You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
'nmpl<br />
242 0. LtvI-STBAUSS TBISTES TB6PICOS 243<br />
FIG. 38 - Um<br />
"zumb·idor".<br />
Essa sem-cerimonia com rela~o<br />
aD sobrenatural me surpreendia tanto<br />
mais quanta meu l.1nico contacto<br />
com a religiao datava de uma infancia<br />
jll. incredula, quando eu habitava,<br />
durante a primeira guerra<br />
mundiaI, a casa de men avo, rabino<br />
em Versalhes. A casa, adjacente it.<br />
sinagoga, era-Ihe ligada por urn longo<br />
corredor interna, oude nao nos arriscavamos<br />
sem angUstia, e que formava,<br />
por si 86, uma fronteira intransponfvel<br />
entre 0 mundo profane e<br />
aqu{He a que faHava precisamente<br />
esse calor humane que seria uma<br />
condi!:ao previa para a sua perce~ao<br />
como sagrado. Fora das horas do<br />
culto, a sinagoga permanecia vazia<br />
e sua ocupa~ao temporaria DaD era<br />
jamais tao prolongada nero fervente<br />
para preencher 0 estado de desola~iio<br />
que Ihe parecia ser natural e que os<br />
offcios perturbavam de maneira incongruente.<br />
0 culto familial sofria<br />
da mesma secura. Salvo a ora("ilo<br />
muda de meu avo no inicio de cada<br />
refei~ao, nada mais mostrava as<br />
crian~as queestavam submetidas ao<br />
reconhecimento de uma ordem superior,<br />
a nao ser uma bandeirola de<br />
papel impresso, fixada na parede da<br />
sala de jantar e que dizia: "Mastigne<br />
bern os alimentos, a digestao depende<br />
disso".<br />
Xao e que a religiao tivesse<br />
maior prestigio entre os Bororo:<br />
muito pelo contrario, ela era rotineira.<br />
Na casa dos homens, os gestos<br />
do culto se realizavam com a mesma<br />
desenvoltura de todos os outros,<br />
como se se tratasse de atos utilitarios<br />
executados por seu resultado,<br />
sem reclamar a atitude respeitosa<br />
que se imp5e mesmo ao incredulo quando penetra num santuario.<br />
Esta tarde, canta-se na casa dos homens como prepara~iio<br />
para 0 ritual publico da noite. Num canto, jovens<br />
roncam ou conversam, dois au tres homens cantarolam agitando<br />
os chocalhos, mas se urn diHes tern vontade de acender<br />
urn cigarro au se e a sua vez de servir-se do mingau de milho,<br />
passa 0 instrumento a urn vizinho que continua, au ele proprio<br />
continua com uma mao, enquanto se ~a com a outra.<br />
Que urn dan~arino se exiba, para fazer admirar a sua ultima<br />
cria~ao, e todo 0 mundo para e comenta, 0 oficio parece esquecido<br />
ate que, noutro canto, a incanta~ao recomece, no ponto<br />
em que fora interrompida.<br />
E, entretanto, a significa~ao da casa dos homens ultrapassa<br />
ainda a que se liga ao centro da vida social e religiosa<br />
que tentei descrever. A estrutura da aldeia nao perrnite<br />
apenas 0 j6go refinado das institui~es: ela resumee garante<br />
as rela~es entre 0 hornem e 0 universo, entre a sociedade e<br />
o mundo sobrenatural, entre os vivos e as mortos.<br />
Antes de abordar esse novo aspecto da cultura bororo, e<br />
preciso abrir urn parentesis a prop6sito das rela~es entre<br />
mortos e vivos. Sern isso, seria dificil compreender ,a solw;ao<br />
particular que 0 pensamento bororo da a urn problema universal<br />
e que e notavelmente similar a que se encontra no outro<br />
lado do hemisferio ocidental, entre as POPula~oes das florestas<br />
e prados do nordeste da America setentrional, como os<br />
Ojibwa, os Menomini e os Winnebago.<br />
Nao existe provAvelmente nenhuma sociedade que nao<br />
trate os seus mortos com considera~o. Nas pr6prias fronteiras<br />
da especie, 0 homem de Neandertal enterrava tambem OS<br />
seus defuntos em tumulos snmariamente arrumados. Sem dl.1vida,<br />
as praticas funerarias variam com os grupos. Dir-se-a que<br />
essa diversidade e secundaria, tendo em conta 0 sentimento<br />
una-nime que ela recobre? Mesmo quando tentamos simplificar<br />
ao extremo as atitudes para com os mortos, observadas<br />
nas sociedades humanas, somos obrigado a respeitar uma<br />
grande divisao, entre os polos da qual se opera a passageill<br />
atraves de uma serie de intermedhlrios.<br />
Certas sociedades deixam repousar seus mortos; por meio<br />
de homenagens peri6dicas, estes abster-se·ao de incomodar os<br />
vivos; se voltam para ve-Ios, sera a intervalos e em ocasiOes<br />
previstas. E sua visita sera benfazeja, as mortos garantindo<br />
POr sua prote~o 0 retOrno regular das esta!:iies, a fecundi-<br />
~U SOlU~U<br />
Sl: It:lnl::lS<br />
llTS9dOJd (<br />
81«·'eU'eC<br />
',:>un!" n<br />
mb. '"!1r<br />
n OUlO:J 'el~<br />
.01 I11d 'P'<br />
Ul~ '1-e!:J~(<br />
ldnbj.nb.<br />
'{'elU~W 'e~<br />
dpmlj! d(<br />
U~Ul -e:JU~'<br />
"01') dO'<br />
~:J<br />
OlU~W<br />
J",U! dP s'<br />
'P!U",U! .<br />
U1'p o~~<br />
;ol:>dds. S!<br />
·s.d dp'P'<br />
mb 'I11nJS'<br />
Tdsu! 01ll"<br />
:> 'p'P!Ul;<br />
~llO:J S'E C<br />
qdJdl 'P (<br />
o'\'P 0p"'<br />
!l:J 'E aUla:<br />
op '!"9"