18.04.2013 Views

que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...

que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...

que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

cozinha, Louis fala <strong>que</strong> na<strong>da</strong> acontece <strong>no</strong> livro, mas ao mesmo tempo parece durar uma<br />

eterni<strong>da</strong>de, e sem motivo algum ela se mata (ele se refere à Mrs. Brown , mãe de Richard), aí<br />

joga o livro <strong>no</strong> sofá, com um certo desprezo. Mrs. Dalloway se diz aborreci<strong>da</strong> pelo fato de<br />

Richard não ter falado muito de Louis. Nesse momento uma gema solitária permanece em<br />

suas mãos, caindo vagarosamente na cumbuca e fazendo um splash. Louis a olha com carinho<br />

e diz <strong>que</strong> é gentil <strong>da</strong> sua parte. Louis então, cortante como um vento gelado diz <strong>que</strong> visitou<br />

Wellfleet. Clarissa fica mu<strong>da</strong>, embora tenta disfarçar, mas sua voz está dissonante <strong>da</strong> sua<br />

expressão nervosa. Louis fica de costas enquanto Mrs. Dalloway joga as cascas dos ovos <strong>no</strong><br />

lixo, como se na<strong>que</strong>le momento também quisesse jogar fora o seu passado. Louis fala <strong>da</strong> casa<br />

<strong>que</strong> continua lá, como se dissesse <strong>que</strong> o lugar, o <strong>espaço</strong> está imutável, já o tempo....E Mrs.<br />

Dalloway elogia sua coragem de se atrever a ir até lá. Coragem de enfrentar o passado e o<br />

fato de <strong>que</strong> perderam a<strong>que</strong>les sentimentos para sempre.<br />

Nesse instante, como <strong>que</strong> toca<strong>da</strong> por uma dor profun<strong>da</strong> e soterra<strong>da</strong> pelos a<strong>no</strong>s, Clarissa<br />

começa a se desestruturar, sua voz embarga, treme, ela se emociona, abre uma torneira por<br />

onde jorra um jato de água, como se fosse o seu pranto represado há tempo. Ela se enfurece.<br />

Louis sente <strong>que</strong> há algo de diferente <strong>no</strong> ar. Ela diz <strong>que</strong> não sabe o <strong>que</strong> está acontecendo, seu<br />

humor está estranho, pede desculpas pela grosseiria , sente­se perdi<strong>da</strong> por meio <strong>da</strong>s panelas,<br />

do fogão, <strong>da</strong> pia, e desabafa: “Parece <strong>que</strong> estou me dissolvendo!” . Clarissa se dissolve assim<br />

como disse Roland Barthes em seu Fragmentos de um discurso amoroso, <strong>que</strong> se a<br />

ambigui<strong>da</strong>de melancólica não desemboca <strong>no</strong> afeto, desemboca na doçura: “Assim, às vezes, a<br />

infelici<strong>da</strong>de ou a alegria desabam sobre mim...estou dissolvido, e não em pe<strong>da</strong>ços; caio,<br />

escorro, derreto” (1984, p.92).<br />

Louis repete <strong>que</strong> não devia ter vindo. Ela afirma <strong>que</strong> ele não é a causa, mas <strong>que</strong> sente<br />

um pressentimento. Clarissa se angustia e veremos depois <strong>que</strong> o seu pressentimento não foi à<br />

toa. Logo o poeta, o visionário como decidiu Mrs. Woolf, morrerá. Richard morrerá. Clarissa<br />

se diz péssima anfitriã. Irônico, pois ela , assim como a Mrs. Dalloway de Virginia Woolf,<br />

eram boas anfitriãs, e relatam sobre a arte disso. E diante desse fracasso em <strong>que</strong> se encontra<br />

na cozinha, assim como o fracasso do bolo de Mrs. Brown, Mrs. Dalloway se arrasta fogão<br />

abaixo, com a mão <strong>no</strong> ventre, e, aos soluços implora <strong>que</strong> Louis lhe expli<strong>que</strong> o por quê<br />

<strong>da</strong>quilo, ao mesmo tempo <strong>que</strong> rejeita o seu to<strong>que</strong>: “È demais para mim” diz ela, justificando<br />

<strong>que</strong> cuidou de Richard todos esse a<strong>no</strong>s e se segurou sem problemas, mas aí, com um outsider,<br />

<strong>que</strong> perturba a ordem estabeleci<strong>da</strong>, ela sucumbe. A cena é mostra<strong>da</strong> com Clarissa <strong>no</strong> chão, e<br />

Louis de pé, o <strong>que</strong> mostra bem a sua situação de fragili<strong>da</strong>de nesse momento perante o ar de<br />

<strong>que</strong>m tem o controle <strong>da</strong> situação, <strong>no</strong> caso Louis.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!