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INTRODUÇÃO Faremos um estudo sobre os debates acerca ... - UFF

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Quando falam<strong>os</strong> aqui em resistência moderna estam<strong>os</strong> n<strong>os</strong> referindo, especificamente<br />

à teoria de John Locke (1632-1704) 35 , primeiro autor moderno a teorizar e defender o direito<br />

de resistência, associado à noção de limitação do poder soberano.<br />

A obra de Hermes Lima (1926) não é suficientemente clara a esse respeito. Por tratar-<br />

se de <strong>um</strong>a tese que fora apresentada tendo em vista a cátedra de Direito Público e<br />

Constitucional da Faculdade de Direito de São Paulo, o jurista enfatiza temas das áreas de<br />

35 A teoria de Locke parte da idéia de que, inicialmente, estariam <strong>os</strong> homens em <strong>um</strong> estado de natureza. Contudo,<br />

o autor observa que esse direito que todo homem tem de ser o executor da lei da natureza pode trazer divers<strong>os</strong><br />

inconvenientes, razão pela qual ele sugere a constituição de <strong>um</strong> “Governo Civil”. Discorrendo <strong>sobre</strong> <strong>os</strong> fins da<br />

sociedade política, Locke questiona o motivo que levaria o homem a renunciar a liberdade do estado de natureza<br />

e submeter-se ao domínio e ao controle de outro poder. E responde que, sendo o estado de natureza repleto de<br />

temores e perig<strong>os</strong> constantes, <strong>os</strong> homens procurariam unir-se para a “mútua conservação de suas vidas,<br />

liberdades e bens”, a<strong>os</strong> quais Locke atribui o termo genérico de “propriedade” (LOCKE. O segundo tratado<br />

<strong>sobre</strong> o governo, IX, 124). A busca pela conservação da propriedade faz com que cada homem renuncie ao seu<br />

poder individual de castigar para que este passe a ser exercido por <strong>um</strong> único indivíduo – designado entre eles<br />

para tal fim – e segundo as regras que a comunidade, ou aqueles por ela autorizad<strong>os</strong> para tal fim, concordem que<br />

devam vigorar. Neste ponto, Locke identifica o direito original e a origem d<strong>os</strong> poderes legislativo e executivo,<br />

bem como d<strong>os</strong> govern<strong>os</strong> e das sociedades (LOCKE. O segundo tratado <strong>sobre</strong> o governo, IX, 127). Assim,<br />

ingressando na sociedade política, <strong>os</strong> homens renunciam a<strong>os</strong> dois poderes que p<strong>os</strong>suíam no estado de natureza: o<br />

de “fazer tudo quanto considere adequado para a preservação de si e do resto da h<strong>um</strong>anidade” e o de “castigar <strong>os</strong><br />

crimes” (LOCKE. O segundo tratado <strong>sobre</strong> o governo, IX, 128-130). O rompimento do contrato, no ponto de<br />

vista lockiano, relaciona-se com a idéia de limitação do poder político. Ao se associarem, <strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong> cedem<br />

parte d<strong>os</strong> seus direit<strong>os</strong> a<strong>os</strong> governantes para que estes utilizem o poder em função do bem com<strong>um</strong>. Embora<br />

Locke defenda que o poder legislativo constitui o poder supremo de cada sociedade política, entende que ele não<br />

pode ser absoluto e nem arbitrário <strong>sobre</strong> a vida e <strong>os</strong> haveres do povo. Isso porque ele não pode exceder o poder<br />

que tinham as pessoas no estado de natureza, pois ninguém pode transferir a outrem mais poder do que ele<br />

próprio p<strong>os</strong>sui. Portanto, o poder legislativo deve se limitar ao bem público da sociedade. (LOCKE. O segundo<br />

tratado <strong>sobre</strong> o governo, XI, 134-135) Locke admite ainda <strong>um</strong> controle d<strong>os</strong> at<strong>os</strong> do poder público por parte do<br />

povo. Embora o teórico sustente que em <strong>um</strong>a sociedade política não pode haver mais de <strong>um</strong> poder supremo, que<br />

