A dádiva da dor - Philip Yancey.pdf (1,8 MB) - Webnode
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todos esses arquivos para os especialistas e permitimos também que examinassem nossos pacientes mais antigos.<br />
Pela primeira vez tínhamos reunido os cirurgiões mais qualificados do mundo e especialistas em lepra numa<br />
mesma sala, concentrados nas mesmas questões médicas. A combinação mostrou-se explosiva. Os cirurgiões de<br />
mão ficaram entusiasmados com nosso índice de sucesso na cura e prevenção de ferimentos. O grupo inteiro<br />
apreendeu a ideia de reabilitação que nos motivara desde os primeiros dias na clínica de mãos com paredes de<br />
barro. Com grande entusiasmo, esse comitê expediu um relatório oficial endossando nossa abor<strong>da</strong>gem à<br />
reabilitação. Logo depois a OMS contratou-me como consultor, e Karigiri tornou-se um ponto de visitas regulares<br />
para os especialistas internacionais em lepra e para todos os novos estagiários patrocinados pela OMS.<br />
De fato, nos anos que se seguiram, cirurgiões e fisioterapeutas de mais de trinta países visitaram a pequenina<br />
ci<strong>da</strong>de no deserto do Sul <strong>da</strong> Índia. Eles podiam estu<strong>da</strong>r medicina e epidemiologia em outras partes, mas nenhum<br />
outro lugar oferecia experiência prática em cirurgia e reabilitação de pacientes de lepra como aquele. Em minhas<br />
visitas semanais a Karigiri, eu costumava jantar na sala de hóspedes, onde me juntava a funcionários <strong>da</strong> área de<br />
saúde de talvez uma dúzia de países. O sonho original de Bob Cochrane, um centro de treinamento internacional<br />
em Karigiri, estava finalmente sendo concretizado.<br />
RESTAURAÇÃO<br />
Para os que conheceram Karigiri nos primeiros dias, o que aconteceu no deserto parecia um milagre <strong>da</strong> natureza,<br />
um oásis de beleza e uma nova esperança brotando num cenário de morte. Vi nessa transformação uma metáfora<br />
do que esperávamos realizar em nossos pacientes. Estávamos tentando remodelar a vi<strong>da</strong> de seres humanos, muitos<br />
dos quais nos procuraram despojados de qualquer esperança. O cui<strong>da</strong>do amoroso poderia fazer por eles o que<br />
estava fazendo para a terra? Em poucos anos a metáfora aproximou-se mais <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de.<br />
Minha mãe, Vovó Brand, continuava ativa nas montanhas e nos trouxe um de seus casos mais desafia<strong>dor</strong>es. Duas<br />
ou três vezes por ano ela aparecia depois de uma viagem de 24 horas a cavalo, ônibus e trem com um espécime<br />
miserável de humani<strong>da</strong>de a reboque, geralmente um mendigo faminto com membros severamente paralisados,<br />
sem alguns dedos e com feri<strong>da</strong>s abertas nas mãos e nos pés. Eu explicava a ela que não tínhamos leitos vazios e<br />
que era preciso escolher cui<strong>da</strong>dosamente nossos pacientes com base em quem mostrava ter o maior potencial de<br />
recuperação. Minha mãe sorria docemente e replicava:<br />
— Eu sei, Paul. Mas faça isso só desta vez, para a sua velha mãe. Ore também sobre o que Jesus gostaria que<br />
você fizesse.<br />
Como sempre ela ganhava a discussão.<br />
O elaborado tratamento de Karigiri muitas vezes ia para "zés-ninguém" como esses. Nossa equipe —- grande<br />
parte <strong>da</strong> qual havíamos contratado nas aldeias locais — não recuava nem virava o rosto. Medo e superstição<br />
haviam desaparecido ao compreenderem a natureza do mal. Eles ouviam sem revolta e sem medo as histórias dos<br />
novos pacientes. Usavam a magia do toque humano. Um ou dois anos mais tarde eu via esses pacientes, como<br />
Lázaro, saírem do hospital e voltarem orgulhosamente para casa ou para o Centro Nova Vi<strong>da</strong>, a fim de aprender<br />
um ofício. Uma doação <strong>da</strong> Cruz Vermelha sueca em pouco tempo tornou possível a instalação de uma fábrica de<br />
tamanho médio, especialmente destina<strong>da</strong> a empregar trabalha<strong>dor</strong>es com lepra, pólio e outras doenças incapacitantes.<br />
A medi<strong>da</strong> que o conhecimento sobre a lepra se espalhou e as barreiras do estigma caíram, tivemos sucesso<br />
ocasional em restaurar os pacientes de lepra à posição social que ocupavam anteriormente . Vijay, um promotor<br />
de Calcutá, foi um de nossos pacientes menos típicos por pertencer a uma casta superior. Ele gozara de uma<br />
carreira bem-sucedi<strong>da</strong> no tribunal até o dia em que descobriu sinais de lepra. Procurou conselho médico e<br />
licenciou-se durante vários meses para submeter-se a tratamento intensivo com sulfonas. Em pouco tempo a<br />
infecção estava sob controle e Vijay recebeu um certificado de negativi<strong>da</strong>de. Embora não oferecesse mais<br />
A Dádiva <strong>da</strong> <strong>dor</strong> » 100