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A dádiva da dor - Philip Yancey.pdf (1,8 MB) - Webnode

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ver<strong>da</strong>de em to<strong>da</strong> a minha vi<strong>da</strong>. Quase to<strong>da</strong>s as minhas lembranças de felici<strong>da</strong>de agu<strong>da</strong> envolvem algum elemento<br />

de <strong>dor</strong> ou de esforço: uma massagem depois de um longo dia no jardim, a coceira de uma mordi<strong>da</strong> de inseto, o<br />

calor de uma lareira depois de um passeio numa nevasca. Muitos incluem o elemento do medo ou risco, como<br />

aconteceu na primeira vez que esquiei montanha abaixo — adotei o esporte aos sessenta anos — quando, por<br />

engano, acabei voando por uma pista reserva<strong>da</strong> aos esquia<strong>dor</strong>es mais experientes. O vento assobiava, meus<br />

músculos estavam tensos, meu coração acelerado, mas quando cheguei ao final senti-me por um momento como<br />

um campeão.<br />

A <strong>dor</strong> e o prazer não se aproximam de nós como opostos, mas como gêmeos estranhamente ligados. Gosto de um<br />

banho quente no final de um dia cansativo, especialmente quando sinto <strong>dor</strong> nas costas. A água precisa estar bem<br />

quente. Eu me equilibro nas beira<strong>da</strong>s <strong>da</strong> banheira de modo a ficar suspenso logo acima <strong>da</strong> água, depois me abaixo<br />

devagar, as costas primeiro. Quando a temperatura esta exatamente no ponto, só posso entrar um pouco de ca<strong>da</strong><br />

vez. A primeira sensação <strong>da</strong> água sobre a pele é interpreta<strong>da</strong> pelas minhas extremi<strong>da</strong>des nervosas como <strong>dor</strong>. Aos<br />

poucos, elas consideram o ambiente seguro e depois informam que é um formigamento prazeroso. Algumas vezes<br />

não tenho certeza se estou sentindo prazer ou <strong>dor</strong>. Um grau mais quente certamente traria <strong>dor</strong>; um grau mais frio<br />

diminuiria o prazer.<br />

Um dia li o resumo do filósofo Lin Yutang sobre a antiga fórmula chinesa <strong>da</strong> felici<strong>da</strong>de. Quando examinei sua<br />

lista dos trinta prazeres supremos <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, fiquei espantado ao descobrir a <strong>dor</strong> e o êxtase indiscutivelmente<br />

misturados. "Estar seco e sedento numa terra quente e poeirenta e sentir grandes gotas de chuva em minha pele<br />

nua — ah, não é isto felici<strong>da</strong>de? Sentir coceira numa parte íntima do meu corpo e finalmente escapar de meus<br />

amigos e ir para um lugar escondido onde posso coçar — ah, não é isto felici<strong>da</strong>de?" Ca<strong>da</strong> uma <strong>da</strong>s felici<strong>da</strong>des<br />

supremas, sem exceção, incluía algum elemento de <strong>dor</strong>.<br />

Li mais tarde a seguinte passagem no livro Confissões, de Agostinho:<br />

O que acontece, portanto, dentro <strong>da</strong> alma, uma vez que ela se deleita mais quando as coisas que ama são<br />

encontra<strong>da</strong>s ou restaura<strong>da</strong>s à mesma, do que se as tivesse sempre possuído? Outras coisas dão testemunho disto e<br />

to<strong>da</strong>s estão cheias de provas que gritam alto "Assim é!". O general vitorioso tem o seu triunfo: to<strong>da</strong>via, a não ser<br />

que tivesse lutado, jamais teria alcançado a vitória, e quanto maior o perigo na batalha, tanto maior a alegria no<br />

triunfo. A tempestade sacode os marinheiros e ameaça fazê-los naufragar: todos empalidecem com a ideia <strong>da</strong><br />

morte próxima. A seguir, o céu e o mar se acalmam e eles se regozijam muitíssimo, assim como haviam também<br />

temido excessivamente. Um amigo querido está doente e seu pulso nos diz que seu caso é grave. Todos os que<br />

desejam vê-lo curado ficam também mentalmente enfermos. Ele se restabelece e embora ain<strong>da</strong> não ande com seu<br />

vigor antigo, há mais alegria do que houvera antes quando an<strong>da</strong>va bem e estava são.<br />

"Em to<strong>da</strong> parte uma alegria maior é precedi<strong>da</strong> por um sofrimento maior", conclui Agostinho. O ocidente abastado<br />

precisa lembrar-se desta visão do prazer. Não ousemos permitir que nossas vi<strong>da</strong>s diárias se tornem tão<br />

confortáveis que não mais sejamos desafiados a crescer, a buscar a aventura, a correr riscos. O autodomínio é<br />

construído quando você corre mais do que correu antes, quando sobe uma montanha mais alta do que qualquer<br />

outra, quando toma um banho de sauna e depois rola na neve. As aventuras por si mesmas provocam alegria; por<br />

outro lado o desafio, o risco e a <strong>dor</strong> se combinam para estimular uma confiança que pode servir muito bem em<br />

tempos de crise.<br />

Em resumo, se eu passar a vi<strong>da</strong> buscando o prazer por meio de drogas, conforto e luxo, ele irá provavelmente<br />

esquivar-se de mim. O prazer duradouro tem mais probabili<strong>da</strong>de de vir como um prêmio extra de um investimento<br />

que eu mesmo fiz- E mais provável que esse investimento inclua a <strong>dor</strong> — é difícil imaginar o prazer sem ela.<br />

A TRANSFORMAÇÃO DA DOR<br />

Quando volto à Índia a serviço do hospital, gosto de visitar alguns de meus antigos pacientes, especialmente<br />

Namo, Sa<strong>da</strong>n, Palani e os demais do primeiro Centro Nova Vi<strong>da</strong>. Eles são agora homens de meia-i<strong>da</strong>de, com<br />

cabelos grisalhos, ralos, e rugas ao re<strong>dor</strong> dos olhos. Quando me vêem, tiram os sapatos e as meias e mostram<br />

orgulhosamente os pés que conseguiram manter livres de feri<strong>da</strong>s todos aqueles anos. (Sa<strong>da</strong>n está especialmente<br />

A Dádiva <strong>da</strong> <strong>dor</strong> » 183

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