xviii - Repositório Aberto da Universidade do Porto
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HELENA OSSWALD<br />
terra, mas é suficientemente importante para não ser ignora<strong>do</strong>. E esta diferenciação que se<br />
impõe ao pároco e possivelmente às gentes <strong>do</strong> Miudelo, não tein senti<strong>do</strong> para os habitantes de<br />
outros lugares, para quem as areias são o essencial: "está situa<strong>da</strong> em campina de areas" afirma,<br />
por exemplo, o pároco de Ovar.<br />
Os contornos <strong>do</strong>s fenómenos que marcam a ria em Aveiro são objecto de atenção mas,<br />
como se percebe pela pena <strong>do</strong>s vários descritores, difíceis de entender. Uma lagoa, como a<br />
vizinha de Paramos, é passível de visualização e descrição completa. Como se pode ler nas<br />
respostas <strong>do</strong>s pároco <strong>da</strong>s freguesias de Paramos e Silvalde. A ria traz outros problemas. O<br />
primeiro é o <strong>da</strong> sua extensão e <strong>da</strong> incapaci<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s inquiri<strong>do</strong>s em tomarem consciência dessa<br />
mesma grandeza. Descrevem o rio <strong>da</strong> sua freguesia. E por essa razão o baptismo destaextensão<br />
de água e terra em "a Ria" ain<strong>da</strong> não aconteceu e, nesta <strong>do</strong>cumentação, sempre o fenómeno é<br />
entendi<strong>do</strong> no género masculino. Como, segun<strong>do</strong> os cânones que os autores <strong>do</strong> inquérito usaram,<br />
a descrição de um rio passa sempre pelo reconhecimento não só <strong>do</strong> seu percurso, mas também<br />
<strong>da</strong> sua nascente e foz, os inquiri<strong>do</strong>s preocupain-se em encontrar resposta a estes quesitos. Em<br />
Ovar, o pároco, ao descrever o rio, o Rio dAveiro, afirma peremptoriamente: "digo, que o<br />
ditto Rio tem nesta freguezia o seu principio, porque sahin<strong>do</strong> <strong>da</strong>qui <strong>da</strong>s tres ilhas a saber<br />
Cobello, Ribeira e Puxa<strong>do</strong>uro corre de Norte a Sul com a costa <strong>do</strong> oceano, fican<strong>do</strong> entre<br />
ambos huma faxa de area" (Bastos, 1984, p.35). E o colega de Vagos, Frei José de S. Luís,<br />
situa a vila entre o "Rio que vai para Ovai; Vouga e Aveyro e se mete no Mar pella barra que<br />
novamente se abrio" e um "rio de agoa salga<strong>da</strong> que a divide <strong>da</strong>s povoaçoens de Soza e Erini<strong>da</strong>"<br />
(IANilT, Dicionário Geográfico, vol. 38, no 4, p. 17-18). O hábito de noinear os cursos de<br />
água de maneiras difei-entes conforme eles vão passan<strong>do</strong> por este o11 aquele local, distinguin<strong>do</strong><br />
a proprie<strong>da</strong>de universal <strong>da</strong>s águas (em Mace<strong>da</strong> o curso de água é classifica<strong>do</strong> de regato pelo<br />
pároco, mas o mesmo identifica-o por cinco noines distintos), é evidente sei. uma <strong>da</strong>s razões<br />
destes vhrios nomes <strong>da</strong> r-ia. O facto de, ao contrário de outros casos em que o descritor seguia<br />
cui<strong>da</strong><strong>do</strong>samente, desde a nascente à foz, o percurso, os afluentes, o cau<strong>da</strong>l, etc., nenhum <strong>do</strong>s<br />
párocos envolvi<strong>do</strong>s na descrição <strong>da</strong> ria ter a percepção <strong>do</strong> to<strong>do</strong> que esta representa, mostra<br />
como no caso <strong>do</strong> fenómeno <strong>da</strong> ria os meios e capaci<strong>da</strong>des de observação, assiin como o inéto<strong>do</strong><br />
científico de observar, náo são <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio destes descritores.<br />
O processo de "morte" <strong>do</strong> rio é observa<strong>do</strong> e descrito com rigor ein inuitos casos. Sirvam<br />
de exemplo as palavras de Manuel de Resende, abade de S. Tiago de Silvalde: " vai o ryo<br />
morrer em hua lagoa que he <strong>da</strong> freguezia de Paramos, que se abre para o mar estan<strong>do</strong> cheya<br />
algnas vezes no anno, e metesse o dito ryo na lagoa só no tempo de inverno, que no verao nao<br />
entra na lagoa, por ficar a embeberçe nas areas desta freguezia junto ao mar." (IANiTT,<br />
Dicionário Geográfico, vol. 35, no 163, p. 1222). Alinha de costa e as transforniações ocoi~i<strong>da</strong>s<br />
na mesma, assim como as consequências deste fenómeno na paisagem, mas também na<br />
activi<strong>da</strong>de produtora <strong>do</strong>s setis habitantes mereceiii a atenção <strong>do</strong>s clérigos inquiri<strong>do</strong>s. As<br />
descrições <strong>do</strong>s fenómenos entrelaçam-se, grande parte <strong>da</strong>s vezes, nas explicações, algumas<br />
mito de experiência vivi<strong>da</strong> e verificação empírica, outras cimenta<strong>da</strong>s no princípio <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de.<br />
Tomé Nunes Pereira de Resende, vigário de S. Tomé de Mira, refere, na descrição <strong>da</strong> lagoa de<br />
Mira, a tradição <strong>da</strong> presença <strong>do</strong> apóstolo S. Tomé na antiga ci<strong>da</strong>de, que fora engoli<strong>da</strong> pela<br />
lagoa. Tem o cui<strong>da</strong><strong>do</strong> de afirmar tratar-se de tradição, para logo em segui<strong>da</strong>juntar argumentação<br />
em favor <strong>da</strong> tradição com elementos vários. Entre eles os acha<strong>do</strong>s arqueológicos. Mas não