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172 O. LEVI-STRAUSS<br />

Uma centena de quilometros para ca encontrava-se uma<br />

explora~ao agricola, que tinhamos escolhido como base de partida<br />

para alcan~ar os Caduveo. A Fazenda Francesa, como a<br />

chamavam os ferroviarios, ocupava urn peda~ de mais au<br />

menos 50.000 hectares, onde 0 trem rodava durante 120 quilometros.<br />

Nessa extensao de capoeiras e de ervas secas, errava<br />

um rebanho de 7.000 cab~s (na regiao tropical, 5 a 10 hectares<br />

mal dao para uma cab8!;a) peribdicamente exportado para<br />

Sao Paulo, gra~as a estrada de ferro que fazia dois ou tres<br />

altos nos limites do dominio. A que servia a habita~ilo se<br />

chamava Guaicurus, lembrando 0 nome de grandes tribos beIicosas<br />

que outrora reinaram nestas paragens, e das quais, em<br />

territ6rio brasileiro, os Caduveo sao os 11ltimos sobreviventes.<br />

Dais franceses dirigiam a explora~ao com algumas famfIias<br />

de vaqueiros. Ja nao me lembro 0 nome do mais jovem; 0<br />

ontro, que se aproximava da quarentena, chamava-se Felix ­<br />

Don Felix, dizia-se familiarmente. Morreu, ha alguns aoos,<br />

assassinado por um indio.<br />

Nossos anfitriOes tinham crescido ou servido durante a<br />

primeira guerra mundial; seu temperamento e suas aptidoes<br />

destinavam-nos a tornar-se colonos marroquinos. Nao sei que<br />

especula~es em Nantes os arrastaram a uma aventura mais<br />

incerta, numa regHio esquecida do Brasil. Seja como for,<br />

10 anos depois da sua fundac;;ao, a Fazenda Francesa se estiolava,<br />

por causa da insuficiencia dos primeiros capitais, absorvidos<br />

na compra das terras, sem margem disponivel para 0<br />

melhoramento do gado e do equipamento. Num vasto bangal6<br />

a inglesa, nossos hospedeiros levavam uma vida austera, meio<br />

criadores e meio negociantes de secos e molhados. Com efeito,<br />

o armazem da fazenda representava 0 unico centro de aprovisionamento<br />

num raio de 100 quililmetros, ou pouco menos. Os<br />

empregados, isto e, os trabalhadores OU peOes, ai viuham<br />

gastar com uma das maos 0 que haviam ganho com a outra;<br />

urn lan~amento de escrita permitia transformar 0 seu credito<br />

em divida, e, desse ponto de vista, todo 0 empreendimento<br />

funcionava quase sem dinheiro. Como os pr~os das mercadorias<br />

eram, conforme 0 usa, fixados no dobro ou no triplo do<br />

curso normal, 0 neg6cio poderia ser rendoso, se esse aspecto<br />

comercial nao tivesse permanecido secundario. Ravia qualquer<br />

coisa de doloroso, aos sabados, em ver os eperarios trazerem<br />

uma pequena colheita de cana de a~ucar, moe-Ia imediatamente<br />

no engenho da fazenda - miiquina feita de troncos<br />

grosseiramente esquadriados, na qual as hastes de ~na<br />

TBISTES TB6PIOOS 173<br />

sao esmagadas peia rota~o de tres cilindros de madeira ­<br />

depois, em grandes tachos de ferro, fazer evaporar 0 sueo<br />

ao fogo, antes de derrama-Io em formas em que se transformavam<br />

em blocos amarelos de consistencia granulosa: a rapadura;<br />

depositavam entao 0 produto no armazem adjaeente,<br />

onde, transformados em compradores, iam no rnesmo dia adquirir<br />

ao pr~o forte para oferece-la aos seus filhos, essa<br />

tini.ca guloseima do sertao.<br />

~ossos anfitrioes encaravam filosbficamente essa ath~idade<br />

de exploradores; sem contacto com seus empregados, fora do<br />

trabalho, e sem vizinhos da mesma classe (ja que a reserva<br />

india se estendia entre eles e as planta~es mais pr6ximas da<br />

fronteira paraguaia), impunham-se uma vida muito estrita, cuja<br />

observancia era, sem dl1vida, a melhor prot~ao contra 0 desanimo.<br />

Suas tinieas coneessoes ao continente eram a roupa e<br />

a bebida: nessa regiao fronteiri!:R, em que se rnisturavam as<br />

tradi~es brasileira, paraguaia, boliviana e argentina, tinham<br />

adotado a roupa dos pampas: chapeu boliviano, de palha cinzenta,<br />

finamente tran!:Rda, de largas abas levantadas e de<br />

calota alta; e 0 chiripa, especie de fralda para adultos, em<br />

tecido de cores mortas, listado de amarelo, de rosa ou de azul,<br />

e que deixa as pernas nnas fora das botas brancas de lona<br />

grossa, subindo ate a barriga da perna. Xos dias mais frios,<br />

substituem 0 chiripii. pela b01nbacha: cal~s fMas a zuavo,<br />

ricamente bordadas nos lados.<br />

Quase todos os seus dias se passavam no curral para<br />

"trabalhar" os animais, isto e, inspeciona-Ios e separa-los para<br />

a venda, por ocasUio dos ajuntamentos peri6dicos. Numa tempestade<br />

de poeira, os animais dirigidos pelos gritos guturais<br />

do capataz, desfilavam aos olhos dos senhores, para serem<br />

separados em diversos pastos. Zebus de chifres compridos,<br />

vacas gordas, terneiros assustados, acavalavam-se nas passagens<br />

de madeira em que, por vezes, urn touro recusava penetrar.<br />

Quarenta metros de couro finamente tran~ado passam enta~<br />

turbilbonantes sobre a cab~a do la(}oeiro e no meSillO instante,<br />

parece, 0 animal cai, enquanto se empina 0 cavalo triunfante.<br />

Mas, duas vezes por dia - as 11,30 da manM, e as 7<br />

horas da noite - todo 0 mundo se reunia sob a pergola que<br />

rodeava as P8\:as da habita~[o para 0 rito bicotidiano do chimarrao,<br />

ou seja, 0 mate tornado por urn eanudo. Sabe-se que<br />

o mate e urn arbusto da mesma famnia que a nossa carrasqueira,<br />

cujos ramos, ligeiramente tostados a fuma~ de urn<br />

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