ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...
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seus inconscientes devido ao constante e insistente aparato repressor do policialesco<br />
heterossexual.<br />
Na injúria, é o íntimo que é visado, o mais profundo do ser, o que<br />
toda a tradição espiritualista chamou de “alma”. E, se a injúria<br />
efetivamente recebida provoca um eco tão forte na consciência<br />
daquele que a recebe, é porque essa “alma” foi fabricada pela<br />
socialização num mundo de injúria e de inferiorização (ERIBON,<br />
2008, p.86).<br />
Assim, os homossexuais conscientes de sua sujeição tendem a viver, desde<br />
tempos passados, discretamente sob disfarces ou dentro do “armário”. Contudo, o maior<br />
efeito de introjeção dos valores heterocentristas que marcam a homossexualidade<br />
negativamente advem da homofobia, que, ao ser interiorizada pelo homossexual, faz<br />
com que este se veja como um estrangeiro dentro da organização de um mundo<br />
essencialmente heterossexual. Por conseguinte, os espaços permitidos para este<br />
segmento demonstrar sua homoafetividade se tornam tanto restritos como eficazmente<br />
sob a mira e permissão da moral burguesa. De qualquer maneira, “o homossexualismo,<br />
como toda forma de vida sexual, não consegue ser feliz se não como condicionante da<br />
liberdade.” (FALCONNET, LEFAUHEUR, 1977, p.110). E, esta liberdade, para<br />
demonstração da homoafetividade não encontra espaço legitimado onde possa circular<br />
com direito a indiferença dos olhares repressores. Na verdade, esses estão sempre<br />
ostensivamente vigilantes, plenos de censura e de manifestações de preconceitos, muitas<br />
vezes transformados em atos de intolerância e violência.<br />
Sabemos que a homossexualidade é submetida a um continuum linguístico<br />
injurioso que busca inviabilizar a autoestima desta categoria, e que este discurso tem<br />
uma regularidade histórica nos séculos XIX, XX e começo do XXI. Por conseguinte, a<br />
violação da autoestima deste segmento brota das estruturas de dominação impostas, que<br />
são, de modo visceral, permanentemente reelaboradas e reescritas pelo estado, pelas<br />
igrejas, pela família etc. Estes agentes a serviço da heterossexualidade reprodutiva<br />
compulsória tentam, de todas as maneiras possíveis, perpetuar seus valores, demonstrar<br />
a naturalidade daquela, imputando aos homossexuais “uma espécie de autodepreciação<br />
ou até de autodesprezo sistemáticos (BOURDIEU, 2005, p.46).<br />
Em O Barão de Lavos, de Abel Botelho e Bom-Crioulo, de Adolfo Caminha,<br />
podemos observar que os narradores, imbuídos da ideologia heterocentrista, pretendem<br />
manter essa hierarquização simbólica de representação e de linguagem ao respaldá-las<br />
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