitudes, assim como em Freud a teoria da pulsão e a libido. Alguns<br />
autores formalizaram essa discussão no ensino lacaniano (MILLER, 2005; VALAS,<br />
2001), que ganhou recentemente uma sistematização mais objetiva com J.-A. Miller<br />
(2000). Para o autor, cujo esforço de tradução do texto lacaniano o conduz a uma<br />
análise constante de sua obra, teríamos seis paradigmas do gozo em Lacan. Esses<br />
paradigmas, longe de se sucederem cronologicamente, como numa espécie de evolução<br />
teórico-conceitual, podem conviver, não sem conflitos, nos mesmos períodos de<br />
transmissão.<br />
Aqui nos interessa menos essa discussão do conceito ao longo da obra que acentuar as<br />
relações entre topologia borromeana e gozo. Para esse fim, partiremos de uma<br />
apresentação sucinta desses paradigmas, para nos concentrarmos na seguinte questão<br />
clínica: como se apresenta, a partir da teoria borromeana, o tratamento do gozo? Lacan<br />
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