A dádiva da dor - Philip Yancey.pdf (1,8 MB) - Webnode
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objeto ideal para nossas experiências porque a pele do porco tem proprie<strong>da</strong>des similares às <strong>da</strong> pele humana.<br />
Anestesiávamos Sherman e o colocávamos num meio-molde de gesso para mante-lo imóvel. Aplicávamos a<br />
seguir uma pressão bem leve em determinados pontos nas suas costas. Um pistão cilíndrico mantinha a pressão<br />
num nível baixo, mas constante, durante um período de cinco a sete horas. Os termogramas subsequentes<br />
mostravam claramente que essa pressão bem leve causava inflamação na pele e debaixo dela. O lugar <strong>da</strong> pressão<br />
ficava vermelho, e o pêlo não mais crescia ali. Se mantivéssemos por mais tempo a pressão, uma feri<strong>da</strong> surgiria<br />
nas costas de Sherman.<br />
Tenho muitas fotos dos pontos de pressão nas costas de Sherman, que ilustram perfeitamente o processo <strong>da</strong>s<br />
escaras provoca<strong>da</strong>s pela permanência prolonga<strong>da</strong> na cama, a perdição dos hospitais modernos. Tratei muitas<br />
escaras, e algumas são tão horríveis quanto qualquer feri<strong>da</strong> de superfície que podemos encontrar num hospital de<br />
campo de batalha. To<strong>da</strong>s as escaras têm a mesma causa: estresse constante. Uma pessoa paralisa<strong>da</strong> ou insensível<br />
tende a ficar deita<strong>da</strong> no mesmo lugar hora após hora, cortando o suprimento de sangue, e depois de cerca de<br />
quatro horas de pressão contínua, o tecido começa a morrer. As pessoas com um sistema nervoso em boas<br />
condições não ficam com escaras. Um fluxo permanente de mensagens silenciosas <strong>da</strong> rede de <strong>dor</strong> manterá um<br />
corpo ativo debatendo-se no leito, redistribuindo o estresse entre as células do corpo. Se essas mensagens<br />
silenciosas forem ignora<strong>da</strong>s, a região atingi<strong>da</strong> enviará um grito mais alto de <strong>dor</strong> que força o indivíduo a mu<strong>da</strong>r as<br />
nádegas de posição ou a virar-se na cama para aliviar a pressão.<br />
(Noto um padrão claro sempre que dou uma palestra. Enquanto consigo manter a atenção <strong>da</strong> audiência, vejo muito<br />
menos inquietação. Todos estão ouvindo atentamente minhas palavras e, portanto, silenciando ou ignorando essas<br />
mensagens sutis de desconforto. Porém, no momento em que minha palestra começa a cansar, a concentração<br />
mental dos ouvintes se desvia e eles instintivamente passam a ouvir as leves mensagens de estresse <strong>da</strong>s células<br />
sobre as quais ficaram sentados tempo demais. Posso julgar a eficácia do meu discurso observando a frequência<br />
com que os membros <strong>da</strong> audiência cruzam e descruzam as pernas e mu<strong>da</strong>m de posição nos assentos.)<br />
Nossos estudos sobre o estresse constante nos aju<strong>da</strong>ram a compreender por que um paciente de lepra tem tamanha<br />
dificul<strong>da</strong>de para encontrar sapatos confortáveis. Quando cheguei a Carville, fiquei surpreso ao descobrir que os<br />
pacientes norte-americanos tinham quase a mesma incidência de pés amputados que os indianos, muitos dos quais<br />
an<strong>da</strong>vam descalços. O problema, como descobrimos, era o uso de sapatos destinados a pacientes que podiam<br />
sentir <strong>dor</strong>. O risco do estresse constante por causa de sapatos que não se ajustam é tão perigoso quanto o risco do<br />
ferimento direto no pé descalço. Se meus sapatos parecem apertados, afrouxo os cordões ou removo o calçado,<br />
colocando chinelos macios. O paciente de lepra, que não sente <strong>dor</strong>, continua com um sapato apertado mesmo<br />
depois que a pressão interrompeu o suprimento de sangue. José, o vende<strong>dor</strong> de móveis <strong>da</strong> Califórnia, perdeu<br />
alguns dos dedos do pé por causa do estresse constante silencioso. Os terapeutas de Carville começaram a exigir<br />
que os pacientes mu<strong>da</strong>ssem de sapatos pelo menos a ca<strong>da</strong> cinco horas, uma medi<strong>da</strong> simples que, se fosse segui<strong>da</strong>,<br />
evitaria feri<strong>da</strong>s causa<strong>da</strong>s pela pressão isquêmica.<br />
Estresse repetitivo<br />
Em retrospecto, o produto mais valioso de duas déca<strong>da</strong>s pesquisando a <strong>dor</strong> foi um novo discernimento sobre como<br />
estresses comuns e "inofensivos" podem causar <strong>da</strong>nos severos à pele, caso sejam repetidos milhares de vezes.<br />
Notamos essa síndrome pela primeira vez na Índia enquanto experimentávamos diferentes tipos de calçados, mas<br />
os laboratórios de pesquisa de Carville nos forneceram as ferramentas para entender exatamente como o estresse<br />
repetitivo funciona.<br />
Durante várias déca<strong>da</strong>s eu ficara intrigado com o motivo que tornava o simples ato de caminhar uma grande<br />
ameaça para o paciente leproso. Como será, pensava eu, que uma pessoa saudável pode an<strong>da</strong>r quinze quilômetros<br />
sem prejudicar-se, enquanto um leproso não consegue? Na tentativa de obter uma resposta a essa pergunta, os<br />
engenheiros de Carville montaram uma máquina de estresse repetitivo que reproduzia os estresses do ato de an<strong>da</strong>r<br />
e correr. O pequeno martelo mecânico <strong>da</strong> máquina bate repeti<strong>da</strong>mente com uma força calibra<strong>da</strong> na mesma área,<br />
correspondendo àquela que uma pequena região do pé pode suportar enquanto an<strong>da</strong>.<br />
Usamos ratos de laboratório para essas experiências, fazendo-os <strong>dor</strong>mir e amarrando-os à máquina que começava<br />
A Dádiva <strong>da</strong> <strong>dor</strong> » 109