que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...
que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...
que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
“[...]uma entrega de si a um elemento líquido instável <strong>que</strong> pode ser, para os personagens, o<br />
fluxo cruzado e permanente de suas consciências entre o passado e o presente, e para o leitor,<br />
a própria narrativa” (2005/2006, p. 110).<br />
Ao assistir ao filme de Daldry, me senti essa leitora desampara<strong>da</strong> de <strong>que</strong> fala Mendes,<br />
tanto pela narrativa líqui<strong>da</strong> de As Horas, como pela <strong>que</strong>stão <strong>da</strong> experiência <strong>da</strong> subjetivi<strong>da</strong>de,<br />
algo <strong>que</strong> também se fazia correr por entre os meus dedos.<br />
A seqüência final <strong>que</strong> vai concluir o Prólogo, tem inicio com Laura Brown <strong>no</strong> quarto<br />
sozinha e a repetição <strong>da</strong> voz de Virginia: “Dear Leonard”, e <strong>da</strong> música de Glass: (Dear<br />
Leonard...Virginia deita<strong>da</strong> pensa: é preciso encarar a vi<strong>da</strong> de frente, conhecer a vi<strong>da</strong>, amála e<br />
depois descartála... Leonard...Sempre os a<strong>no</strong>s <strong>que</strong> foram <strong>no</strong>ssos, sempre os<br />
a<strong>no</strong>s...always...The love...always... THE HOURS. As Horas). Novamente, um entrelaçar<br />
dessas vi<strong>da</strong>s de mulheres como se integrassem um continuum temporal ; como se ca<strong>da</strong><br />
personagem vivesse uma experiência <strong>que</strong> de algum modo, ecoasse às vi<strong>da</strong>s <strong>que</strong> se precederam<br />
e sucederam. Uma fusão também <strong>que</strong> reforça o impacto <strong>que</strong> uma cena exerce sobre a outra.<br />
Virginia está deita<strong>da</strong>, e o som <strong>da</strong> sua voz aparece simultaneamente enquanto escreve<br />
o bilhete ( e agora Cunningham inclui a ficção, pois o bilhete real já foi alterado com as frases<br />
finais) e fala: “ encarar a vi<strong>da</strong> de frente...sempre...e conhecêla como ela é...enfim conhecê<br />
la..e então..descartála...” Estas palavras na ver<strong>da</strong>de vão constituir o próprio desfecho <strong>que</strong><br />
Virginia encontra para o desti<strong>no</strong> de Mrs. Dalloway, sua heroína, <strong>que</strong> simultaneamente vai<br />
sendo construído, enquanto balbucia estas palavras entrecorta<strong>da</strong>s. Clarissa Vaughn então<br />
fecha a porta e apaga a luz do apartamento. Não sem antes <strong>da</strong>r um beijo amoroso, cúmplice e<br />
silencioso, na sua companheira Sally. Esse beijo de Clarissa vai <strong>no</strong>s remeter a outros beijos <strong>no</strong><br />
filme. Primeiro o beijo de Virginia na irmã Vanessa – um beijo de desespero diante <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e<br />
de premonição <strong>da</strong> sua própria morte. Depois o beijo de Laura na cunha<strong>da</strong>; um beijo talvez de<br />
compaixão e impotência pela doença <strong>da</strong> amiga. Mas o beijo de Clarissa é um beijo assertivo e<br />
de <strong>que</strong>m tem o poder de mu<strong>da</strong>r o seu desti<strong>no</strong>.<br />
Em segui<strong>da</strong> Virginia entra na água. E ain<strong>da</strong> sua voz: “sempre os a<strong>no</strong>s...sempre.. o<br />
amor... sempre...The hours As horas.” E a tela escurece. Só então aparecem os créditos e a<br />
música num crescendo anuncia o seu título irônico “Metamorphosis 2”. Metamorfose de uma<br />
mulher em suas múltiplas faces; de uma mulher com várias vi<strong>da</strong>s e ao mesmo tempo nenhuma<br />
“of her own”; ou simplesmente de uma mulher toma<strong>da</strong> de um “ na<strong>da</strong> substancial”, e voltando<br />
a ser água materna ou somente cumprindo o seu desti<strong>no</strong> <strong>da</strong>s águas.<br />
Virginia enquanto escritora, sempre se preocupou com o aspecto fugidio <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, do<br />
tempo, <strong>que</strong> escorrega por entre os dedos. A abstração e ao mesmo tempo a tamanha