é o legislativo – ao qual tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> demais são e devem ser subordinad<strong>os</strong> –, sendo ele apenas <strong>um</strong> “poder fiduciário<br />

para agir com vistas a cert<strong>os</strong> fins”, cabe ainda ao povo “<strong>um</strong> poder supremo para remover ou alterar o legislativo<br />

quando julgar que este age contrariamente à confiança nele dep<strong>os</strong>itada.” (LOCKE. O segundo tratado <strong>sobre</strong> o<br />

governo, XIII, 149). Quanto à legitimidade do poder político, Locke compreende que <strong>os</strong> govern<strong>os</strong> não podem ter<br />

outra origem senão a mencionada acima, nem podem <strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> ter por fundamento senão o consentimento do<br />

povo. Entretanto, menciona três formas “ilegítimas” de se adquirir o poder: a conquista, a usurpação e a tirania.<br />

Reconhecendo a p<strong>os</strong>sibilidade de formas ilegítimas de poder, Locke admite a resistência em alguns cas<strong>os</strong>. N<strong>os</strong><br />

países onde a pessoa do príncipe é sagrada por lei, pode-se fazer op<strong>os</strong>ição apenas a<strong>os</strong> at<strong>os</strong> ilegais de seus<br />

funcionári<strong>os</strong> subaltern<strong>os</strong> ou outro comissionado por ele, a men<strong>os</strong> que o príncipe dissolva o governo, “deixando<br />

ao povo apenas a defesa que é direito de tod<strong>os</strong> no estado de natureza”. Neste caso, cabe a resistência. Em tod<strong>os</strong><br />

<strong>os</strong> demais cas<strong>os</strong>, o “caráter sagrado da pessoa isenta-a de todo inconveniente” (LOCKE. O segundo tratado<br />

<strong>sobre</strong> o governo, XVIII, 205). Mas nada impede que se questione, se faça op<strong>os</strong>ição e se resista àqueles que usem<br />

de força injusta, mesmo que estes aleguem ter do rei <strong>um</strong>a inc<strong>um</strong>bência. “Pois, se a autoridade do rei lhe é dada<br />

apenas pela lei, não pode ele conceder a homem alg<strong>um</strong> o poder de agir contra ela” (LOCKE. O segundo tratado<br />

<strong>sobre</strong> o governo, XVIII, 206). Supondo-se, todavia, <strong>um</strong> poder não sagrado, tem<strong>os</strong> que, quando a parte que sofreu<br />

a injúria puder ser compensada e seus prejuíz<strong>os</strong> reparad<strong>os</strong> mediante o apelo à lei, não haverá pretexto para a<br />

força, que só deve ser usada quando alguém for impedido de recorrer à lei. “E é apenas essa força que põe quem<br />

a usa em estado de guerra e torna legítimo resistir-lhe” (LOCKE. O segundo tratado <strong>sobre</strong> o governo, XVIII,<br />

207). Se <strong>os</strong> at<strong>os</strong> ilegais cometid<strong>os</strong> por <strong>um</strong> magistrado não forem além do caso de alguns homens particulares,<br />

embora tenham estes o direito de defender-se e retomar pela força o que pela força ilegal lhes for arrebatado, o<br />

direito de assim proceder não <strong>os</strong> envolverá facilmente em <strong>um</strong>a controvérsia, na qual com certeza perecerão<br />

(LOCKE. O segundo tratado <strong>sobre</strong> o governo, XVIII, 208). “Se, porém, qualquer desses at<strong>os</strong> ilegais se estender<br />

à maioria do povo, ou se o malefício e a opressão recaírem apenas <strong>sobre</strong> uns quant<strong>os</strong>, mas em cas<strong>os</strong> tais que <strong>os</strong><br />

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