ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...
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urburinhos. Bom-Crioulo aluga um quarto, sob o disfarce de que ele e Aleixo são<br />
amigos marinheiros, de modo que possam viver em mancebia. Dona Carolina, dona da<br />
pensão, na qual o “quartinho” do casal está localizado, é a única que “desconfia” ou que<br />
enxerga a verdade sobre os dois marinheiros, pois “ela sabia que o negro não era<br />
homem para mulheres...” (BC, p.36). Para ela, uma prostituta, ou seja, também uma<br />
marginalizada socialmente, o casal homossexual poderia desvelar a relação, já que são<br />
igualmente excluídos sociais.<br />
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E desfiou a história do grumete. – Agora D. Carolina vai nos<br />
arranjar um quartinho, mesmo que seja no sótão, rematou; mas um<br />
quartinho sem luxo, para quando viermos à terra. – uma cama ou<br />
duas? Perguntou sorrindo a quarentona. – como quiser... Marinheiro<br />
é gente que dorme aos quatro, aos cinco... aos cinquenta! Se<br />
houvesse uma caminha larga... – Arranja-se, meu Deus, arranja-se,<br />
tornou a portuguesa. O comodozinho de cima esta desocupado, e,<br />
quer que lhe diga?, eu acho que ficavam melhor... Sempre risonha e<br />
trêfega, sufocada pelo calor, a mulher piscou o olho a Bom-Crioulo.<br />
–Então, já sei que vens outro... Bendita viagem! Ou o mar ou as tais<br />
cantáridas!... Riram, compreendendo-se... (BC, p. 37).<br />
No Barão de Lavos, a censura da relação homogenital do barão com Eugênio<br />
passa pelos olhares de censura daqueles que comungavam do mesmo nível hierárquico<br />
social de D. Sebastião. Em razão disso, o barão, como homem de posses, mantinha um<br />
atelier alugado na Rua da Rosa, onde costumava levar “mulheres fáceis” e “garotos<br />
complacentes” e “não os largava enquanto não conseguisse, a impulso de astúcia e de<br />
dinheiro, conduzi-los à Rua da Rosa e analisar-lhe a nudez” (BL, p. 57). É justamente<br />
nesta casa que o Barão aloja seu amante Eugênio e o deixa sob a custódia da mulher que<br />
cuidava da<br />
conservação e arranjo da casa alugada pelo barão, que lhe disse,<br />
apenas ela entrou: – Ouviu, Sr.ª Ana?... De hoje em diante este rapaz<br />
fica a morar nesta casa. – Sim, Senhor Barão. – A senhora cumpre<br />
as ordens dele como se fosse eu que lhas desse. – Sim, Senhor<br />
barão. (BC, p.60)<br />
Nos dois romances podemos divisar, de modo contundente, a germinação de<br />
uma sub-cultura homossexual transgressora na literatura finissecular de língua<br />
portuguesa tanto do lado de lá do Atlântico – Portugal – como do lado de cá – Brasil.<br />
Naqueles vemos respaldada a seguinte afirmação: “a transgressão é a própria evolução<br />
criadora onde a literatura ocupa espaço tão importante” (KRYSINSKY, 2007, p. XIII).