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o. LtvI·STRAUSS<br />
nhoras, a outra seria partilhada entre quatro h~mens,. ~o:s<br />
quais ell fazia parte, exorbitante favor devido a ImposslbI1~dade<br />
sentida pelo sr. B. (que ele reeeba aqui 0 meu agradeelmento)<br />
de transportar como gado um dos seus antlgos .va s <br />
sageiros de luxo. Porque todo 0 resta dos mens companhelr~s,<br />
homens, IDulheres e crian~as, estavam amo~toado~ em poroes<br />
sem ar nem Iuz, oude as carpinteiros da marmha tlllham sumariamente<br />
improvisado leitos superpostos, forrados .de palha.<br />
Dos quatro machos privilegiados, urn era comerCl~nte austriaco<br />
de metais que sabia, sem duvida, 0 que Ihe. havla. custado<br />
eS8a vantagem; outro, urn jovem "beke" - ncO cnoulo -:<br />
separado pela guerra da sua Martinica natal e ~ue merec~a<br />
urn tratamento especial sendo, nesse navia: 0 umeo que. na~<br />
sofria da presunc;;ao de ser juden, estrangelro au a~arqUlsta,<br />
o ultimo, enfim, uma singular personagem norte-a!ncana ~ue<br />
pretendia ir a Nova Iorque apenas por alguns.dlas (proJeto<br />
extravagante, considerando que iamos gastar tres meses para<br />
chega r a esse pOrto), levava urn Degas ua sua mala e, :mbO~~<br />
tao judeu quanta eu pr6prio, parecia persona grata a tOdas<br />
poUcias, seguran~as, guardas e servi~os de prot~ilo ~as co<br />
16nias e protetorados, surpreendente misterio nessa COllJuntura<br />
e que jamais cheguei a decifrar. .<br />
A gentalha, como diziam os guardas, compreendla, eu:re<br />
outros, Andre Breton e Victor Serge. Andre Breton, mu.'to<br />
poueo a vontade nessa galera, deambulava de cima para ban::o<br />
nos raros espa~os livres do conves; vestido de veludo, pareela<br />
urn urso azul. Entre n6s, uma duradoura amizade ia com~r<br />
por uma troca de cartas que se prolongou bastante tempo no<br />
curso dessa interrninavel viagem, e na.s .qU3;is dis~ut!amos as<br />
rela!:Oes entre a beleza estetica e a orlgmahdade ab"ol~ta.<br />
Quanto a Victor Serge, seu passado de companhelr? de<br />
Lenine me intimidava, ao meSillO tempo em que senba a<br />
maior dificuldade em Integra-lo na su~ pe~sonagem, que<br />
lembrava mais uma solteirona cheia de pnucfplOS. 1tsse r?st~<br />
(71abro esses tra~os finos, essa voz clara, aliados a manelra::s<br />
:mpol~das e cautelosas, ofereciam eSiile carater quase assex~ado<br />
que eu devia reeonhecer mais tarde entre os monges budlstas<br />
da fronteira birmil, muito distante do masculo temperame~to. e<br />
da superabund§.ncia vital que a tradi~~O francesa .assocla as<br />
atividades ditas subversivas. E que tlPOS culturalS, que se<br />
reproduzem assas semelhantes em cada sociedade, _por-qu: e . construidos<br />
em t{}rno de oposi~es muito simples, sao ~t~llza~os<br />
pelos diversos grupos para desempenhar fun!:Oes SOClalS dlfe-<br />
TBISTES TBOPIOOS 19<br />
rentes. 0 de Serge havia podido atualizar-se noma carreira<br />
revoluciomiria na Russia; que aconteceria em outro Iugar?<br />
Sem duvida, as rela~es entre duas sociedades seriam faciIitadas<br />
se filsse possivel, por meio de uma especie de tabela,<br />
estabelecer urn sistema de equivalencias entre as rnaneiras<br />
pelas quais cada uma utiIiza tipos humanos analogos para desempenhar<br />
fun~oes sociais diferentes. Em Iugar de nos Iimitarmos,<br />
como se faz hoje em dia, a confrontar m~dicos e m~dicos,<br />
industriais e industriais, profess{}res e profess6res, perceberfamos<br />
taIvez que existem correspondencias mais sutis<br />
entre os indivfduos e os papeis.<br />
AI~m do seu carregamento humano, 0 navio transportava<br />
nao sei que material ciandestino; passon urn tempo prodigioso,<br />
no Mediterraneo e na costa ocidental da Africa, a procurar<br />
refugio de pl>rto em pOrto, para escapar, segundo parece, a<br />
fiscaIiza~ao da esquadra ingH~sa. Os possuidores de passaportes<br />
franceses eram por vezes autorizados a descer; os outros<br />
ficavam encerrados nas poucas dezenas de centimetros quadrados<br />
de que cada urn podia dispor nUID eonv~.s que 0 calor<br />
- crescente It medida em que nos aproximavamos dos tr6picos<br />
e tornava intoleravel a permanencia nos poroes - transformava<br />
progressivamente numa combina~ao de sala de jantar,<br />
quarto de dormir, bergario, Iavanderia e solario. Mas, 0 mais<br />
desagradavel era 0 que se chama no regimento "os cnidados<br />
de Iimpeza". Dispostas simetricamente ao Iongo da amnrada,<br />
a bombordo para os homens e a estibordo para as mUlheres,<br />
a equipagem tinha construido dois pares de barracas de tabuas,<br />
sem ar nero luz; urn, com alguns chuveiros, que funcionavam<br />
somente pela manha; 0 outro, munido de uma longa vala de<br />
madeira grosseiramente forrada de zinco na parte de dentro<br />
e deserobocando s6bre 0 oceano, servia para 0 usa qne se<br />
adivinha; os inimigos duma promiscuidade demasiado grande<br />
e que repugnavam a pl>r-se coletivamente de c6coras, numa<br />
posi~ao alias instavel pelo j{}go do navio, nao tinham outro<br />
recurSo senao levantar-se muito cedo e durante t6da a travessia<br />
uma sorte de corrida se organizou entre os deIicados,<br />
de tal maneira que, no fim, era apenas as 3 horas da manha,<br />
mais ou menos, que se podia esperar uma relativa solidao.<br />
Acabavamos por nao mais nos deitar. Com duas horas de diferen~a,<br />
acontecia 0 mesmo com 0 chuveiro, oude se fazia<br />
sentir, se nao a mesma preocupa~ao de pudor, pelo menos a<br />
de poder arranjar urn Iugar naquela barafunda em que uma<br />
agua insuficiente e como que vaporizada ao contacto de tantos<br />
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