Lygia da Fonseca Fernandes - Fundação Biblioteca Nacional
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algumas de suas igrejas, estando vestido com apuro, chapéu, cabeleira, de bolsa e<br />
espa<strong>da</strong>, e também a Santa Virgem, com hábitos de religiosa; assim equipados, são por<br />
eles levados em triunfo através <strong>da</strong>s ruas. 7<br />
Perto <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de existem, outrossim, dois conventos, um deles é um enorme e<br />
bom edifício e contém cerca de 500 freiras; no outro, não tão grande, as freiras são<br />
manti<strong>da</strong>s com mais severi<strong>da</strong>de, nem mesmo aos parentes é permitido vê-las, mas, no<br />
primeiro, visitas de ambos os sexos podem conversar com elas através <strong>da</strong>s grades. 8<br />
Em tempos passados havia na ci<strong>da</strong>de um colégio de jesuítas9 e há presentemente<br />
vários conventos de frades; os <strong>da</strong>s ordens franciscana e beneditina são comuni<strong>da</strong>des<br />
numerosas. 10<br />
Há também uma Casa <strong>da</strong> Ópera onde geralmente representam uma ópera<br />
duas vezes por semana e nos feriados que ocorre. Acho que a música e a <strong>da</strong>nça são a<br />
melhor parte <strong>da</strong>s representações. Não aparecem mulheres em cena e os homens que<br />
as substituem são muito desajeitados em todos os seus movimentos, mesmo aqueles<br />
que aparecem com sua ver<strong>da</strong>deira figura não são atores extraordinários. 11<br />
Há aqui uma boa alfândega, hospital, prisão e uma Casa <strong>da</strong> Moe<strong>da</strong> e as ruas são<br />
geralmente estreitas e mal pavimenta<strong>da</strong>s, cheias de lojas de comerciantes e a maioria<br />
dos artigos que ali existem parece ser de manufatura inglesa.<br />
A uma pequena distância <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de está o aqueduto, que consiste em duas ordens<br />
de arca<strong>da</strong>s e, à distância, não tem má aparência; o manancial que supre a ci<strong>da</strong>de<br />
de água está cerca de 8 milhas para o interior e corre sobre um rego coberto para o<br />
aqueduto e <strong>da</strong>í para a ci<strong>da</strong>de, que é supri<strong>da</strong> por dois chafarizes de onde os habitantes<br />
tiram to<strong>da</strong> a água para o uso. 12<br />
7. Procissões eram comuns na ci<strong>da</strong>de, que se animava com as festas religiosas e os cortejos litúrgicos. Todos os viajantes<br />
dedicam algumas frases às manifestações públicas de caráter religioso, também fixa<strong>da</strong>s pelos artistas em preciosas aquarelas<br />
ou desenhos. Veja-se, por exemplo, entre as que fielmente retratam as procissões, as ilustrações de Richard Bate: prancha 9 –<br />
Procession of the host passing the Igreja dos Terceiros do Carmo from the Palace Square towards Rua Direita, e também na<br />
aprecia<strong>da</strong> obra de Debret, J. M. Voyage pittoresque et historique au Brésil, vol. III, as descrições de cerca de oito diferentes<br />
procissões. Embora ambas registrem os acontecimentos do princípio do século XIX, a iconografia e texto são válidos para o<br />
século anterior.<br />
8. Os dois conventos de religiosas existentes na ci<strong>da</strong>de eram o Convento de Santa Teresa ou Recolhimento do Desterro, no<br />
morro do mesmo nome, fun<strong>da</strong>do em 1750 pelo conde de Bobadela – <strong>da</strong>s religiosas Carmelitas Descalças e de clausura rigorosa.<br />
O outro, situado mais próximo <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, no Campo <strong>da</strong> Aju<strong>da</strong>, também foi fun<strong>da</strong>do em 1750. Neste último, as freiras <strong>da</strong><br />
ordem de N. S. <strong>da</strong> Aju<strong>da</strong> mantinham contato com os parentes através de grades. Entretanto, o número de religiosas estimado<br />
pelo viajante inglês parece exagerado – era limitado a cinquenta em ca<strong>da</strong> um dos conventos de clausura.<br />
9. O Colégio dos Jesuítas, situado no morro do Castelo, <strong>da</strong>tava dos primórdios <strong>da</strong> fun<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de. Construído com grandiosi<strong>da</strong>de,<br />
abrangia o colégio, a Igreja de São Sebastião e as oficinas. Expulsos os religiosos no ano de 1759, somente em 1769<br />
foi ali instalado o Hospital Militar. Monumento arquitetônico do maior valor histórico e cultural desapareceu com o arrasamento<br />
do morro do Castelo, em 1922.<br />
10. O Convento de Santo Antonio, situado no morro do mesmo nome, abriga desde o ano de 1608 os frades <strong>da</strong> ordem franciscana,<br />
tendo sido o prédio terminado em 1616 e a ladeira que lhe dá acesso, em 1710. Ao lado se situa a Igreja <strong>da</strong> Ordem<br />
Terceira <strong>da</strong> Penitência, cuja construção é de 1653. Termina<strong>da</strong> em 1743, abriga preciosa talha doura<strong>da</strong> e pinturas, sendo um<br />
dos mais belos templos <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, já famoso no século XVIII. O Mosteiro de São Bento, <strong>da</strong> ordem beneditina, já existia em<br />
1628; a igreja, inicia<strong>da</strong> em 1633, foi termina<strong>da</strong> entre 1641-42 e é obra do engenheiro militar Francisco Frias de Mesquita.<br />
Riquíssima decoração interior e alfaias de prata sempre foram as peças cita<strong>da</strong>s como prova <strong>da</strong> opulência <strong>da</strong> ordem monástica.<br />
11. A Casa <strong>da</strong> Ópera, conheci<strong>da</strong> como "Casa <strong>da</strong> Ópera do Padre Ventura", foi o primeiro teatro do Rio de Janeiro. Situava-se na<br />
Rua do Fogo, no trecho hoje desaparecido (Rua dos Andra<strong>da</strong>s, esquina do Largo do Capim). Funcionou até a gestão do marquês<br />
do Lavradio, quando se incendiou. A citação de Bouganville, que assistiu no teatro a uma ópera de Metastasio, confirma<br />
o que descreve Forbes em 1765, antes, portanto, do viajante francês.<br />
12. O Aqueduto ou Arcos <strong>da</strong> Carioca conduzia água potável <strong>da</strong>s nascentes do rio Carioca até o perímetro urbano. Graças a<br />
Aires Sal<strong>da</strong>nha, que o construiu durante sua administração (1719-1725), no ano de 1723 a água chegou ao chafariz. Arruinado,<br />
foi reconstituído por Gomes Freire de Andra<strong>da</strong> no ano de 1750: de pedra com dezesseis bicas e dois tanques, um para animais<br />
e outro para as lavadeiras. Além do chafariz <strong>da</strong> Carioca, parte <strong>da</strong> água seguia por canos até o Largo do Carmo, onde outro<br />
chafariz a distribuía não só à população, como também atendia à agua<strong>da</strong> dos navios – "inaugurado por volta do ano de mil setecentos<br />
e cinquenta e tantos", segundo o historiador Pizarro e Araújo, era construído de mármore de Lioz. No panorama que<br />
acompanha o manuscrito de James Forbes, é perfeitamente visível esse monumento, com os detalhes <strong>da</strong> bacia em mármore