O jogo da enunciação em sala de aula e a formação de sujeitos ...
O jogo da enunciação em sala de aula e a formação de sujeitos ...
O jogo da enunciação em sala de aula e a formação de sujeitos ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
correspon<strong>de</strong> “ilusionar” o seu filho, satisfazer <strong>de</strong> tal forma seus pedidos, que o bebê possa<br />
crer-se onipotente; ao mesmo t<strong>em</strong>po, cabe a ela “<strong>de</strong>silusionar”, <strong>de</strong> forma gra<strong>da</strong>tiva, o seu<br />
filho, possibilitando “ruptura nessa experiência <strong>de</strong> continui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ser”, “entre pensamento e<br />
experiência <strong>de</strong> corpo” (SOUSA, 1999, p. 314), <strong>de</strong> prazer e <strong>de</strong>sprazer. Assim, o bebê vai<br />
apren<strong>de</strong>ndo a li<strong>da</strong>r com a vulnerabili<strong>da</strong><strong>de</strong> e a <strong>de</strong>senvolver a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> criativi<strong>da</strong><strong>de</strong> “diante<br />
<strong>de</strong> um ambiente que o inva<strong>de</strong> a qualquer momento” e, <strong>em</strong>bora sofra transformações mentais e<br />
orgânicas por conta <strong>da</strong>s relações com os diversos envoltórios nos quais está inserido, a pessoa<br />
po<strong>de</strong> conseguir “ser capaz <strong>de</strong> se sentir inteira naquilo que estiver fazendo”. Winnicott estu<strong>da</strong> a<br />
relação do ser humano adulto com o mundo a partir <strong>de</strong> sua teoria <strong>da</strong> relação mãe-filho 73 .<br />
A forma com que um adulto se posiciona diante <strong>da</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>da</strong>s suas<br />
primeiras experiências <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> ao lado <strong>da</strong> mãe ou do adulto que exerce a função materna,<br />
registra<strong>da</strong>s no inconsciente, incluindo tanto a língua, quanto os padrões culturais e to<strong>da</strong> a<br />
história pessoal do sujeito.<br />
Consi<strong>de</strong>rando que a simbiose entre a mãe e o bebê se constitui num aspecto <strong>da</strong><br />
factici<strong>da</strong><strong>de</strong> humana, na posição exotópica <strong>de</strong> sujeito pesquisador, me situo novamente frente<br />
às crianças pesquisa<strong>da</strong>s, cujas i<strong>da</strong><strong>de</strong>s variam entre oito e nove anos e que, <strong>de</strong> certa forma,<br />
estão ain<strong>da</strong> imbrica<strong>da</strong>s nessa simbiose. O fato é que ca<strong>da</strong> uma <strong>de</strong>las me revelara o t<strong>em</strong>po todo<br />
<strong>da</strong> pesquisa <strong>de</strong> campo, uma vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser herói, <strong>de</strong> ter importância no mundo dos outros.<br />
L<strong>em</strong>brei-me do que Bakhtin escreveu sobre a vonta<strong>de</strong> do ser humano <strong>de</strong> ser amado,<br />
105<br />
[...] a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> fazer <strong>de</strong>sse amor almejado do outro a força organizadora e motriz<br />
<strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, tudo isso é uma maneira <strong>de</strong> crescer e <strong>de</strong> se engran<strong>de</strong>cer no clima <strong>da</strong><br />
consciência amorosa do outro [...]; todos os el<strong>em</strong>entos estritamente privados são<br />
or<strong>de</strong>nados e governados por aquilo que <strong>de</strong>sejo ser na consciência do outro, pela<br />
minha imag<strong>em</strong> presumi<strong>da</strong> que construí a partir dos valores <strong>de</strong>ssa consciência<br />
(1992b, p. 171).<br />
Po<strong>de</strong> ser que, acima <strong>de</strong> tudo, elas tenham <strong>de</strong>ixado refletir esse <strong>de</strong>sejo humano <strong>de</strong> ser<br />
herói ao escrever<strong>em</strong> sobre suas experiências com a leitura e a escrita no passado e as<br />
experiências vivi<strong>da</strong>s no presente. Como disse anteriormente, essas experiências, vivencia<strong>da</strong>s<br />
junto à família e no espaço escolar são <strong>de</strong>scritas <strong>de</strong> formas muito diferentes pelas crianças. A<br />
figura materna, como o fator mais realçado nos relatos <strong>da</strong>s crianças, talvez possa ser analisado<br />
e compreendido sob a luz <strong>da</strong> psicologia e <strong>da</strong> teoria psicanalítica, a qual fiz menção há pouco e<br />
cujo aprofun<strong>da</strong>mento não é o caso neste estudo. Mas há outros fatores que são factíveis, a<br />
meu ver, <strong>de</strong> ser<strong>em</strong> consi<strong>de</strong>rados e analisados, a partir <strong>de</strong>ssas experiências relata<strong>da</strong>s pelos<br />
alunos <strong>de</strong>ssa turma e que o farei com maior t<strong>em</strong>po no último capítulo <strong>de</strong>ste trabalho, como: o<br />
73 Ibid., et.seq.