Capítulo IV - Olhos, Ouvidos e Garganta Anestesia Casos Clínicos - 77corpo estranho. A hemorragia pós-operatória não ocorre habitualmente, mas edema laríngeo pode ser manifestadoprecocemente.5. Como tratar essa complicação?O tratamento do larigoespasmo deve ser instituído imediatamente e inclui a remoção do estímulo (aspiraçãoda secreção e sangue), administração de oxigênio a 100% sob máscara e com pressão positiva,e aprofundamento do plano de <strong>anestesia</strong> com agentes venosos e lidocaína. Em caso de persistência doreflexo associado à diminuição da oxigenação do paciente, pode-se administrar dose baixa de succinilcolina(0,1 – 0,5 mg.Kg -1 ). Segunda dose de succinilcolina pode ser necessária, em caso de recorrênciada complicação.O tratamento do laringoespasmo refratário pode ser realizado de duas maneiras. A primeira, pelo bloqueiodo nervo laringeo superior. A segunda, pela administração transtraqueal de lidocaína, através da membranacricotireoidea.Uma vez aliviado o laringoespasmo, o paciente deve receber oxigênio umidificado para diminuição da irritaçãoda laringe. Casos de laringoespasmo grave devem ser monitorizados por mais tempo, para assegurar aausência de complicações pulmonares.Caso 10Paciente jovem, do sexo masculino, vítima de acidente automobilístico, apresenta suspeita de traumatismoda maxila.1. Como se apresentam as fraturas da maxila?Fraturas da maxila são comuns em decorrência de acidentes automobilísticos. Geralmente, são causadaspor trauma de alto impacto e podem estar associadas a fraturas do crânio ou lesões intracranianas. Osangramento decorrente de lesões da maxila pode ser significativo, uma vez que esta é uma estruturabastante vascularizada. Outras manifestações de fraturas maxilares podem incluir má-oclusão, edema facialpronunciado, mobilidade da face, extremidades ósseas mal alinhadas e palpáveis nas bordas da fratura, eequimoses.2. Como classificar as fraturas maxilo-faciais?Várias formas de fratura da maxila podem ser encontradas, mas a classificação de LeFort categoriza aslinhas comuns de fratura da face em três grupos: LeFort I, LeFort II e LeFort III.A fratura de face do tipo LeFort I é a fratura horizontal da maxila, uni ou bilateral. A linha de fratura passapor sobre a linha dos dentes ou do assoalho do nariz, e mobiliza o palato, separado da porção superiorda maxila. O segmento pode sofrer deslocamento posterior ou lateral, ou ainda, rodar em torno de umeixo vertical.A fratura de LeFort II é do tipo triangular ou piramidal, uma extensão da lesão do tipo I. O esqueleto centralda face está envolvido, com a linha de fratura que se estende a partir do osso nasal, osso lacrimal, margeminfraorbitária e através da porção superior do seio maxilar, placas pterigoides até a fossa pterigopalatina. Amaxila pode estar deslocada posteriormente ou rodar em torno de um eixo, flutuante em relação ao esqueletofacial.A fratura de LeFort III, também chamada de disjunção crânio-facial, inclui linha de fratura paralela à base docrânio, separando completamente a maxila da base do crânio.
78 - Anestesia Casos Clínicos Capítulo IV - Olhos, Ouvidos e Garganta3. O que considerar no planejamento da <strong>anestesia</strong> de um paciente comtraumatismo maxilo-facial?É considerado um desafio ao anestesiologista o manuseio do paciente com trauma de face e de vias aéreas.A abordagem das vias aéreas pode ser complicada e outras lesões graves podem estar associadas, comimpacto sobre a escolha da <strong>anestesia</strong>. Instabilidade hemodinâmica, via aérea difícil, urgência da situação,falta de cooperação do paciente, possibilidade de intoxicação por álcool ou drogas ilícitas, risco de aspiraçãodo conteúdo gástrico e a necessidade de proteção da coluna cervical contribuem para tornar complexo omanuseio do paciente com trauma maxilo-facial.São necessários o reconhecimento da natureza, extensão e consequências anatômicas da lesão, o planejamentoda abordagem segura da via aérea, a escolha da técnica anestésica mais adequada e a determinaçãosobre o melhor momento para a extubação do paciente. A equipe anestésico-cirúrgica deve trabalhar emconjunto para o preparo e planejamento do tratamento e para garantir que, no pré-operatório, lesões associadassejam identificadas e que a estabilidade do paciente esteja assegurada.4. Como abordar de modo seguro a via aérea de paciente com fraturasmaxilo-faciais?As vias aéreas requerem atenção imediata: se a sua abordagem não for adequada, todos os outros esforçospara reanimação serão em vão. Obstrução respiratória de instalação aguda ou lenta pode se apresentarnesses pacientes devido a edema, sangue, vômito, fragmentos de dentes, ossos e tecidos moles, ou corposestranhos. Por vezes, a patência também pode ser comprometida pela queda da base da língua, causadapelo menor tônus muscular decorrente de lesões ao sistema nervoso central. Outros fatores complicadoressão as lesões associadas: lesão da medula cervical, traumatismo cranioencefálico, hemorragias e o risco deaspiração do conteúdo pulmonar.Ventilação sob máscara: deve ser considerada uma técnica temporária, apenas para a estabilização dopaciente, antes do controle definitivo da via aérea. A grande desvantagem é que a presença de conteúdogástrico, sangramento nas vias aéreas e alteração do sensório contribuem para a maior possibilidade deaspiração.Intubação traqueal: é considerada a técnica definitiva para controle da via aérea, permite a realização de<strong>anestesia</strong> e ventilação controlada mecânica, e protege contra aspiração de conteúdo gástrico. O pacientepolitraumatizado com alteração da consciência ou trauma acima da clavícula deve sempre ser consideradocomo portador de lesão da coluna cervical, até que se prove o contrário. Assim, as possibilidades para aintubação traqueal do paciente com fratura da face abrangem desde intubação orotraqueal com imobilizaçãocervical, intubação nasotraqueal às cegas, intubação traqueal sob fibroscopia, intubação orotraqueal comestilete luminoso até a intubação traqueal retrógrada. A indução da <strong>anestesia</strong> em técnica de sequência rápidaé a mais utilizada, mas a intubação com o paciente acordado pode estar indicada.A fratura de LeFort do tipo III, pela possibilidade de lesão da nasofaringe e base do crânio, pode permitir acomunicação da via aérea com o espaço subaracnoideo intracraniano. Dessa forma, a intubação nasotraquealpode não apenas favorecer a entrada de material estranho no espaço subaracnoideo, mas também háo risco de lesão mecânica pela introdução do tubo traqueal no sistema nervoso central. A intubação nasotraquealem pacientes com fratura de LeFort do tipo III, caso esteja indicada, deve ser permitida apenas apósa confirmação clínica e radiológica da ausência de fratura da base do crânio.Cricotiroidotomia: é uma técnica rápida e efetiva de controle emergencial das vias aéreas, se a ventilaçãosob máscara for impraticável e a intubação traqueal, mal sucedida. Em relação à traqueostomia, consomemenos tempo, é realizada mais facilmente e associa-se a menos complicações. Ademais, mais tardiamente,permite a realização de traqueostomia sob condições mais controladas.