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ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...

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109<br />

Uma sensação de ventura infinita espalhava-se em todo o corpo.<br />

Começava a sentir no próprio sangue impulsos nunca<br />

experimentados, uma vontade ingênita de ceder aos caprichos do<br />

negro, de abandonar-se-lhe para o quê ele quisesse - uma vaga<br />

distenção dos nervos, um prurido de passividade. (BC, p.30)<br />

O prestígio e poder vinculados ao masculino são realçados ao longo do<br />

romance, inclusive pela descrição do corpo de Amaro, vinculado à força e potência,<br />

marcadores da masculinidade, surgindo como o provedor, enquanto Aleixo, no<br />

relacionamento homogenital, é descrito como amante, como quase-mulher, passivo e<br />

protegido. O jogo de poder hierarquizado que se estabelece entre os dois, apresentado<br />

pelo olhar do narrador, nos conduz ao cerne da questão em que se baseia a construção<br />

dos papeis exercidos numa sociedade patrilinear. O narrador, atrelado e influenciado<br />

pelo cânone literário e cultural naturalista, representa esta relação como algo patológico,<br />

herança da genética de Bom-Crioulo. Assim, através de um jogo de interesses,<br />

notadamente burgueses, que perpassam o romance, o narrador circunscreve, deste<br />

modo, as múltiplas faces da homogenitalidade masculina a questões deterministas.<br />

Questões essas que condenam esta categoria e as reduzem ao termo ‘homossexual’ que,<br />

ao ser criado, já trazia em si marcas de negatividade, “dando-lhe uma essência nominal<br />

e uma realidade objetiva inexistente antes da radicalização e da moralização burguesa<br />

do sexo nos finais do século XIX e começo do XX” (COSTA, 2002, p.60).<br />

No romance é observável o respaldo que é dado, pelo narrador, à conduta<br />

comportamental virilizada, ainda que no interior de uma relação homossexual. Bom-<br />

Crioulo indica aos seus leitores que, dentro daquele mundo e de suas organizações<br />

rigidamente marcadas, o jogo de poder é exercido pela força que emana do falus, ao<br />

sujeitar e submeter o outro, através das múltiplas manifestações de poder, inclusive as<br />

sexuais, legalmente associadas ao desempenho da masculinidade “autorizada” a se<br />

manifestar. Aleixo, - o femeado - por quem Bom-Crioulo - o ativo - está apaixonado, é<br />

induzido por Amaro a descobrir zonas de prazer que o desprivilegiam perante seus pares<br />

masculinos, já que está exercitando papel sexual não condizente, por atavismo cultural,<br />

a sua identidade e a seu gênero. Ao permitir e ceder ao desejo sexual de ser passivo,<br />

Aleixo deixa à mostra a instabilidade do alicerce da cultura machista que está fincada no<br />

ato de penetração, como o modelo compulsório positivo a seguir por todos os homens.<br />

No século XIX, seguindo o pensamento de Sohn (2009), a questão da masculinidade<br />

tinha como fulcro a valorização do pênis. Deste modo, segundo ela, aquele que era ativo

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