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A dádiva da dor - Philip Yancey.pdf (1,8 MB) - Webnode

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com ela.<br />

Minha esposa fez um dos primeiros estudos sistemáticos sobre o início <strong>da</strong> cegueira nos pacientes de lepra.<br />

Margaret, que chegara a Vellore com experiência em clínica familiar, estudou oftalmologia quando a facul<strong>da</strong>de de<br />

medicina estava com extrema falta de pessoal e não havia ninguém para cobrir essa especiali<strong>da</strong>de. Ela<br />

rapi<strong>da</strong>mente tornou-se perita na cirurgia de catarata e logo organizou "acampamentos de olhos" nos povoados<br />

vizinhos. Trabalhando num prédio de escola emprestado, ou até ao ar livre debaixo de uma árvore, a equipe<br />

cirúrgica realizava de cem a 150 operações de catarata num único dia. Foi num desses acampamentos que ela veio<br />

a conhecer os problemas visuais dos leprosos.<br />

— Eu acabara de realizar a cirurgia ativa e estava guar<strong>da</strong>ndo o equipamento na van para voltar para casa —<br />

lembra ela —, quando notei um grupo de pessoas sentado no chão. Perguntei a um dos obreiros se eram pacientes<br />

que haviam chegado tarde e precisavam ser atendidos. "Oh, são apenas leprosos", disse ele. Oferecime então para<br />

examiná-los, para espanto de meu assistente e também dos enfermos. Eu encontrara to<strong>da</strong> sorte de problemas<br />

oculares na Índia, mas nunca em minha vi<strong>da</strong> vira olhos como aqueles. A superfície do olho, geralmente úmi<strong>da</strong> e<br />

transparente, estava anuvia<strong>da</strong> por cama<strong>da</strong>s espessas de tecido branco cicatrizado. Acendi uma luz junto ao olho de<br />

um dos pacientes e não houve reação. A maioria <strong>da</strong>quelas pessoas ficara total e irremediavelmente cega. Duas <strong>da</strong>s<br />

mais jovens já tinham problemas, mas não haviam perdido completamente a visão, e eu as convenci a irem<br />

comigo a Vellore para serem hospitaliza<strong>da</strong>s.<br />

A partir <strong>da</strong>quele encontro, a missão de Margaret começou a tomar forma. Ela sabia que os bacilos <strong>da</strong> lepra gostam<br />

de reunir-se na córnea, uma <strong>da</strong>s partes mais frias do corpo, e que drogas antilepra poderiam aju<strong>da</strong>r a diminuir o<br />

<strong>da</strong>no ao olho. Gotas de cortisona serviam para controlar a inflamação agu<strong>da</strong> e algumas vezes salvavam um olho.<br />

Ao colocar pequenas gotas de tinta indiana no tecido branco e cicatrizado <strong>da</strong> córnea, Margaret conseguia reduzir o<br />

reflexo brilhante que atormentava alguns pacientes de lepra. To<strong>da</strong>s essas medi<strong>da</strong>s, porém, desvaneciam diante <strong>da</strong><br />

observação mais importante feita por Margaret após examinar centenas de leprosos: muitos estavam ficando cegos<br />

porque não piscavam.<br />

O piscar é uma <strong>da</strong>s maravilhas do corpo humano. Sensor algum é mais sensível à <strong>dor</strong> do que aqueles que ficam na<br />

superfície do olho: um cílio fora do lugar, um cisco, um feixe de luz, uma bafora<strong>da</strong> de cigarro ou até um ruído alto<br />

provocam uma reação muscular instantânea. A pálpebra se fecha, puxando uma coberta protetora de pele sobre o<br />

olho vulnerável e prendendo nos cílios quaisquer partículas estranhas.<br />

Ain<strong>da</strong> mais impressionante, o reflexo intermitente do piscar opera em nível de manutenção o dia inteiro, abrindo e<br />

fechando a pálpebra a ca<strong>da</strong> vinte segundos mais ou menos, a fim de assegurar que o olho se mantenha lubrificado.<br />

A esplêndi<strong>da</strong> mistura de óleo, muco e fluido aquoso que conhecemos como lágrimas fornece à córnea um<br />

suprimento constante de nutrição e limpeza. Sem essa lubrificação, a superfície <strong>da</strong> córnea seca e se torna muito<br />

mais suscetível a <strong>da</strong>nos e ulceração.<br />

Margaret notou que alguns pacientes de lepra não se preocupavam em piscar. Tinham um olhar inquietante e suas<br />

lágrimas se juntavam numa poça na pálpebra inferior até derramarem. Na atmosfera poeirenta <strong>da</strong> Índia, um fio de<br />

lágrimas desperdiça<strong>da</strong>s corria pela face desses pacientes leprosos, cujas células corneanas eram priva<strong>da</strong>s dos<br />

efeitos benéficos de uma pálpebra piscante.<br />

Minha esposa descobriu que a lepra interferia com o reflexo de piscar de duas maneiras. Já sabíamos a primeira,<br />

pois eu havia estu<strong>da</strong>do segmentos desses nervos inchados depois <strong>da</strong> autópsia de Chingleput. Em vista do <strong>da</strong>no aos<br />

nervos, alguns pacientes de lepra (cerca de 20%) sofriam de paralisia do músculo <strong>da</strong> pálpebra, perdendo a<br />

capaci<strong>da</strong>de de piscar. Esses pacientes <strong>dor</strong>miam com os olhos completamente abertos e em pouco tempo a córnea<br />

secava e começava a deteriorar-se. Margaret mostrou-me o efeito <strong>da</strong> paralisia parcial em um menino: seu olho<br />

esquerdo piscava normalmente, enquanto o direito permanecia aberto.<br />

Não compreendemos, porém, que muitos outros pacientes sofriam esse castigo por causa <strong>da</strong> ausência de <strong>dor</strong>.<br />

Tente não piscar e depois de um minuto ou dois sentirá uma leve irritação. A <strong>dor</strong> sussurra antes de gritar.<br />

Mantenha os olhos abertos, entretanto, e essa irritação se transformará gradualmente em <strong>dor</strong> intensa, forçando-o a<br />

A Dádiva <strong>da</strong> <strong>dor</strong> » 92

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