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ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...

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ocorre, assim, uma dupla transgressão no relacionamento afetivo-sexual entre Amaro e<br />

Aleixo, já que esse é um relacionamento homogenital e também interracial. Na relação,<br />

um negro, considerado como pertencente à raça inferior – não devemos esquecer que<br />

raça no Brasil esta imbricado ao indivíduo de pele negra - é impulsionado sexualmente<br />

na direção de um branco feminilizado, considerado pela sua brancura como pertencente<br />

à raça “superior”. Na verdade, o narrador de forma irônica e paradoxal, pois o<br />

relacionamento sexual homossexual é uma prática sexual infértil, no que concerne a<br />

gerar descendentes, inocula valores raciais brancos heterocentristas na mente de Amaro,<br />

de modo que ele os exteriorize inconscientemente. O instinto do desejo sexual de<br />

“aprimoramento” da raça – diversas teorias levam em conta que no inconsciente<br />

coletivo das raças não brancas é inoculada a ideia que os valores associados ao branco<br />

europeu e a sua cultura são superiores aos de outras raças -, por isso, havia uma<br />

propensão natural de Bom-Crioulo em sentir atraído sexualmente por Aleixo –<br />

ultrapassa, assim, as fronteiras da sexualidade procriativa. O frenesi sexual de Amaro<br />

por Aleixo, que o torna indefeso sexualmente perante a genética branca de Aleixo,<br />

demonstra que também a libido homossexual se curvava as teorias de “aprimoramento”<br />

das raças. Deste modo, seguindo o raciocínio do narrador, atrelado à questão da<br />

eugenia, a busca pela apuração racial sobrepõe até as barreiras atreladas ao sexismo. A<br />

libido do negro Amaro que, até então, resistira a todos os apelos de vivência sexual, não<br />

conseguira resistir aos apelos da “pureza” do branco grumete, descendente de europeu.<br />

Apesar dos seus limites, como homem simples, negro e ex-escravo, Amaro,<br />

dentro de seu campo de racionalidade, percebe os obstáculos que as convenções<br />

culturais lhe impõe por viver um relacionamento homossexual e interracial com Aleixo.<br />

Mesmo assim, Bom-Crioulo não resiste aos apelos da paixão, apanha um escaler e deixa<br />

o encouraçado. Vale salientar que ele estava veementemente proibido de deixar o navio<br />

no qual trabalhava. Ele descumpre ordens e vai à procura de Aleixo. Como não o<br />

encontra de imediato, embriaga-se e briga no cais do porto, acabando preso e<br />

chicoteado. “À última chibatada, Bom-Crioulo rodou e caiu sobre o convés, porejando<br />

de sangue. Ah! Não havia no seu dorso uma nesga de pele que não fosse atingida pelo<br />

vime” (BC, p.56). Observamos que, ao tentar aproximar-se de sua paixão homossexual,<br />

Amaro comete um crime de desobediência, merecendo ser castigado pela transgressão.<br />

Se, já no início do romance, quando Amaro fora chicoteado por defender Aleixo, nosso<br />

narrador apontava que o “fardo” de tal amor seria pesado e doloroso, no fim do romance<br />

tal promessa é cumprida literalmente em seu corpo açoitado por chibatadas. Deste<br />

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