ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...
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constituído numa estrutura em que pessoas e mercadorias se intercambiam, pois ambos<br />
são compráveis e vendáveis. Assim,<br />
está posto o gosto naturalista de se criticar a cidade moderna, no<br />
caso Lisboa, e a exposição dos vícios mais sórdidos da sociedade: o<br />
adultério, a prostituição, a exploração sexual de rapazes das classes<br />
inferiores(...)a cidade surge desnudada em espaços escuros e escusos<br />
onde homens soturnos encontram-se com outros homens em busca<br />
de momentos de licenciosidades e de prazeres não confessados.<br />
(LUGARINHO, 2001, p.165).<br />
Deste modo, nestas duas cidades em que se desenrolam as narrativas, Lisboa<br />
e Rio de Janeiro, nos são apresentados diversos espaços escusos, chamados de ruas do<br />
pecado ou locais de compartilhamento e socialização das sexualidades consideradas<br />
marginais, em que poderia haver certa pseudo-tolerância socializante entre os<br />
“déclassés” (BOTELHO, 1982, p. 368) 12 . Em Lisboa, na narrativa botelhiana, são<br />
citadas as ruas do Salitre, o Passeio e a Baixa Lisboa, o Arco da Bandeira, locais em que<br />
o Barão vai ao encontro dos seus objetos do desejo, pois nestes lugares “democráticos”<br />
encontravam-se os refugos sociais que em muitas ocasiões “alugavam” seus corpos a<br />
baixo preço àqueles que os desejassem. Nestes locais permissivos, segundo o narrador,<br />
o Barão, em suas escapadas sexuais, ia dar vazão ao seu instinto sexual. Vejamos que<br />
nestes refúgios permissivos, o Barão de Lavos consegue resolver momentaneamente<br />
seus frequentes e angustiantes apelos sexuais, pois estes se tornaram nele uma fome<br />
voraz, uma verdadeira fome tantálica que nunca era saciada: “afinal, debaixo do Arco<br />
do Bandeira, deu com um garoto esfarrapado e torpe, e nele foi cevar ignobilmente, ao<br />
primeiro recanto imundo da viela, a bulimia sensual que o devorava.” (BL, p.127).<br />
Assim, através da narrativa botelheana ficamos sabendo que,<br />
desde pelo menos o século XIX, a Baixa lisboeta era uma zona de<br />
prostituição masculina e que o cais do Sodré era uma região de<br />
encontros fortuitos entre homens e que a efebia era uma prática mais<br />
comum do que se supunha na sociedade portuguesa, o que os autos<br />
da inquisição já haviam apontado. (LUGARINHO, 2001, p.165).<br />
No Rio de Janeiro, a Rua da Misericórdia, citada na narrativa caminiana e<br />
local onde boa parte da trama do romance se desenrola, era considerada, através de<br />
12 A partir desta, todas as citações de O Barão de Lavos serão apresentadas como BL, seguida do número<br />
de página, edição de 1982, citada na bibliografia.<br />
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