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ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...

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167<br />

Depois vieram os bárbaros do Norte inocular sangue novo no<br />

derrancamento crapuloso do Império. A transfusão foi crudelíssima.<br />

Operaram destruindo. Mas por trás da arrogância bestial da sua<br />

arremetida vinha apontando a generosa unção do novo mundo.<br />

Aquela treva aparente mascarava uma alvorada. Eles traziam da<br />

penumbra druídica das suas florestas os elementos sociais que<br />

faltavam ao ocidente gasto e decrépito. (BL, p. 28)<br />

A despeito da defesa da mistura das raças que é evidenciado neste trecho<br />

selecionado, o narrador é contraditório quando negativiza a miscigenação que houve na<br />

ancestralidade do barão. Segundo a ideologia projetada do narrador, o barão como fruto<br />

de hibridização, estampa no cerne e na pele as marcas da decadência e degeneração da<br />

mistura racial. O narrador, neste momento, segue a escola naturalista ipsis litteris,<br />

seguindo à risca teorias científicas sobre as raças e interesses políticos que apoiavam a<br />

república como forma de governo em detrimento da monarquia. Deste modo, o<br />

narrador, ao tomar posição em favor do “glorioso passado” descobridor português, torna<br />

o modelo colonizador como algo benéfico à nação e parâmetro a seguir pelas novas<br />

gerações. Ao mesmo tempo, abomina o momento atual e aqueles nobres considerados<br />

impuros racialmente e que trouxeram a desgraça e a inércia aos valores lusitanos<br />

cantados nos versos camonianos.<br />

“No barão de Lavos confluíam poderosamente as qualidades todas de um<br />

pederasta” (BL, p.29). Segundo a tradição, o espírito de conquista, a aventura e o risco<br />

deveriam ser qualidades agregadas ao espírito dos conquistadores e isto é o que não se<br />

via no barão – metáfora da monarquia portuguesa. Na verdade, o narrador se incumbe<br />

de imputar negativamente diversas vezes no personagem-título estes sinais da<br />

fragilidade que ironicamente o feminizavam. De acordo com o olhar do narrador, o<br />

barão aparentava<br />

conformação feminina: - cabeça pequena, ombros estreitos e<br />

ladeiros, bacia ampla, rins muito elásticos, os pés metendo para<br />

dentro. O rosto, dum alvo rosado lanugento e macio, tinha uma<br />

expressão menineira e ingênua, um ar tocante de fragilidade e<br />

doçura. Mas não inspirava simpatia; traía-lhe a inconsistência do<br />

carácter essa linha apagada, miúda das feições. O olhar era de<br />

ordinário baixo; não cruzava com firmeza; as pálpebras desciam<br />

logo, a garantir-lhe a inviolabilidade de abismo. (BL, p. 31-32)

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