10.10.2013 Views

ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...

ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...

ENTRE SILÊNCIOS, NÓDOAS E COBIÇA - CCHLA - Universidade ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

O bodum africano – transpiração excessiva ou de mau cheiro – está aqui<br />

relacionado ao cheiro do suor que exalava do corpo de Amaro no momento do<br />

relacionamento sexual. Esta referência tão forte ao olfato parece querer dar ênfase ao<br />

caráter animalesco tão frequentemente ligado aos negros, pelo olhar do branco. Ao<br />

mesmo tempo, percebe-se que Aleixo sentia-se, de certa forma, usado, como se Amaro<br />

só quisesse tê-lo, utilizando-se da força, unicamente para gozo próprio. Além disso,<br />

Aleixo se percebe na posição de objeto submetido. Lembramos que o patriarcado, ao<br />

longo da história, esteve baseado socialmente na opressão do feminino pelo seu oposto<br />

masculino.<br />

Carola Bunda, a portuguesa e prostituta que aluga o quarto para o casal logo<br />

no início do romance, também repetirá o preconceito racial em relação a Amaro quando<br />

afirma: “Negro é raça do diabo, raça maldita que não sabe perdoar, que não sabe<br />

esquecer” (BC, p.67). Este arroubo de racismo, inoculado culturalmente, aflora neste<br />

momento como instinto de defesa tanto em relação à preservação de seu caso de amor<br />

com Aleixo, como também em defesa da própria vida e da de Aleixo. Se soubesse que<br />

estava sendo traído, segundo o pensamento de Carola Bunda, Amaro poderia vir a<br />

destruí-los, como verdadeiramente ceifará a vida de Aleixo no final do romance. Ela,<br />

também amante de Aleixo, quer impedir este de ler o carinhoso bilhete de Amaro, no<br />

qual estava traçada a solicitação da visita do amado ao hospital em que aquele estava<br />

internado. Vejamos o bilhete que transtornou a portuguesa:<br />

175<br />

Meu querido Aleixo.<br />

Não sei o que é feito de ti, não seio que é feito do meu bom e<br />

carinhoso amigo da Rua da Misericórdia. Parece que tudo acabou<br />

entre nós. Eu aqui estou, no hospital, já vai quase um mês, e espero<br />

que me venhas consolar algumas horas com tua presença. Estou<br />

sempre a me lembrar do nosso quartinho... Não faltes. Vem amanhã,<br />

que é domingo.<br />

Teu<br />

Bom-Crioulo. (BC, p.62)<br />

Neste momento de inquietude, insegurança e temor, ela deixa vir à tona<br />

toda a carga de racismo introjetado sócio-culturalmente. Carola, portuguesa de classe<br />

baixa, prostituta de profissão, coloca-se na posição do branco colonizador, tomando as<br />

“verdades” daquele como sendo suas. “O modo como o branco vê o negro, foi moldado<br />

desde a infância pelas histórias em que a negritude era associada ao mal e os que faziam

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!