A dádiva da dor - Philip Yancey.pdf (1,8 MB) - Webnode
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anuviar a mente do enfermo. To<strong>da</strong>via, se a <strong>dor</strong> persistir, como um ato de misericórdia pode ser necessário medicálo<br />
até que o paciente não fique suficientemente consciente para comunicar-se.<br />
Ouvi um movimento súbito do outro lado <strong>da</strong> mesa e voltei-me para encarar uma inglesa esguia, com aparência<br />
distinta. A dra. Therese Vanier tinha quase pulado <strong>da</strong> cadeira.<br />
— Sinto muito, doutor Brand, mas tenho de discor<strong>da</strong>r veementemente! Sou médica do asilo St. Christopher<br />
em Londres e esta não é a nossa filosofia! Prometemos aos pacientes que ficarão livres <strong>da</strong> <strong>dor</strong> mais forte, mas<br />
permanecerão também lúcidos. Podemos quase garantir isso.<br />
O vigor <strong>da</strong> reação <strong>da</strong> dra. Vanier me surpreendeu, e depois <strong>da</strong> entrevista fui à sua procura. Ela convidou-me para<br />
visitar o asilo fun<strong>da</strong>do pela Dama Cicely Saunders em 1967, a fim de observar o que haviam aprendido sobre o<br />
caso mais grave, a <strong>dor</strong> terminal. Vários anos depois fiz a viagem. O St. Christopher é, em essência, um lugar<br />
aonde as pessoas vão para morrer. Quarenta por cento dos pacientes admitidos morrem na primeira semana.<br />
— A maioria dos pacientes chega aqui com <strong>dor</strong> severa, nos estágios finais de sua doença — explicou Vanier<br />
durante a minha visita. — A <strong>dor</strong> de uma moléstia terminal é única. A <strong>dor</strong> de uma<br />
fratura óssea, dente cariado, parto ou até recuperação pós-operatória tem sentido e há um fim à vista. A <strong>dor</strong> do<br />
câncer progressivo não tem significado, exceto o lembrete constante <strong>da</strong> morte que se aproxima. Para muitos dos<br />
pacientes que recebemos, a <strong>dor</strong> ocupa todo o horizonte. Eles não podem comer, <strong>dor</strong>mir, orar, pensar ou relacionarse<br />
com as pessoas sem serem dominados pela <strong>dor</strong>. Aqui no St. Christopher tentamos combater esse tipo específico<br />
de <strong>dor</strong>.<br />
Depois de conversar com a dra. Vanier, encontrei-me com a dra. Cicely Saunders, que me contou a origem do<br />
movimento pró-asilo. Ela havia fun<strong>da</strong>do a primeira instituição, contou-me, depois de ver como a profissão médica<br />
li<strong>da</strong>va mal com a morte. Um hospital moderno envi<strong>da</strong>va todos os esforços para cui<strong>da</strong>r de um paciente com alguma<br />
perspectiva de recuperação, mas o sem esperança era um estorvo, um emblema vergonhoso dos fracassos <strong>da</strong><br />
medicina. Os médicos evitavam os pacientes com doenças terminais ou falavam com eles triviali<strong>da</strong>des ou meiasver<strong>da</strong>des.<br />
O tratamento para a <strong>dor</strong> desses doentes tendia a ser totalmente inadequado. Os pacientes terminais<br />
morriam com medo e muito solitários nos hospitais cheios e movimentados.<br />
O tratamento padrão dos pacientes terminais ofendeu as profun<strong>da</strong>s sensibili<strong>da</strong>des cristãs <strong>da</strong> dra. Saunders.<br />
Enfermeira na época, ela matriculou-se na escola de medicina aos 33 anos com o propósito expresso de descobrir<br />
um meio melhor de aju<strong>da</strong>r os que estavam morrendo. Depois de trabalhar numa casa para os agonizantes dirigi<strong>da</strong><br />
por irmãs de cari<strong>da</strong>de, ela escreveu: "O sofrimento só é intolerável quando ninguém se importa. Vemos<br />
continuamente que a fé em Deus e em seu cui<strong>da</strong>do fica infinitamente mais fácil mediante a fé em alguém que<br />
mostrou bon<strong>da</strong>de e simpatia". Ela acabou fun<strong>da</strong>ndo o St. Christopher, que deu origem ao movimento mundial a<br />
favor dessa causa. Saunders nota que o asilo ressuscita um tema <strong>da</strong> I<strong>da</strong>de Média, quando a Igreja considerava o<br />
cui<strong>da</strong>do dos que estavam à beira <strong>da</strong> morte como uma <strong>da</strong>s sete virtudes fun<strong>da</strong>mentais.<br />
Em seu trabalho conjunto, Saunders e Therese Vanier puseram em prática a abor<strong>da</strong>gem "preventiva" <strong>da</strong> <strong>dor</strong> <strong>da</strong><br />
doença terminal. Em muitos hospitais a ordem para a medicação <strong>da</strong> <strong>dor</strong> diz "PRN" (ou seja, pro nata, "conforme<br />
necessário"). Essa ordem deixa os medicamentos à discrição dos enfermeiros, que foram seriamente advertidos<br />
sobre os perigos do hábito. Como resultado, se a <strong>dor</strong> volta, um paciente em agonia pode ter de suplicar pela<br />
próxima injeção. Saunders tentou uma abor<strong>da</strong>gem diferente. Ela determinou cui<strong>da</strong>dosamente dosagens<br />
antecipa<strong>da</strong>s, depois deixou-as à disposição do paciente em intervalos regulares de modo que a <strong>dor</strong> nunca voltasse.<br />
Um nível constante de medicamento, conforme descobriu, aju<strong>da</strong> a evitar tanto a <strong>dor</strong> severa como o excesso de<br />
se<strong>da</strong>ção. Saunders testou também dosagens controla<strong>da</strong>s pelo paciente e verificou que pacientes terminais<br />
raramente se excedem na medicação.<br />
Sob supervisão, eles geralmente preparam um programa que controla a <strong>dor</strong> 24 horas sem qualquer perturbação<br />
mental. O propósito do St. Christopher reflete o bom senso <strong>da</strong> dra.<br />
Saunders quanto ao cui<strong>da</strong>do com os agonizantes. A maioria dos pacientes mora em compartimentos de quatro<br />
leitos, e não em quartos particulares, com espaço suficiente para que os membros <strong>da</strong> família possam permanecer<br />
A Dádiva <strong>da</strong> <strong>dor</strong> » 157