que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...
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O <strong>espaço</strong> é tudo, pois o tempo já não anima a memória. ...e <strong>que</strong> não podemos reviver<br />
as durações aboli<strong>da</strong>s. Só podemos pensálas, pensálas na linha de um tempo<br />
abstrato privado de qual<strong>que</strong>r espessura. É pelo <strong>espaço</strong>, é <strong>no</strong> <strong>espaço</strong> <strong>que</strong> encontramos<br />
os belos fósseis de duração concretizados por longas permanências. O inconsciente<br />
permanece <strong>no</strong>s locais. As lembranças são imóveis, tanto mais sóli<strong>da</strong>s quanto mais<br />
bem espacializa<strong>da</strong>s (2000, p. 2829).<br />
Essa linha do tempo abstrato privado de <strong>que</strong> fala Bachelard, <strong>no</strong> livro/ filme As Horas,<br />
vai estar representado num belo “fóssil de duração” através <strong>da</strong> personagem de Laura Brown.<br />
Mrs. Brown, como as outras duas personagens, Mrs. Woolf e Mrs. Dalloway, se sentem<br />
prisioneiras <strong>da</strong>s paredes domésticas, e <strong>da</strong>s suas prisões internas. E à nível de inconsciente<br />
coletivo femini<strong>no</strong>, suas lembranças irão reviver o “tempo <strong>da</strong>s durações aboli<strong>da</strong>s”, quando re<br />
vive a insatisfação, a melancolia e a inadequação vivi<strong>da</strong>s por Virginia Woolf frente ao <strong>espaço</strong><br />
físicosocial, à um passado longínquo <strong>que</strong> tem um eco estrondoso <strong>no</strong> tempo presente.<br />
É através <strong>da</strong> leitura do romance Mrs. Dalloway, <strong>que</strong> Mrs. Brown vai conseguir<br />
amenizar suas angústias do estar foradolugar. É <strong>no</strong> sonho, e <strong>no</strong> devaneio <strong>da</strong> ficção, <strong>que</strong> as<br />
horas do relógio do seu dia são aboli<strong>da</strong>s, e Mrs. Brown “suspende o vôo do tempo”<br />
(BACHELARD, 2000, p. 28). Bachelard fala dos benefícios <strong>da</strong> casa e diz <strong>que</strong> “a casa abriga<br />
o devaneio, a casa protege o sonhador, a casa permite sonhar em paz...e <strong>que</strong> o devaneio tem<br />
mesmo um privilégio de auto valorização” (BACHELARD, 2000, p. 26). É um tanto irônico<br />
essa afirmação, quando pensamos em Mrs. Brown, pois o seu sonho não é de paz, nem a casa<br />
a protege <strong>da</strong>s suas angústias. Mas é certo <strong>que</strong> o devaneio a auto valoriza <strong>no</strong> sentido de <strong>que</strong> ela<br />
se reconhece em Mrs. Dalloway, e na própria Virginia, enquanto escritora, construindo uma<br />
certeza interna de <strong>que</strong> algo na sua vi<strong>da</strong> estava fora de ordem, e de <strong>que</strong> existia vi<strong>da</strong> em um<br />
outro lugar/<strong>espaço</strong>; <strong>no</strong> “aí” em oposição ao “aqui” <strong>da</strong> “Dialética do além”, de <strong>que</strong> fala<br />
Bachelard. (2000, p.216). Bachelard fala também <strong>que</strong>:<br />
[...]para evocar os valores de intimi<strong>da</strong>de, é necessário, paradoxalmente, induzir o<br />
leitor ao estado de leitura suspensa. É <strong>no</strong> momento em <strong>que</strong> os olhos do leitor deixam<br />
o livro <strong>que</strong> a evocação de meu quarto pode tornarse um umbral de onirismo para<br />
outrem. Então quando é um poeta <strong>que</strong> fala, a alma do leitor repercute, conhece essa<br />
repercussão <strong>que</strong>.... devolve ao ser a energia de uma origem. (2000, p. 33).<br />
Quando <strong>da</strong> leitura de Mrs. Dalloway, Mrs. Brown se utiliza <strong>da</strong> suspensão <strong>que</strong> sua alma<br />
de leitora sofre quanto à repercussão <strong>da</strong> energia <strong>da</strong> obra de origem – Mrs. Dalloway. Para<br />
Laura Brown, a teia <strong>da</strong> ficção transcendeu realmente os sonhos e devaneios, e Mrs. Dalloway<br />
foi sim esse elo <strong>que</strong> prendeua à vi<strong>da</strong>.