que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...
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A solução brilhante <strong>que</strong> o roteirista David Hare encontrou para tecer as três estórias<br />
sem deixar vinco ou marcas, e ao mesmo tempo fazer a justaposição de uma estória entrando<br />
na outra, foi a utilização de metáforas visuais: As flores, os despertadores, os espelhos e os<br />
<strong>mergulho</strong>s, até mesmo os brincos de Clarissa, <strong>que</strong> são idênticos aao de Virginia, foram os nós<br />
de acabamento dessa costura, para <strong>que</strong> a colagem tivesse uma finalização com mais<br />
sincronici<strong>da</strong>de e simultanei<strong>da</strong>de por entre as estórias.<br />
Primeiro aparece a personagem de Virginia Woolf, em 1923, vivi<strong>da</strong> <strong>no</strong> cinema pela<br />
atriz Nicole Kidman. Enquanto escreve seu romance seminal Mrs. Dalloway, <strong>no</strong>s arredores<br />
de Londres, vai dissecando to<strong>da</strong>s as angústias do processo de criação ficcional e se revela<br />
incapaz de conciliar o mundo <strong>da</strong>s idéias com as exigências do cotidia<strong>no</strong>. A outra personagem<br />
Laura Brown representa<strong>da</strong> pela atriz Julianne Moore, casa<strong>da</strong>, com um filho pe<strong>que</strong><strong>no</strong> e<br />
grávi<strong>da</strong>, mora em Los Angeles em 1951. É através <strong>da</strong> leitura de Mrs. Dalloway, <strong>que</strong> consegue<br />
evadirse <strong>da</strong> asfixiante vi<strong>da</strong> doméstica. Já <strong>no</strong> século XXI, em Nova York, Clarissa Vaughan,<br />
interpreta<strong>da</strong> por Meryl Streep, editora bem sucedi<strong>da</strong>, começa o dia comprando flores para<br />
uma festa em homenagem ao exnamorado Richard (Ed Harris), também escritor, em estágio<br />
terminal <strong>da</strong> Aids, e <strong>que</strong> a chama ironicamente de Mrs. Dalloway. Afinal Clarissa Dalloway é<br />
o <strong>no</strong>me <strong>da</strong> personagem do livro/título de Woolf, <strong>que</strong> começa sua jorna<strong>da</strong> de 24 horas,<br />
prosaicamente, com a frase <strong>que</strong> funcionará como elo e eco <strong>da</strong>s três estórias: “Mrs. Dalloway<br />
disse <strong>que</strong> ela própria iria comprar as flores” (WOOLF, 1980, p. 7).<br />
Para conseguir traduzir a atmosfera, o humor, sensações, sentimentos e pensamentos<br />
<strong>da</strong>s personagens, tanto Daldry como Hare, se utilizaram de elementos especificamente<br />
cinematográficos, o <strong>que</strong> Brian McFarlane, chamou de “A<strong>da</strong>ptation Proper” 62 , para <strong>que</strong> assim<br />
o filme não se restringisse a ser um “filme literário”.<br />
Para representar, <strong>no</strong> filme, a sensação exiliariante <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Nova York em Mrs.<br />
Dalloway enquanto ia comprar flores, ou a experiência <strong>da</strong> leitura do romance Mrs. Dalloway,<br />
ou ain<strong>da</strong> a angústia <strong>da</strong>s três personagens e suas inadequações, Daldry não se limita somente à<br />
transposição do enredo, mas utiliza elementos próprios do cinema, a fotogenia, para assim<br />
atingir a a<strong>da</strong>ptação criativa. Dentre esses elementos, estão o movimento dos cabelos dessas<br />
personagens frente ao espelho, ou lavando o rosto pela manhã; campanhias <strong>que</strong> tocam, portas<br />
<strong>que</strong> se abrem inespera<strong>da</strong>mente, o sons <strong>da</strong>s buzinas dos carros na Big Apple; o olhar<br />
angustiante de Mrs. Woolf, assim também como o suplicante de Mr. Woolf. Também os<br />
62 – McFarlane definia os dois estágios de a<strong>da</strong>ptação : Transfer (uma transferência ) do texto ao filme, e<br />
A<strong>da</strong>ptation Proper (<strong>que</strong> seria o <strong>que</strong> o roteirista a<strong>da</strong>ptaria de forma criativa, sem uma preocupação em ser fiel ao<br />
texto, mas em transpor em uma diferente linguaguem a<strong>que</strong>le efeito.