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404 o. LEVI-STRAUSS TB!STES TBOPIOOS 405<br />

da excital;ao completa: 0 sinal, a alusao, a premoni!:ao de<br />

certas farmas, bastavam.<br />

Por Ieguas e leguas, a mesma frase me16dica cantava em<br />

minha mem6ria sem que en me pudesse libertar. Descobria-Ihe<br />

sem cessar novos encantos. Muito frouxa de inicio, pareciame<br />

que ela enroscava progressivamente 0 sen fio, como pa:a<br />

dissimular a extremidade que a terminaria. Essa forma~ao<br />

do fruto que sucede a flor se tornava inextricavel, a ponto<br />

de en indagar como iria ela arranjar safda; de repente. ullia<br />

nota resolvia tudo e essa escapat6ria paree-ia mais arrojada<br />

ainda que a caminhada comprometedora que a precedera, reclamara<br />

e tornara possfvel; ao olivi-Ia, os desenvolvimentos<br />

anteriores se aclaravam com urn novo sentido: sua procura<br />

ja nao era arbitraria, mas a prepara~ao dessa saida insuspeitada.<br />

Era enUio isso, a viagem: Uma explora~o dos desertos da<br />

minha memoria, mais que a dos desertos que me cercavam?<br />

Certa tarde, enquanto tudo dormia sob 0 calor esmagador:<br />

encolhido na minha rede e protegido dos "pestes" - como all<br />

se diz - pelo mosquiteiro, cuja etamine cerrada torna 0 ar<br />

ainda menos respiravel, parecia-me que os problemas que me<br />

atormentavam forneciam a materia de uma ~a de teatro. Eu<br />

a concebia com tanta precisao como se ja estivesse escrita.<br />

Os indios tinham desaparecido: durante seis dias, escrevi da<br />

manha a noite, no verso de fOlhas cobertas de vocabuhirios,<br />

de desenhos e de genealogias. Depois do que a imagina~ao me<br />

abandonou em pieno trabalho e jamais voltou. Relendo meus<br />

rabiscos, creio nao precisar lamenta-Io.<br />

:lfinha ]Je!;a se intitulava: A Apoteose de Augusto e se<br />

apresentava como uma nova versao de Cint'la. Ela punha<br />

em cena dois homens, amigos de infancia, que se encontravam<br />

no momento crucial, para eada urn deles, de suas carreiras<br />

divergeutE-£. Urn, que jUlgara optar contra a civiliza~ao, descobre<br />

que empregou urn meio complicado de voltar a ela, mas<br />

por urn metodo que abolia 0 sentido e 0 valor da alternativa diante<br />

da qual se supusera outrora colocado. 0 outro, marcado<br />

desde 0 nascimento para a vida social e suas honrarias, compreende<br />

que todos os seus esfor~os teoderam para urn termo<br />

que os vota ao aniquilamento; e ambos procuram, na destrui~ao<br />

de urn pelo outro, salvar, mesmo a pre~o da morte, a<br />

significa~ao de seu passado.<br />

A ~a come~ava no momento em que 0 Senado, q~eren~o<br />

conceder a Augusto uma honra mais alta do que 0 ImperlO,<br />

votara a apoteose e se preparava para coloca-Io vivo entre os<br />

denses. Nos jardins do palacio, dois guardas discutem 0 acontecimento<br />

e procuram, de seu ponto de vista particular, prever-Ihe<br />

as conseqiiencias. 0 oficio de policial nao se vai tornar<br />

impossfvel? Como se podera proteger urn deus que tem<br />

o privilegio de se transformar em iuseto ou mesmo de se<br />

tornar invisivel e de paralisar quem quiser? Pensam na greve;<br />

seja como f&r, merecem urn aumento.<br />

Chega 0 chefe de polfcia e lhes explica 0 engano. A polfcia<br />

nao tern uma missao que a distinga daqueles a quem serve.<br />

Indiferente aos fins, ela se c,onfunde com a pessoa e os interesses<br />

dos seus senhores, respleI;lde com a sua gl6ria. A po­<br />

!fda de urn chefe de Estado divinizado tornar-se-a tamMm<br />

divina. Como a me pr6prio, tudo the sera possfvel. Realizando<br />

sua verdadeira natureza, poder-se-a dizer dela, no estilo<br />

das agencias de detetives: tUdo 00, tUdo ouve, ninguem peroebe.<br />

A cena· enche-se de personagens que saem do Senado<br />

comentando a sessao que acaba de realizar-se. Diversos quadros<br />

pOem em evidencia as maneiras contradit6rias de conceber<br />

a passagem da humanidade a divindade; os representantes<br />

dos grandes interesses especulam s&bre as novas possibilidades<br />

de enriquecimento. Augusto, muito imperador, pensa somente<br />

na confirma~ao do seu poderio, dai por diante ao abrigo das intrigas<br />

e das combina~es. Para sua mulher, Uvia, a apoteose<br />

coroa uma carreira: "ele bern 0 merece": em suma, a Academia<br />

Francesa... Camila, jovem irma de Augusto e apaixonada<br />

por Cinna, anuncla-Ihe a volta deste ultimo depois de<br />

dez anos de vida aventurosa. Ela deseja que Augusto 0 veja,<br />

pois espera que a personagem caprichosa e pOOtica que ele<br />

sempre foi, retera seu irmao, a ponto de voltar-se irrevog3.vel~<br />

mente para 0 Indo da ordem. Livia opOe~se: na carreira de<br />

•<br />

Augusto, Cinna s6 foi urn eiemento de desordem; e urn doidivanas,<br />

que apenas se sente bern entre os selvagens. Augusto<br />

fica tentado por essa opiniiio; mas, delega~oes sucessivas de<br />

sacerdotes, pintores, poetas, come~am a perturba-Io. Todos<br />

concebem a divindade de Augusto como uma expulsao do<br />

mundo: os sacerdotes esperam que a apoteose devolva 0 poder<br />

temporal as suas maos, ja que sao os intermediarios titulados<br />

entre os deuses e OS homens. Os artistas querem fazer passar<br />

Augusto ao estado de Weia, e nao mais de pessoa; para grande<br />

escandalo do casal imperial, que se ve em estatuas de marmore<br />

maiores do que 0 tamanho natural, com uma parecen~a<br />

embelezada, eles sugerem Wda especie de representa~oes em<br />

forma de turbilhiles ou de poliedros. A confusao aumenta<br />

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