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174 O. LEVI-STRAUSS TBISTES TR6PICOS 175<br />
braseiro subterrAneo, sao mofdos Dum p6 grosseiro, cOr de<br />
reseda, que se conserva por muito tempo em barris. Falo do<br />
verdadeiro mate, porque 0 produto vendido ua Europa COlli<br />
essa etiquEita sofren geralmente tao maleficas transformaf;oes<br />
que perdeu qualquer semelhau{;a com 0 original.<br />
Ha diversas maneiras de tamar mate. Em expedi.;;ao,<br />
quando, esgotados e impacientes demais pela reconforto instant§..neo<br />
que ele proporciona, contentavamos com jogar urn<br />
grande punhado ua agua fria, imediatamente posta a ferver,<br />
mas retirada do fogo - issa e capital - a primeira bolha,<br />
senao 0 mate perde todo 0 sabor. Chama-se, entao, eha de<br />
mate, infusao ao contrario, verde escura e quase licorosa,<br />
como uma chicara de cafe forte. Quando nao ha tempo, conteIltamo-nos<br />
com 0 terere, que consiste em aspirar com uma<br />
pipeta a agua fria com que se regou urn punhado de pO.<br />
Pode-se tambem, se nao se gosta do amargo, preferir 0 mate<br />
doce, a maneira das belas paraguaias; e preciso entao caramelizar<br />
0 pO misturado com a~ucar num fogo vivo, jogar agua<br />
fervendo nessa mistura e peneirar. l\.fas nao conh~o amador<br />
de mate que nao ponha mais alto que tOdas essas receitas 0<br />
chimarrao, que e ao mesmo tempo urn rito social e urn vicio<br />
privado, tal como se praticava na fazenda.<br />
Sentam-se em circul0 ao redor duma menina, a ohina,<br />
que carrega uma chaleira, urn fogareiro e a cuia, ora uma<br />
caba~a com orifido cercado de prata, ora - como em Guaiw<br />
curus - urn chifre de zebu esculpido por urn peao. Enche-se<br />
o receptaculo com dois ter.;:os de p6 que a menina embebe<br />
progressivamente em agua fervendo; assim que a mistura<br />
forma uma pasta, ela escava, com 0 tubo de prata cuja extremidade<br />
inferior, e urn bulbo perfurado, urn canal cuidadosamente<br />
perfilado para que 0 canudo repouse bern no fundo,<br />
numa pequena gruta em que 0 liquido se acumulara, enquanto<br />
o tuba deve conservar apenas 0 jogo necessario para nao<br />
comprometer 0 equilibrio da rnassa pastosa, mas nao demais,<br />
pais do contrario a agua nao se misturara. Assim arrumado<br />
o chimarrao, basta satura-Io de Ifquido antes de oferectHo ao<br />
dono da casa; depais de tornado duas ou tres vezes e devolvido<br />
o vaso, a mesma opera~ao se repete para todos as participantes,<br />
os homens, em primeiro lugar, as mulheres depois, se estiverem<br />
presentes. As voltas se sucedem, ate esvaziar a chaleira.<br />
Os primeiros goles provocam uma sensa.;:ao deliciosa <br />
pelo menos para quem esta acostumado, parque 0 principiante<br />
se queima - feita do contacto meio viscoso da prata escaldada,<br />
da agua efervescente, rica de uma espuma substancial: amarga<br />
e cheirosa ao mesmo tempo, como uma floresta inteira concentrada<br />
em algumas gotas. 0 mate contem urn alcaloide<br />
analogo aos do cafe, do cha e do chocolate, mas cuja dosagem<br />
(no semiwverdor do veicnlo) explica talvez a sna virtude repousante<br />
e revigorante ao mesmo tempo. Depois de algumas rodadas,<br />
0 mate perde 0 gosto, mas prudentes exploraQ6es perw<br />
mitem atingir com a bomba anfratuosidades ainda virgens e<br />
que prolongam 0 prazer em outras tantas explosoes de amargor.<br />
Sem dlivida, e necessario pOr 0 mate muito adiante do<br />
guarana amazonico, de que falarei em ontro Ingar; e mais<br />
ainda, adiante da triste coca do planalto boliviano; insossa<br />
rumina.;:ao de fOlhas secas, logo reduzidas ao estado de bolota<br />
fibrosa, com sabor de tisana, insensibilizando a mucosa e<br />
transformando a lingua do mastigador num corpo estranho.<br />
Digno de the ser comparado, s6 vejo 0 plantnroso naco de bew<br />
tele recheado de especiarias, ainda que enlouque~a 0 paladar<br />
nao prevenido com uma salva aterradora de sabores e de<br />
perfumes.<br />
Os indios caduveo viviarn nas terras baixas da margem<br />
esquerda do Rio Paraguai, separados da Fazenda Francesa<br />
pelas colinas da Serra Bodoquena. Nossos anfitrioes os tiw<br />
nham por pregui.;:osos e degenerados, ladroes e bebados, rudemente<br />
expuisos das pastagens quando nelas tentavam penetrar.<br />
Nossa expedi~ao parecia-Ihes antecipadamente condenada, e,<br />
a despeito do auxilio generoso que nos proporcionaram e sem<br />
o qual nao poderiamos ter realizado a nossa missao, encaravam-ua<br />
com desaprova.;:ao. Qual DaO foi 0 seu espanto quando<br />
nos viram, algnmas semanas mais tarde, voltar com os bois<br />
tao carregados quanta os de uma caravana: grandes jarras de<br />
ceramica pintada e gravada, couros de cabrito iluminados de<br />
arabescos, madeiras esculpidas figurando urn panteao desaw<br />
parecido. .. Foi uma revela.;:ao, que provocou entre eles uma<br />
estranha mudan~a: por ocasHlo duma visita que me fez Don<br />
Felix em Sao Paulo, 2 ou 3 anos mais tarde, deduzi que ele<br />
pr6prio e sen companheiro, outrora tao altaneiros com a popula.;:ao<br />
local, tinham, como dizem os ingleses, gone native,. a<br />
pequena sala bnrguesa da fazenda estava agora recoberta de<br />
peles pintadas, com cerfimicas indigenas por todos os cantos;<br />
nossos amigos brincavam de bazar sudanes ou marroquino,<br />
como bons administradores coloniais que deveriam ter sido.<br />
E os indios, tornando:..se s-ens-- fCirnecedores regulares, eram rew<br />
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