A dádiva da dor - Philip Yancey.pdf (1,8 MB) - Webnode
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Sc eu tivesse de escolher entre a <strong>dor</strong> e o na<strong>da</strong>, escolheria a <strong>dor</strong>.<br />
WIILÍAM FAULKNER<br />
9 Caça<strong>da</strong> policial<br />
Padre Damião, o sacerdote belga no Havaí, soube que tinha lepra ao barbear-se certa manha e não sentir <strong>dor</strong><br />
quando derramou uma caneca de água fervente no pé. Isso aconteceu em 1885. Há muito tempo, as pessoas que<br />
trabalhavam com a lepra já haviam reconhecido que a doença silenciava os sinais de <strong>dor</strong>, deixando o paciente<br />
vulnerável a acidentes. To<strong>da</strong>via, tanto pacientes como profissionais <strong>da</strong> saúde também acreditavam que a lepra<br />
causava diretamente males ain<strong>da</strong> piores. Alguma coisa nela fazia com que a carne necrosasse e morresse.<br />
Quanto mais eu trabalhava com leprosos, porém, mais questionava a opinião comum de como a lepra realizava<br />
seu medonho trabalho. Aprendi logo que as cenas ilustra<strong>da</strong>s em romances e filmes populares {Papillon, Ben-Hur)<br />
não passavam de mito: os membros e apêndices dos leprosos não caem simplesmente. Os pacientes me contaram<br />
que perderam os dedos dos pés e <strong>da</strong>s mãos no decorrer de um longo período de tempo, e meus estudos<br />
confirmaram essa per<strong>da</strong> gradual. Até mesmo um coto de dedo com 25 milímetros geralmente retinha a base <strong>da</strong><br />
unha, o que significava que a junta externa, mais afasta<strong>da</strong>, não fora separa<strong>da</strong> do resto do dedo.<br />
Radiografias revelaram ossos que haviam encurtado misteriosamente, aparentemente devido à septicemia, com a<br />
pele e outros tecidos moles encolhendo de acordo com o comprimento do osso. Algo fazia com que o corpo<br />
consumisse seu próprio dedo por dentro.<br />
Interroguei Bob Cochrane sobre esse assunto em Chingleput.<br />
—Já examinei centenas de dedos encurtados — falei. — Diga-me, como posso saber se um dedo foi machucado<br />
num acidente ou se a lepra é a causa<strong>dor</strong>a do <strong>da</strong>no?<br />
Cochrane respondeu que se ele visse uma mão com todos os dedos encurtados do mesmo tamanho, suporia que o<br />
<strong>da</strong>no era devido à infecção <strong>da</strong> lepra. Se um ou dois dedos fossem muito curtos e os outros normais, julgaria que<br />
algum acidente ou infecção secundária houvesse causado o <strong>da</strong>no.<br />
Essa explicação me satisfez, embora parecesse estranho que algo tão extraordinário como a per<strong>da</strong> de um dedo,<br />
rari<strong>da</strong>de em qualquer doença, tivesse duas causas diferentes na lepra. Comecei então a comparar as medi<strong>da</strong>s dos<br />
dedos durante um período de meses e anos. Descobri que algumas <strong>da</strong>s mais severas per<strong>da</strong>s de dedos estavam<br />
ocorrendo em pessoas que agora possuíam resultados negativos nos exames de lepra. Em outras palavras, o tecido<br />
continuava sendo consumido muito tempo depois de a doença ter sido cura<strong>da</strong>. Com a lepra <strong>dor</strong>mente, por que o<br />
tecido normal estava se destruindo espontaneamente?<br />
A CARNE NÃO É MÁ<br />
Eu não tinha uma solução para essa chara<strong>da</strong> quando comecei as cirurgias de transferência de tendões na Uni<strong>da</strong>de<br />
de Pesquisa de Mão, e o mistério contínuo diminuiu nosso entusiasmo pelos primeiros sucessos. Continuávamos<br />
assombrados pelas predições dos outros médicos de que nossos esforços iriam falhar no final. Embora os<br />
pacientes pudessem auferir alguns benefícios <strong>da</strong> cirurgia a curto prazo, diziam eles, eventualmente os dedos que<br />
havíamos corrigido com tanto esforço iriam apodrecer. Caso esses céticos estivessem certos, eu estava<br />
desperdiçando tempo valioso <strong>da</strong> equipe e aumentando cruelmente a esperança dos pacientes.<br />
A medi<strong>da</strong> que ganhava confiança com a veloci<strong>da</strong>de de cura dos ferimentos cirúrgicos dos pacientes, outros sinais<br />
me preocupavam. Eu ouvia um eco <strong>da</strong> frase maldita "carne má" quase to<strong>da</strong> vez que ia à clínica que instalamos<br />
para tratar as feri<strong>da</strong>s dos pés. Um típico paciente leproso, insensível à <strong>dor</strong>, iria negligenciar uma visita à clínica<br />
até que o o<strong>dor</strong> se tornasse ofensivo, em cujo ponto a feri<strong>da</strong> já tivesse penetrado profun<strong>da</strong>mente no pé.<br />
A Dádiva <strong>da</strong> <strong>dor</strong> » 75