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78 C. LEVI~STR.AUSS<br />
TBISTEg TBOPICOS<br />
79<br />
uma acomoda~lio que restabelece uma rela~lio normal entre os<br />
Mrmos; 0 trabalho se tornon imperceptivel, verificamo-Io apenas<br />
pela a~ao do mecanismo mental que se produz 11 descida<br />
do avHio. Mas essa incomensurabilidade congenital dos dais<br />
mundos penetra e deforma nossos julgamentos. Os que dedaram<br />
feia Nova Iorque Sao apenas vitimas de uma ilusao de<br />
perce~o. Nlio tendo ainda aprendido a mudar de registro,<br />
obstinam-se em julgar Nova Iorque como uma cidade, e criticaID<br />
as avenidas, os parques, os monumentos. E, sem dl1vida,<br />
objetivamente, Nova Iorque e uma cidade, mas 0 espetaculo<br />
que ela propOe a sensibilidade europeia oj de outra ordem de<br />
grandeza: 0 das nossas proprias paisagens; enquanto que as<br />
paisagens americanas nos arrastariam a urn sistema aioda<br />
mais vasto e para 0 qual DaO possuimos equivalente. A beleza<br />
de :Kova Iorque DaO decorre, pois, da sua natureza de<br />
cidade, mas da sua transposi~ao, para 0 nosso OIho, inevitavel<br />
se renunciarmos a nos obstinar, da cidade ao nivel de uma<br />
paisagem artificial em que os princfpios do urbanismo nao<br />
valem mais: os l.1nicos valores signifieativos sendo 0 aveludado<br />
da luz, a finura dos distantes, os precipicios sublimes ao pe<br />
dos arranha-ceus, e dos vales sombreados semeados de auto·<br />
m6veis muIticoloridos como fI6res.<br />
Depois disso, sinto-me tanto mais embara~do para falar<br />
do Rio de Janeiro, que me desagrada, a despeito da sua<br />
beleza tantas vezes celebrada. Como direi? Parece-me que<br />
a paisagem do Rio nao esta na escala das suas pr6prias dimensoes.<br />
0 Pao de A~l.1car, 0 Corcovado, todos esses pontos<br />
tao louvados parecem ao viajante que penetra na baia como<br />
tocos de dentes perdidos nos quatro cantos de uma bOca banguela.<br />
Quase constantemente submergidos na bruma pegajosa<br />
dos tr6picos, esses acidentes geograficos nlio chegam a mobiliar<br />
urn horizonte largo demais para se contentar com ~les. Se se<br />
quiser abarcar urn espetaculo, e necessario tomar a baia ao<br />
contrario e contempla-Ia das alturas. Do lado do mar e por<br />
uma ilusao inversa a de Nova Iorque, e a natureza que aqui<br />
se reveste da forma de urn predio em constru~ao.<br />
Assim, as dimensOes da baia do Rio nao sao perceptiveis<br />
com 0 auxilio de referencias visuais: a lenta progressao do<br />
navio, suas manobras para evitar as ilhas, 0 frescor e os<br />
perfumes que descem bruscamente das florestas agarradas aos<br />
morros, estabelecem por antecipa~ao uma espeeie de contacto<br />
fisico com as flares e as rochas que ainda DaO existem como<br />
obje~os, mas preformam para 0 viajante a fisionomia de urn<br />
contmente. E oj ainda Colombo que retorna a mem6ria: "As<br />
arvores eram tao altas que pareciam tocar 0 ceu· e se Compreendi<br />
bern, jamais perdem as suas falhas: POi~ ~s vi tao<br />
verdes e freseas em novembro quanto no mes de maio na Espanha;<br />
algumas estavam, mesmo, em flor, e ontras carregadas<br />
.de frutos... Em qualquer dir~o que me virasse, 0<br />
r?uxlll.ol canta~a, a:ompanhad~ de milhares de aves de espe<br />
CIBS .dlferentes. EIS a AmerIca, 0 continente se imp5e. 1!::le<br />
oj felto de t&las as presen~as que animam ao crepusculo 0<br />
hori~onte nebuloso da baia; mas, para 0 recem-chegado, esses<br />
mov1m:mtos, essas formas, essas luzes, nao indicam provfncias<br />
lu~areJos e eidades; nao significam florestas, campos, vales ~<br />
palsagenS; nao traduzem os passos e os trabalhos de individUo~<br />
que se ignoram Uns aos outros, eada um fechado no<br />
h?rIzonte estreito da sua famnia e do seu oficio. Tudo isso<br />
Vlve duma existencia unica e global. 0 que por tooos os<br />
Indos me rodeia e me esmaga, nlio oj a diversidade inesgotavel<br />
das coisas e dos seres, mas uma 86 e formidavel entidade: 0<br />
Novo Mundo.<br />
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