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que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...

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uma água escura, e somente o som <strong>da</strong>s águas incessantes, intercalando com uma mão<br />

abotoando o casaco xadrez, nervosa mais ao mesmo tempo firmemente. Põe as mãos <strong>no</strong>s<br />

bolsos e bate a porta. Um silêncio e Virginia sai de casa . Nesse momento surge uma cena<br />

bucólica dos jardins ingleses e o som dos passarinhos. Virginia caminha com seu an<strong>da</strong>r<br />

curvado, mas a passos determinados.Leonard chega, vê os bilhetes simetricamente lado a<br />

lado, bem arrumados numa mesa com arranjos de plantas, um quadro numa parede verde<br />

água. Aparece o som <strong>da</strong> sua voz em off lendo o bilhete de despedi<strong>da</strong> <strong>que</strong> deixou para o seu<br />

marido: “Dearest”<br />

Nesse instante surge um conflito entre o <strong>que</strong> se diz e o <strong>que</strong> se vê, como a leitura <strong>da</strong>s<br />

cartas, numa verbalização do pensamento <strong>da</strong> interiori<strong>da</strong>de, quando aparece a imagem de uma<br />

coisa e a narração de outra; uma narração atrela<strong>da</strong> à verbali<strong>da</strong>de. Nessa cena, a câmara<br />

funciona como um dos inúmeros instrumentos técnicos para narrar (a câmara é sempre<br />

narrativa); uma enti<strong>da</strong>de através do qual o texto visual <strong>no</strong>s coloca, e <strong>que</strong> <strong>no</strong> cinema,<br />

possibilita uma intimi<strong>da</strong>de maior com o personagem, já <strong>que</strong> <strong>no</strong> cinema teremos sempre o<br />

tempo presente, embora não o seja.<br />

O crítico de cinema, Ismail Xavier, <strong>no</strong> artigo “Do texto ao filme: a trama, a cena e a<br />

construção do olhar <strong>no</strong> cinema”, comenta as nuances <strong>da</strong> distinção entre o contar (tell) e<br />

mostrar (show) <strong>no</strong> texto literário; <strong>que</strong> mesmo <strong>no</strong> mostrar, não se pode assumir um sentido<br />

literal, já <strong>que</strong> o “ver” <strong>da</strong>s palavras, também implica num imaginar. No cinema, essa “cena” se<br />

torna mais palpável; e <strong>da</strong> mesma forma <strong>que</strong> o tell e show na literatura não deixa de se<br />

constituírem enquanto escolhas do escritor, <strong>no</strong> cinema se diz <strong>que</strong> a câmera “mostra”, e<br />

desempenha um papel como narrador <strong>no</strong> cinema, o <strong>que</strong> permite <strong>que</strong> to<strong>da</strong> uma literatura afirme<br />

<strong>que</strong>, “a câmara narra” e não apenas mostra. Isso acontece, pelo fato, de como na literatura, a<br />

câmera fazer escolhas (ângulo, distância e mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des do olhar), como também uma outra<br />

escolha se segue, a montagem. E Xavier adverte: “[...] dizer <strong>que</strong> um filme “mostra” imagens é<br />

dizer pouco e muitas vezes elidir o principal” (2004, p.73­74).<br />

Virginia fala <strong>que</strong> ouve vozes; são as vozes <strong>da</strong> sua depressão, e de <strong>que</strong> não pode mais<br />

continuar. Vozes <strong>que</strong> mais adiante irão se fundir às vozes <strong>da</strong>s águas do rio; fusão <strong>que</strong> comenta<br />

Bachelard:<br />

As vozes <strong>da</strong> água quase não são metafóricas, <strong>que</strong> a linguagem <strong>da</strong>s águas é uma<br />

reali<strong>da</strong>de poética direta, <strong>que</strong> os regatos e os rios so<strong>no</strong>rizam com estranha fideli<strong>da</strong>de as<br />

paisagens mu<strong>da</strong>s, <strong>que</strong> as águas ruidosas ensinam os pássaros e os homens a cantar, a<br />

falar, a repetir, e <strong>que</strong> há, em suma, uma continui<strong>da</strong>de entre a palavra <strong>da</strong> água e a<br />

palavra humana.” (2002, p. 17).

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