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216 TBISTES TB6PICOS 217<br />
em caoo de chuva. Era tamMm preciso pendurar, nos iados, 0<br />
macaCD e as ferramentas, bern como urna provisao de cordas<br />
e de tabuas, destinadas a substituir as pontes destruidas. Na<br />
madrugada do dia seguinte, i~avamo-nos ao alto do carregamento,<br />
como em urn camelo; e 0 caminhao com~ava a sua<br />
progresslio oscilante; desde 0 meio-dia as dificuidades aparedam;<br />
terras inundadas ou pantanosas, que era necessaria<br />
estivar com madeira; assim passel tres dias a deslocar de<br />
tras para diante, um tapete de pranchas duas v~zes ;"ais<br />
comprido do que 0 caminhao, ate que a passagem dificil fOsse<br />
transposta; ou entao era a areia, e escav:lvamos sob as rodas,<br />
enchendo os vazios com folhagem. Ainda quando as pontes<br />
intactas, deviamos descarregar inteiramente para aliviar, e<br />
tornar a carregar, uma vez passadas as tabuas oscilantes; se<br />
as encontravamos incendiadas por uma queimada, acampAvamos<br />
para reconstrui-las e desmonta-las em seguida, pois as<br />
tabuas podiam ser indispensaveis para Dutra vez; enfim, havia<br />
os grandes rios, passaveis sbmente em balsas formadas<br />
de tres pirogas reunidas por travesroes e que, sob 0 peso do<br />
caminhao, meSillO descarregado, afundavam ate A beirada,<br />
taivez somente para levar 0 veicuio ate uma margem abrupta<br />
demais ou demasiado lamacenta para que ele pudesse subir;<br />
e eram enta~ pistas a improvisar s&bre muitas centenas de<br />
metros, ate uma melhor atraca~ao ou urn vAu.<br />
Os homens que faziam profissao de eonduzir esses caminhoes<br />
estavam habituados a permanecer em viagem durante<br />
semanas, As vezes durante meses. Dois formavam uma equipe:<br />
o motorista e seu ajudante, um no volante, 0 outro empoleirado<br />
no estribo, espi'ando OS obstAculos, vigiando a progressao,<br />
como 0 marinheiro se coloca na proa para ajudar 0 pil&to a<br />
transpor uma passagem. Tinham sempre a carabina ao aleanee<br />
da mao, pois nao era raro que urn veado ou uma anta<br />
parasse ua frente do eaminhao, mais eurioso do que assustado.<br />
Atirava-se imediatamente e 0 exito deeidia a sorte do trecho<br />
a veneer: era preciso despojar, esvaziar 0 animal, cortar os<br />
quartos em fatias de carne, como uma batata que se descasca<br />
em espiral ate 0 centro. Os peda~os eram imediatamente<br />
friccionados com uma mistura sempre pronta de sal, de pimenta<br />
e de aiho picado. Expunham-se ao sol durante algumas<br />
horas, 0 que permitia esperar 0 dia seguinte para renovar a<br />
opera~ao, que devia ser tambem repetida nos dias subseqiientes.<br />
Obtinha-se assim a ca.rne de 801, menos gostosa que a carne<br />
de vento, que se faz seear no alto de uma vara, em pieno<br />
vento, il falta de sol, mas que tamMm se guarda por menos<br />
tempo.<br />
Estranha existeneia a desses con ores habilissimos, sempre<br />
prontos para os consertos ma' deiicados, improvisando e<br />
apagando a estrada il sua pas gem, expostos a permanecer<br />
diversas semanas em pleno to no lugar em que 0 caminhao<br />
se quebra; ate que u mhao coneorrente passe, para dar 0<br />
aierta em 'CuiaM, de onde se pedira, em Sao Paulo ou no<br />
Rio, que remetam a p~ quebrada! Durante ~sse tempo,<br />
aeampa-se, ea~a-se, lava-se roupa, dorme-se, paeienta-se. Meu<br />
meihor motorista era um foragido da justi!:R depois de um<br />
crime ao qual jamais fazia alusao; tinha-se conhecimento disso<br />
em Cuiaba; ninguem dizia nada: para realizar urn percurso<br />
impossivei, ninguem poderia substitui-Io. Aos oihos de todos,<br />
sua vida, arriscada todos os dias, pagava Iargamente a que<br />
ele tinha eliminado.<br />
Quando deixavamos 'CuiaM, pelas 4 horas da manhii, ainda<br />
estava escuro. 0 olhar adivinhava algumas igrejas decoradas<br />
de estuque, da base il tOrre; as ultimas ruas cai~adas com<br />
pedras do rio e ladeadas de mangueiras podadas em tabuieiro<br />
faziam estremecer 0 caminhao. 0 aspecto caraeterfstieo de<br />
pomar oferecido peio descampado - em razao do espa~amento<br />
natural das arvores - d::i ainda a ilusao duma paisagem arrumada,<br />
quando ja se esta no mato; a pista logo se torna<br />
suficientemente dificil para persuadir disso: eieva-se ela sobre<br />
o rio em curvas pedrentas interrompidas de ravinas e vaus<br />
Iamacentos, invadidos pela capoeira. Desde que se ganha urn.<br />
poueo de altitude, deseobre-se uma linha fina e rosada, fixa<br />
demais para ser confundida com os albores do dia. Durante<br />
muito tempo, contudo, desconfia-se de sua natureza e de sua<br />
reaiidade. Mas, depois de 3 ou 4 horas de viagem, no alto<br />
duma subida pedrenta, 0 oihar abra!:R um horizonte mais<br />
vasto e que for~ A evideneia: do norte ao suI, uma parede<br />
vermeiha se ergue a 200 ou 300 metros acima das colinas<br />
verdejantes. Para 0 norte, ela se inclina lentamente ate se<br />
confundir com 0 pianalto. Mas do lado do suI, por onde nos<br />
aproximamos, com~am-se a distinguir os pormenores. ]'::sse<br />
muro, que ha poueo parecia sem faIba, esconde chamines<br />
estreitas, postes destacados em vanguarda, baiciles e piataformas.<br />
Nessa obra de pedra, ha redutos e desfiiadeiros. 0<br />
caminhao empregara mUitas horas para subir a rampa, mal<br />
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