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ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...

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literariamente interessante”. No final, a insinuação maldosa:<br />

“Provavelmente o Sr. Caminha já foi embarcadiço, talvez grumete<br />

como o seu louro Aleixo” – o que ignoro.<br />

O crítico afirma, mais uma vez citando Caminha ipsis litteris, que vinha “de<br />

muito longe essa guerra à verdade na arte. Inda não saiu dos prelos obra naturalista que<br />

não fosse tachada de imoral, desde que o grande Balzac atirou em circulação seu<br />

primeiro livro de análise” (CAMINHA, apud. AZEVEDO, 1999, p.123). Possivelmente<br />

o fato de o Naturalismo brasileiro ter tido como mentores principais autores nordestinos,<br />

como o maranhense Aluízio Azevedo e o cearense Adolfo Caminha, poderia justificar<br />

ainda mais a resistência da crítica reconhecida da época a esse movimento literário.<br />

A posição geográfica e intelectualmente periférica dos escritores<br />

naturalistas em parte explica a hostilidade com que seus romances<br />

foram recebidos na capital do país. Mais importante do que isso, a<br />

posição periférica de que eles gozavam no distante Nordeste<br />

(mesmo que, na busca de glórias literárias, tenham por fim se<br />

dirigido ao Rio de Janeiro) os permitiu ter uma visão ex-cêntrica do<br />

Brasil, em oposição à visão cêntrica de escritores cariocas, como<br />

Machado de Assis. Desse ponto de vista descentralizante, e<br />

animados pela vontade de saber, os escritores naturalistas foram<br />

capazes de dar voz a setores até então marginalizados. (MENDES,<br />

2000, p.216)<br />

As várias celeumas que seguiram o lançamento de Bom-Crioulo, cujo teor<br />

atingiu os píncaros da acidez, deveram-se a sua temática, e também ao fato de<br />

encontrarmos aí um protagonista negro, ex-escravo, homossexual e marinheiro. O<br />

romance, assim, vinha expor um tema tabu e silenciado pela marinha, mas que há muito<br />

grassava em seus quadros. A homossexualidade praticada na vida de bordo era algo<br />

deveras delicada, vexatória e desmoralizante tanto à Marinha Imperial como aos olhos<br />

sociais da época. Contudo, estas práticas sexuais masculinas injuriadas na vida de<br />

bordo, vistas como vício repugnante eram patentes e colocavam em xeque valores<br />

cultuados pelo heterocentrismo militar. Muitos críticos agrediram ferrenhamente o livro,<br />

que, mesmo assim, circulou sem grandes impedimentos. Vários dos críticos não se<br />

limitaram a comentar a construção literária de Caminha, mas também passaram a rotulá-<br />

la conforme seus valores e juízos morais. Ribeiro nos relata que, na opinião de parte da<br />

crítica literária da época, Bom-Crioulo “não devia sequer ser pego com as mãos, mas<br />

com uma pá que o atirasse longe, no lixo” (RIBEIRO, 1957, p.58). Vejamos a própria<br />

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