Andréa Máris Campos Guerra - CliniCAPS
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A estabilização psicótica na perspectiva borromeana: criação e suplência<br />
se demonstra, afirma ou refuta o fato do inconsciente em si mesmo, mas antes a<br />
construção erigida em torno dele, como já defendia Freud (1937b/1976). É sobre o<br />
necessário, o que se escreve, e não sobre o contingente, o que se encontra, que se<br />
processaria seu critério de validação.<br />
Isto não implica numa desnecessidade transcendental dos fatos, senão cairíamos num<br />
contra-senso lógico: é necessário partir da clínica, mas os fatos clínicos encontrados não<br />
são os elementos que nos interessam, são secundários... A perspectiva imposta pela<br />
proposta freudiana é a de considerar: (a) a apreensão subjetiva do fenômeno como<br />
elemento necessário à investigação (o que limita a generalização das descobertas<br />
realizadas); (b) a indissociabilidade entre o método de tratamento e de investigação,<br />
pois tanto na clínica quanto na investigação o saber emerge como efeito da colocação<br />
em ato do método; (c) a aplicação transcendental de idéias na leitura do fato empírico, e<br />
a extração das consequências do empírico sobre essa apropriação na discussão racional<br />
do fato.<br />
Como, então, proceder? Freud é claro em seu texto sobre “Os instintos 88 e suas<br />
vicissitudes” (1915b, p. 137) quanto à articulação metodológica que procede da<br />
epistemologia psicanalítica. Para ele, nenhuma ciência começa com conceitos básicos<br />
claros e bem definidos, mas antes com a descrição dos fenômenos, procedendo-se<br />
depois a seu agrupamento, classificação e correlação. Entretanto, mesmo durante essa<br />
fase empírica, não é possível evitar a aplicação de idéias abstratas, advindas da teoria,<br />
ao material encontrado.<br />
Essas idéias se tornarão os conceitos básicos da ciência. E, apesar de apresentarem no<br />
início certa indefinição – necessária –, não apresentam dúvidas quanto a seu conteúdo e<br />
a sua escolha, determinada pela relação necessária que estabelecem com o material<br />
empírico. “Só depois de uma investigação mais completa do campo de observação,<br />
somos capazes de formular seus conceitos científicos básicos com exatidão<br />
progressivamente maior, modificando-os de forma a se tornarem úteis e coerentes<br />
numa vasta área” (FREUD, 1915b, p. 137). Aí sim, se tornariam definições mais<br />
exatas, porém ainda passíveis de alterações em seu conteúdo, à medida que as pesquisas<br />
avançam e novas descobertas se fazem.<br />
Ora, Freud aponta como método na construção do saber psicanalítico uma posição que<br />
88 Leia-se, devido a equívoco da tradução para o português, “As pulsões e suas vicissitudes”.<br />
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