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que mergulho! o espaço vertiginoso da subjetividade feminina no ...

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isso foi acontecer. Nesse momento, o cenário é de profundo silêncio e solidão. O foco fica só<br />

em Mrs. Woolf, todo o resto <strong>da</strong> estação fora de foco, somente um funcionário ao longe, <strong>que</strong><br />

olha a<strong>que</strong>le casal <strong>no</strong> final <strong>da</strong> plataforma, como se a plataforma fosse um palco somente deles,<br />

e não de trens. O desti<strong>no</strong> já não era Londres! Mas os passageiros, aos poucos começam a<br />

chegar, como se a cena do casal fosse aos poucos voltando à <strong>no</strong>rmali<strong>da</strong>de.<br />

No entanto, Mrs. Woolf ain<strong>da</strong> tinha o <strong>que</strong> dizer. Diz <strong>que</strong> <strong>que</strong>r voltar para Londres.<br />

Leonard baixa a cabeça desolado e sem forças. “Sinto falta de Londres” diz Mrs. Woolf. No<br />

romance, é nesse momento <strong>que</strong> teremos o eco <strong>da</strong>s palavras <strong>da</strong> Mrs. Dalloway primeira: Que<br />

agitação! Que <strong>mergulho</strong>! Parece­lhe <strong>que</strong> pode sobreviver, prosperar, se tiver Londres à sua<br />

volta [...]” (CUNNINGHAM, 1998, p. 135). A Londres , <strong>que</strong> também <strong>no</strong> romance é descrita<br />

como impetuosa e imprudente, sob um céu desprovido de ameaças e onde<br />

to<strong>da</strong>s as cortinas abertas, o trânsito, homens e mulheres passando alegres em traje de<br />

<strong>no</strong>ite; o cheiro de cera, de gasolina e de perfume, enquanto alguém, em algum lugar<br />

(numa desssas aveni<strong>da</strong>s largas, numa dessas casas brancas, com pórtico de entra<strong>da</strong>),<br />

toca pia<strong>no</strong>; enquanto as buzinas berram e os cães ladram,... enquanto o Big Ben dá<br />

as horas, <strong>que</strong> caem em círculos de chumbo sobre transeuntes e ônibus, sobre a pétrea<br />

rainha Vitória, senta<strong>da</strong> diante do palácio, em patamares de gerânios, sobre os par<strong>que</strong><br />

<strong>que</strong> dormem envoltos em sombras solenes por trás de cercas de ferro negro<br />

(CUNNINGHAM, 1998, p. 135­136).<br />

E Leonard desqualifica sua voz, lhe dizendo <strong>que</strong> não era ela <strong>que</strong> falava, mas <strong>que</strong><br />

aquilo era um aspecto <strong>da</strong> doença. E ela indigna<strong>da</strong> e com to<strong>da</strong>s as suas forças grita: “É a<br />

minha voz, e só minha”. Nesse momento não temos nenhuma música, só o silêncio e os<br />

rostos dos dois em close. Ele ain<strong>da</strong> tenta dizer <strong>que</strong> são as vozes <strong>que</strong> ela ouve. E ela retruca:<br />

“É a minha!”. Diz <strong>que</strong> está definhando e morrendo na<strong>que</strong>le lugar, e os seus gritos ecoam<br />

como um pedido de socorro. No romance, Mrs. Woolf fala <strong>que</strong> “[...] está morrendo aos<br />

poucos num leito de rosas. Melhor, na ver<strong>da</strong>de, mergulhar a barbatana na água do <strong>que</strong> viver<br />

escondi<strong>da</strong>” (CUNNINGHAM, 1998, p. 136).<br />

Clarice Lispector em Água Viva, também fala desse des­encontro consigo mesma:<br />

“Não encontro resposta: sou. É isto apenas o <strong>que</strong> me vem <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. Mas sou o quê? A resposta<br />

é apenas: sou o quê. Embora às vezes grite: não <strong>que</strong>ro mais ser eu!! Mas eu me grudo a mim<br />

e inextricavelmente, forma­se uma tessitura de vi<strong>da</strong>” (1978, p.21­23) . Talvez Mrs. Woolf<br />

estivesse gru<strong>da</strong><strong>da</strong> nela mesma e buscasse essa tessitura de vi<strong>da</strong> longe de um descanso mortal,<br />

e assim como Clarice (e não Clarissa!) não quisesse a terrível limitação de <strong>que</strong>m vive apenas<br />

do <strong>que</strong> é passível de sentido, mas uma ver<strong>da</strong>de inventa<strong>da</strong>.

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