19.04.2013 Views

xviii - Repositório Aberto da Universidade do Porto

xviii - Repositório Aberto da Universidade do Porto

xviii - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

GERALDO J. A. COELHO DIAS<br />

assim em Cascais, onde o Conde de Monsanto pedia em 1593 ao Capítulo Geral <strong>do</strong>s Beneditinos<br />

a fun<strong>da</strong>ção dum mosteiro para garantir assistência espiritual e mediação divina aos que partiam.<br />

Foi assim que no Brasil, desde 1580, se fun<strong>da</strong>ra11112 mosteiros sempre à beira mar, apenas no<br />

séc. XVII avançan<strong>do</strong> para o interior paulista.<br />

Veja-se como, na actuali<strong>da</strong>de, na costa portuguesa, entre Vila Nova de Gaia e Aveiro,<br />

muitas <strong>da</strong>s freguesias que têm praias tinham o seu centro religioso <strong>da</strong> igreja bastante afasta<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> mar, exactamente porque, como escreve Ramnlho Ortigão, a descoberta <strong>da</strong>s praias é uma<br />

reali<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s fins <strong>do</strong> século século passa<strong>do</strong>; o mar coalha<strong>do</strong> era ain<strong>da</strong> fonte de me<strong>do</strong>s e terrores.<br />

Os banhos de mar entraram tardiamente no hábito português de veranear. Ao mar iam pesca<strong>do</strong>res<br />

ou lavra<strong>do</strong>res pesca de peixe ou em busca <strong>do</strong> sargaço para os seus campos ou para tirar o sal,<br />

porque as aldeias estavam mais no interior, na zona de cultivo rural. Vejam nas freguesias <strong>da</strong><br />

extensa cor<strong>da</strong> marítima de Gaia a Aveiro. tiran<strong>do</strong> S. Félix <strong>da</strong> Marinha, quantos topónimos nos<br />

orientam para o mar?<br />

Quanto à vertente popular <strong>da</strong> religião, não podemos ignorar a sua importância entre as<br />

gentes <strong>do</strong> mar. Em ver<strong>da</strong>de, a sua religiosi<strong>da</strong>de procura fazer a ligação mediática ao sagra<strong>do</strong><br />

de forma hilemorfística, pessoalmente directa e senti<strong>da</strong>, sem pruri<strong>do</strong>s de dualismos ou<br />

dicotomias e libertas <strong>da</strong>s peias jurídicas <strong>da</strong> cleresia. Isso brota como uma necessi<strong>da</strong>de interna<br />

ou mesmo de situações-limite externas, impon<strong>do</strong>-se ao nível <strong>da</strong> consciência pessoal ou<br />

comunitária. Deste mo<strong>do</strong>, na religião popular procura-se evidenciar a visão subjectiva e natural,<br />

popular e externa, quase telúrica, que a condição <strong>do</strong> ser humano em situação acarreta. Por<br />

isso, acentuam-se e multiplicam-se gestos e ritos no seu formalismo externo e eficácia material<br />

ou mágica; valorizam-se as imagens <strong>do</strong>s santos com que o povo se apega, e os objectos com<br />

eles relaciona<strong>do</strong>s exercem uma como que atracção metacinética; gosta-se de exteriorizar actos<br />

pessoais de sacrifício <strong>do</strong>loroso e quase masoquista e também de apresentar "ex-votos" e ofertas<br />

com que se cumprem promessas; rezam-se mecanicamente terços, orações e ensalmos;<br />

apreciam-se finalmente as festas e romarias com que se recria e faz o rrunsfert <strong>da</strong> convivência<br />

com Deus e seus santos.<br />

A volta <strong>da</strong> religião popular há to<strong>do</strong> um conjunto de atitudes mentais e psicológicas e<br />

to<strong>do</strong> um acervo de cultura material que é bem o espelho <strong>da</strong> sua condição. É por isso que o<br />

próprio carácter anómico, materializa<strong>do</strong> e subjectivo <strong>da</strong> religião popular pode criar excessos e<br />

deturpações, que se traduzem em subformas de cultos, sobretu<strong>do</strong> no que diz respeito a práticas<br />

de fecundi<strong>da</strong>de e fertili<strong>da</strong>de, ou de práticas quase mágicas quan<strong>do</strong> se trata de exorcizar as<br />

forqas <strong>da</strong> natureza, como é o caso <strong>da</strong>s gentes <strong>do</strong> mar.<br />

Porque a religião popular tem de ser extroverti<strong>da</strong> e senti<strong>da</strong>, a festa aparece como<br />

momento privilegia<strong>do</strong> de culto cujo paroxismo pode servir para aferirmos <strong>do</strong> ver<strong>da</strong>deiro<br />

introsamento e interligação entre religião populare religiiío oficial. Hoje em dia, com oprogresso<br />

técnico, ao acendermos mecanicamente o intei~uptor <strong>da</strong> electrici<strong>da</strong>de, com frequência deixamos<br />

que se apague o borralho <strong>da</strong> lareira <strong>da</strong> nossa velha casa paterna e com ela se extingue e perde<br />

a memória <strong>da</strong>s nossas tradições culturais e religiosas. Ora as festas <strong>da</strong> religião são ain<strong>da</strong> no<br />

nosso país um topos privilegia<strong>do</strong> pasa o reencontro com a cultura <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, esse precioso<br />

lega<strong>do</strong> <strong>do</strong> nosso património mental e etnográfico.<br />

A festa religiosa para além de ser, <strong>do</strong> ponto de vista sociológico, um "estar com os<br />

outros" é também e principalmente um tempo e um espaço de encontro com Deus e os santos,

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!