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O jogo da enunciação em sala de aula e a formação de sujeitos ...

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[...] a vivência interna do meu corpo se distingue <strong>de</strong> um reconhecimento <strong>de</strong> seu<br />

valor externo pelos outros e <strong>de</strong> meu direito a ser aceito e amado pelos outros<br />

através <strong>da</strong> minha exteriori<strong>da</strong><strong>de</strong>. Ora, é isso que me v<strong>em</strong> dos outros como uma<br />

dádiva, como uma graça [...]. Dispersos <strong>em</strong> minha vi<strong>da</strong>, todos os atos <strong>de</strong> atenção,<br />

<strong>de</strong> amor, que me vêm dos outros e reconhec<strong>em</strong> meu valor, como que mo<strong>de</strong>lam para<br />

mim o valor plástico <strong>de</strong> meu corpo exterior (1992b, p. 67).<br />

O que po<strong>de</strong> tornar possível a convivência respeitosa e solidária senão um dialogismo<br />

incessante? Pelo convívio vital e dialógico pod<strong>em</strong>os nos constituir uns aos outros, provocando<br />

“alterações recíprocas” (AMORIM, 2006, p.109) tão profun<strong>da</strong>s que possam marcar o começo<br />

<strong>de</strong> uma nova experiência <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> on<strong>de</strong> se creia no po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> reversibili<strong>da</strong><strong>de</strong> humana e se<br />

busque transformar, metamorfosear. Metamorfose por crise, pela prova, pela luta, pelo<br />

combate. “A história real, <strong>em</strong> que nos engajamos durante to<strong>da</strong> a vi<strong>da</strong>, não t<strong>em</strong> criador visível<br />

n<strong>em</strong> invisível porque não é cria<strong>da</strong>. O único ‘alguém’ que ela revela é o seu herói” (ARENDT,<br />

2005, p. 198).<br />

Compartilhamos do sonho e <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> viver numa socie<strong>da</strong><strong>de</strong> diferente na qual<br />

possamos nos ver uns aos outros como seres iguais e absolutamente diferentes “e que nossas<br />

relações não sejam um campo <strong>de</strong> expressão <strong>da</strong> agressivi<strong>da</strong><strong>de</strong> [...] e o outro seja livre,<br />

porquanto minha liber<strong>da</strong><strong>de</strong> começa on<strong>de</strong> começa a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> do outro, e, sozinho, posso no<br />

máximo ser ‘virtuoso na infelici<strong>da</strong><strong>de</strong>’” (CASTORIADIS, 1991, p. 113).<br />

A utopia bakhtiniana v<strong>em</strong> ao encontro <strong>da</strong> práxis revolucionária, compreen<strong>de</strong>ndo que<br />

um dialogismo incessante é a única forma <strong>de</strong> tornar possível uma relação na qual nenhum<br />

sujeito se fun<strong>da</strong> no outro n<strong>em</strong> seja reificado. Nas relações dialógicas, o esforço exotópico leva<br />

os seres humanos a i<strong>de</strong>ntificar-se com o outro, numa posição exterior para <strong>da</strong>r-lhe<br />

acabamento. Ao me i<strong>de</strong>ntificar com o outro, vivencio sua dor ou alegria, e <strong>em</strong>bora não grite<br />

ou me alegre como ele, terei uma reação <strong>de</strong> soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong><strong>de</strong> ou <strong>de</strong> congratulação, não per<strong>de</strong>ndo<br />

o lugar que somente eu posso ocupar quando estou fora do outro.<br />

Devo i<strong>de</strong>ntificar-me com o outro e ver o mundo através <strong>de</strong> seu sist<strong>em</strong>a <strong>de</strong> valores,<br />

tal como ele o vê; <strong>de</strong>vo colocar-me <strong>em</strong> seu lugar, e <strong>de</strong>pois, <strong>de</strong> volta ao meu lugar,<br />

completar seu horizonte com tudo o que se <strong>de</strong>scobre do lugar que ocupo, fora <strong>de</strong>le;<br />

<strong>de</strong>vo <strong>em</strong>oldurá-lo, criar-lhe um ambiente que o acabe, mediante o exce<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />

minha visão, <strong>de</strong> meu saber, <strong>de</strong> meu <strong>de</strong>sejo e <strong>de</strong> meu sentimento (BAKHTIN,<br />

1992b, p. 45).<br />

Este “olhar” exotópico que implica num extravasamento <strong>de</strong> visão, saber, <strong>de</strong>sejo e<br />

sentimento, permite alcançar o estado <strong>de</strong> luci<strong>de</strong>z tal que, segundo Castoriadis (1991), impe<strong>de</strong><br />

que nos apoi<strong>em</strong>os num saber absoluto ilusório, pois “o próprio objeto <strong>da</strong> práxis é o novo” (p.<br />

96); e, <strong>de</strong>ssa forma, não só ele sofre modificação, como também “seu próprio sujeito é<br />

transformado constant<strong>em</strong>ente a partir <strong>de</strong>sta experiência <strong>em</strong> que está engajado e que ele faz,<br />

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