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01 - A Guerra da Duquesa

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– Você – repetiu, apontando-se com um dedo no espelho– é idiota.<br />

Mas se ia ser idiota, ao menos tentaria sê-lo com estilo. Assim saiu <strong>da</strong> casa e foi até os campos.<br />

Subiu uma colina e baixou outra; procurou nas ladeiras meridionais, mais resguar<strong>da</strong><strong>da</strong>s, até que<br />

encontrou o que procurava: um ramo de amores-perfeitos amarelos, escondidos entre os pés de milho.<br />

Recolheu todos.<br />

SE BRILHAVA ALGUMA ESTRELA depois <strong>da</strong> grossa manta de névoa e fumaça, Robert não podia<br />

vê-la. Desceu <strong>da</strong> carruagem e se voltou para aju<strong>da</strong>r a Violet. As luzes <strong>da</strong> rua emitiam uma luz apaga<strong>da</strong> e<br />

pesa<strong>da</strong>, suficiente para mostrar ao grupo de pessoas que esperavam nos degraus dianteiros do Salão<br />

Novo. Na noite, to<strong>da</strong> a roupa parecia negra e o efeito era quase funerário.<br />

Ou o teria sido, a não ser porque as pessoa cantavam.<br />

– Ah, bem – disse Sebastian a seu lado. – Há uma multidão.<br />

– Uma multidão – repôs Robert.<br />

Sebastian esfregou as mãos com satisfação.<br />

– Sempre que falo, acontece o mesmo. Essas coisas são cabras?<br />

Eram. Na praça do mercado, ao lado do salão de conferências tinham montado dois cercados<br />

provisórios. Havia placas ata<strong>da</strong>s a ambos, mas Robert não podia ler na escuridão. Um dos cercados<br />

estava cheio de cabras, quase uma dúzia de animais balindo.<br />

No outro cercado, curiosamente, havia meninos. Meninos pequenos. Robert franziu o cenho ao<br />

aproximar-se. O menino mais alto apenas lhe chegaria à cintura; o menor quase não an<strong>da</strong>va, mas<br />

tropeçava atrás dos outros com determinação sombria. Os gritos não procediam dos meninos, mas sim<br />

dos adultos que os rodeavam.<br />

Quando se aproximaram dos cercados, Robert pôde ler por fim as placas.<br />

ESTES SÃO ANIMAIS, proclamava a que estava ata<strong>da</strong> ao cercado <strong>da</strong>s cabras. A do outro cercado<br />

dizia: ESTES NÃO O SÃO.<br />

Robert olhou para Sebastian. Seu primo, que sempre tinha gostado de criar controvérsia, sorria ain<strong>da</strong>,<br />

mas seu sorriso não era do todo franco. Adiantou-se uns passos até ficar em frente aos meninos.<br />

Estavam muito mais confundidos que as cabras. Um menino pequeno tinha as mãos na barra<br />

intermediária <strong>da</strong> cerca. Usava apenas um casaco leve e luvas finas. Se lhe tinham posto um gorro, devia<br />

ter caído. Seus olhos resultavam luminosos no frio <strong>da</strong> noite; seu fôlego criava vapores no ar frio.<br />

Sebastian se agachou e os gritos se redobraram.<br />

– Não somos animais – gritava uma mulher. – Não somos animais.<br />

Não gritavam a Sebastian; nenhum deles o reconhecia. Para eles era somente mais um cavalheiro que<br />

observava o espetáculo. Uma razão mais para gritar mais alto. Sebastian tirou lentamente o cachecol e,<br />

sem dizer uma palavra, o enrolou no pescoço do menino. O cachecol, grande, fazia com que o menino<br />

parecesse ain<strong>da</strong> menor. Sebastian assentiu sem palavras e se voltou para partir.<br />

– O que acredita que está fazendo? – perguntou uma mulher próxima. – Esse é meu filho. Não<br />

necessitamos sua cari<strong>da</strong>de.

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