que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...
que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...
que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
A seqüência do encontro de Mrs. Brown e Mrs. Dalloway, <strong>no</strong> filme, é por demais<br />
emocionante, tanto pelo constrangimento, como pelo silêncio inquisidor por parte de Mrs.<br />
Dalloway, e também pelo silêncio revelador de Mrs. Brown. Num abraço de entendimento<br />
secular femini<strong>no</strong>, sentimos a soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de e compreensão profun<strong>da</strong> de um mundo <strong>da</strong>s<br />
mulheres, onde os “olhos sonhadores” transcendem as “fissuras <strong>da</strong>s velhas paredes”, para<br />
utilizar os termos de Bachelard, construindo assim um universo de linhas <strong>que</strong> “o tempo<br />
desenha na velha muralha” (2000, p. 152). A muralha do sofrimento <strong>no</strong> passado, mas <strong>que</strong><br />
através dos a<strong>no</strong>s, dos encontros e <strong>da</strong>s horas, pode ser transforma<strong>da</strong> em um <strong>no</strong>vo teto e um<br />
<strong>no</strong>vo continente para a vi<strong>da</strong> dessas e de outras mulheres.<br />
Bachelard diz <strong>que</strong> “é preciso procurar, na casa múltipla, centros de simplici<strong>da</strong>de... e<br />
<strong>que</strong> é preciso chegar à primitivi<strong>da</strong>de do refúgio. E, para além <strong>da</strong>s situações vivi<strong>da</strong>s, cumpre<br />
descobrir situações sonha<strong>da</strong>s” (2000, p. 47). Para vivenciar essas situações sonha<strong>da</strong>s ele<br />
estabelece “o sonho <strong>da</strong> cabana” (2000, p.48), onde “desejamos viver em outro local, longe <strong>da</strong><br />
casa atravanca<strong>da</strong>, longe <strong>da</strong>s preocupações citadinas. Fugimos em pensamento para procurar<br />
um ver<strong>da</strong>deiro refúgio” (2000, p. 48). Essa cabana para Bachelard é “a solidão centraliza<strong>da</strong>” e<br />
<strong>que</strong> dá “acesso ao absoluto do refúgio” (2000, p. 49).<br />
Além do “sonho <strong>da</strong> cabana”, Bachelard afirma <strong>que</strong> o quarto e a casa são “diagramas de<br />
psicologia <strong>que</strong> guiam os escritores e os poetas na análise <strong>da</strong> intimi<strong>da</strong>de” (2000, p. 55),<br />
exemplificando <strong>que</strong> “a casa vivi<strong>da</strong> não é uma caixa inerte. O <strong>espaço</strong> habitado transcende o<br />
<strong>espaço</strong> geométrico” (2000, p. 62). No caso de Laura Brown, a sua casa vivi<strong>da</strong> tem sim algo de<br />
inércia, por conta <strong>da</strong> sua paralisação diante do <strong>espaço</strong> e dela própria, mas sua casa também<br />
transcende a geometria, uma vez <strong>que</strong> sua casa não deixa de ser a extensão temporal/espacial<br />
de uma sala de estar de tantas mulheres “inadequa<strong>da</strong>s” para seus papéis, para citar a própria<br />
Virginia Woolf, <strong>que</strong> <strong>no</strong> livro/filme As Horas estremece diante de servir chá de gengibre às<br />
visitas de sua irmã Vanessa e seus sobrinhos.<br />
A inadequação <strong>da</strong>s mulheres em geral, e de Laura Brown em particular, ao papel de<br />
mãe e dona de casa é cruel, pois concretamente essa medi<strong>da</strong> é mais <strong>que</strong> subjetiva. De acordo<br />
com Woolf, “não há qual<strong>que</strong>r marca na parede para medir a altura exata <strong>da</strong>s mulheres. Não há<br />
metros, criteriosamente divididos nas frações de um centímetro, <strong>que</strong> se possam dispor sobre<br />
as quali<strong>da</strong>des de uma boa mãe ou a dedicação de uma filha, ou a....capaci<strong>da</strong>de de uma dona de<br />
casa...Elas permanecem, até mesmo neste momento, quase sem classificação (WOOLF, 2004,<br />
p. 9495). Mas com ou sem classificação, e como sugeriu Virginia, chega um momento em<br />
<strong>que</strong>, Laura salta, mas em busca <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, mesmo <strong>que</strong> para isso tivesse <strong>que</strong> abandonar a