que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...
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O <strong>que</strong> provavelmente <strong>no</strong>s engana <strong>no</strong> cinema, é <strong>que</strong>, ao contrário do <strong>que</strong> ocorre<br />
geralmente num ciclo evolutivo artístico, a a<strong>da</strong>ptação, o empréstimo, a imitação não<br />
parecem situarse na origem......O conceito de arte pura (poesia pura, pintura pura,<br />
etc.) não é desprovido de sentido; ele se refere a uma reali<strong>da</strong>de estética tão difícil de<br />
definir quanto de contestar....Há cruzamentos fecundos, <strong>que</strong> adicionam as quali<strong>da</strong>des<br />
dos genitores, há também sedutores híbridos, mas estéreis, na enfim acasalamentos<br />
monstruosos, <strong>que</strong> só engendram quimeras (1991, p. 8588).<br />
Quando <strong>da</strong> leitura do romance As Horas, ficamos a <strong>no</strong>s <strong>que</strong>stionar como seria sua<br />
a<strong>da</strong>ptação para o cinema. A sua estrutura narrativa, embora construí<strong>da</strong> em terceira pessoa,<br />
com uma mobili<strong>da</strong>de para adoção do discurso indireto livre, também é permea<strong>da</strong> por<br />
monólogos interiores, intertextuali<strong>da</strong>des, e aproximações entre autores, ficção, leitor, e como<br />
pergunta Young: How could fears of frailty, the value of reading Mrs. Dalloway be<br />
represented on screen? What could replace the enactment of authorship? (2003, p. 73). 56<br />
Stephen Daldry faz escolhas de aspectos rotineiros para fazer a costura visual e assim<br />
equilibrar junto com as pausas e os silêncios, às repetições sintáticas do romance.<br />
Na a<strong>da</strong>ptação de As Horas, o roteirista David Hare, faz algumas escolhas; prioriza uns<br />
personagens, reduz outros (Sally Lester ), e elimina também (como <strong>no</strong> caso dos personagens<br />
presentes <strong>no</strong> livro, mas não <strong>no</strong> filme: Oliver Saint Ives, Willie Bass, Walter Hardy, Evan e<br />
Mary Krull). Hare traduz de forma quase na totali<strong>da</strong>de os traços literários do texto, mas vai<br />
ser na transposição de outros recursos, ou seja nas imagens, para representar trechos do<br />
romance. Um bom exemplo dessa transposição está na expressão facial <strong>da</strong> personagem de<br />
Mrs. Brown, <strong>que</strong> <strong>no</strong> cinema, é o seu silêncio e lentidão dos passos, <strong>que</strong> expressa mais <strong>que</strong><br />
todo e qual<strong>que</strong>r diálogo do texto. O olhar angustiante de Mrs. Woolf; o seu ato de fumar<br />
nervoso; seu deslocamento diante <strong>da</strong>s serviçais; sua chega<strong>da</strong> insegura à estação de trem (Cena<br />
do filme e ser trabalha<strong>da</strong> posteriormente), completam assim o <strong>que</strong> o texto literário tem de<br />
mais rico – as palavras. No caso de Mrs. Dalloway, a cena <strong>da</strong> cozinha (trabalha<strong>da</strong> mais<br />
adiante), onde <strong>que</strong>bra ovos nervosamente separando a clara do ovo diante de Louis e to<strong>da</strong> a<br />
volta de um passado longínquo, também é outro exemplo dessa força imagética do cinema, na<br />
construção <strong>da</strong> atmosfera e do humor <strong>da</strong> cena e dos personagens.<br />
As <strong>que</strong>stões de a<strong>da</strong>ptação, tradução, recriação cinematográfica, assim também como<br />
as <strong>que</strong>stões de fideli<strong>da</strong>de e hierarquia complementam as <strong>que</strong>stões postas de origem, de<br />
influência e de intertextuali<strong>da</strong>de. Robert Stam ilustra essa <strong>que</strong>stão <strong>da</strong> hierarquia com a letra <strong>da</strong><br />
56 Como pode o medo <strong>da</strong> fragili<strong>da</strong>de, o valor <strong>da</strong> leitura de Mrs. Dalloway, serem representados na tela? O <strong>que</strong><br />
pode substituir a representação <strong>da</strong> autoria?