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ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...

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Os grandes navegadores portugueses 4 , que com sua esquadra outrora singravam os<br />

oceanos do mundo, agora precisavam remar barcos de aluguel para sobreviver.<br />

A pequena embarcação vinha chegando para a ilha, sem toldo<br />

remada por um galego de suíças meio velho. Trazia à popa, no<br />

recosto do paineiro, o dístico – Luis de Camões, por cima de uma<br />

figura a óleo, que tanto podia ser a do grande épico como de<br />

qualquer outra pessoa barbada, em cuja fonte se houvesse desenhado<br />

uma coroa de louros. Nesta infame garatuja, o poeta tinha o olho<br />

esquerdo vazado, o que, afinal de contas, não interessava ao negro.<br />

__ Quer me levar ao cais? Perguntou Bom-Crioulo ao<br />

português.<br />

__ É já! Disse o homem atracando. O Luis de Camões<br />

não dorme. (BC, p.76) 5<br />

Essa é uma das ironias, entre outras existentes em Bom-Crioulo que<br />

comprova que o Naturalismo brasileiro se posicionava contra as formas de<br />

conformismo que poderiam tornar nossa escola similar ou mera cópia das<br />

congêneres europeias. Na verdade, nossa literatura finissecular assumia também a<br />

indignação social e não se resignava com a maneira como estava organizada nossa<br />

sociedade neste recorte histórico. Estes aspectos citados nos parágrafos anteriores,<br />

embora sejam fatores de diferença da escola naturalista brasileira em relação ao<br />

Naturalismo europeu, são, como tudo que é exterior à obra, componentes que tem<br />

função e espaços primordiais e necessários à narrativa naturalista brasileira. Se estes<br />

estivessem fora desta lógica, perderiam o sentido de estar inseridos nela, pois para<br />

terem sustentação na narrativa, obrigatoriamente, devem fazer parte do enredo.<br />

4 No século XIX, de acordo com PEREIRA (2002), os portugueses, que no Brasil Colônia gozavam de<br />

certos privilégios, passaram, com a independência do Brasil, a ser objetos de hostilidade, devido ao<br />

recente passado como opressores. Discorre ainda este autor que a alcunha de galegos dada aos<br />

portugueses no Rio de Janeiro, no século XIX, devia-se ao fato da emigração clandestina dos portugueses,<br />

com passaportes falsos, através do porto de Vigo, na Galícia espanhola.<br />

5 A partir dessa, todas as citações de Bom-Crioulo serão apresentadas como BC, seguidas do número de<br />

página, edição de 1983 citada na bibliografia.<br />

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