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procura<br />

194<br />

o. LEVI-STRAUSS<br />

TBISTES TB6PIOOS<br />

195<br />

duma execu~o tao segura quanta os mens, mas, muito freqiientemente,<br />

os motivos eram identicos. Durante todo esse<br />

tempo, 0 estilo, a teeniea e a inspira~o tinham permanecido<br />

inalterados, como fara 0 caso durante os 40 anos transcorridos<br />

entre a visita de Boggiani e a minha. ~sse conservadorismo<br />

e tanto mais notavel quanta DaO se estende a ceramica, a qual,<br />

segundo os ultimos especimes recolhidos e publicados, parece<br />

em completa degeneresc~ncia. Pade-se ver nisso uma prova<br />

da imporW.ncia excepcional que as pinturas corporais, e sobretudo<br />

as do rosto, pagsnem na cuItura<br />

indigena.<br />

Outrora, os motivos eram tatuados<br />

pintados; s6 0 ultimo metodo sub-<br />

FIG. 19 - Outro desenho dQ mesmo au-tOT.<br />

siste. A pintora trabalha silbre 0 rosto ou 0 corpo de uma<br />

companheira as vezes tamMm de um rapazinho.· Os homens<br />

abandonam ~ costume mais rapidamente. Com uma fina espatula<br />

de bambu mergulhada no suco de genipapo - incolor<br />

inicialmente, mas que se torna azul-preto por oxida~ao - a<br />

artista improvisa sobre 0 vivo, sem modelo, esquema ou ponto<br />

de referenda. Ela orna 0 labio superior com urn motivo em<br />

forma de arco terminado nas duas pontas em espirais; depois,<br />

divide 0 rosto por meio de urn tra~o vertical, cortado, as<br />

vezes, horizont.almente. A face, esquartelada, cortada - e ate<br />

talhada obllquamente - e entiio livremente decorada de ara-<br />

bescos que nao levam em conta a localiza!:1io dos olhos, do<br />

nariz, das bochechas, da testa ou do queixo, desenvolvendo-se<br />

como Dum campo continuo. Essas composi~es engenhosas,<br />

assimetricas, sem deixar de manter 0 equilibria, com~am a<br />

partir dum canto qualquer e vao ate ao fim sem hesita~ao nem<br />

corr~ao. Valem-se de motivos relativamente simples, tais<br />

como espirais, -esses, cruzes, maclas, gregas e volutas, mas<br />

combinados de tal maneira que cada obra possui urn carater<br />

original; em 400 desenhos reunidos em 1935, nao observei<br />

dois semelhantes, mas, como fiz a verifica~ao inversa, comparando<br />

minha, cole!;3.o e a que foi recolhida mais tarde,<br />

pode-se deduzir que 0 repert6rio extraordinariamente extenso<br />

das artistas e, apesar de tudo, fixado pela tradi~o. Infelizmente,<br />

DaO foi possivel, nem a mim nem aos meus sucessores, penetrar<br />

a teoria sUbjacente dessa estilistica indigena: os informantes<br />

revelam alguns termos correspondentes aos motivos<br />

elementares, mas invocam a ignorancia ou 0 esquecimento<br />

para tudo 0 que se refere as decora~es mais complexas.<br />

Quer, com efeito, procedam na base de uma tecnica empirica<br />

transmitida de gera~ao em gera~ao; quer desejem guardar<br />

segrMo silbre os arcanOS da sua arte.<br />

Hoje, os Oaduveo se pintam apenas por prazer; mas outrora<br />

0 costume possufa uma significa~ao mais profunda.<br />

Segundo 0 testemunho de Sanchez-Labrador, as castas nobres<br />

traziam pintada apenas a testa, e sbmente 0 vulgo ornamentava<br />

todo 0 rosto; tambem nessa epoca, s6 as m~as seguiam<br />

a moda: "E ra~o", escreve tHe, "que as velhas percam tempo<br />

nesses desenhos: contentam-se com as que os anos gravaram<br />

no sen rosto". 0 missiomlfio se mostra alarmado com esse<br />

desprezo pela obra do Oriador; por que os indigenas alteram a<br />

aparencia do rosto humano? £le I explica~es: sera<br />

para enganar a fome que passam horas tra~ando os seus<br />

arabescos? Ou para se tornar irreconhecfveis aos inimigos?<br />

Tudo 0 que imagina se refere sempre a enganar. Por que?<br />

Qualquer que seja a repugnAncia que experimente, mesmo<br />

o missionario tern consciencia de que essas pinturas guardam<br />

para os indigenas uma importancia primordial e que sao, em<br />

certo sentido, 0 seu pr6prio fim.<br />

Assim, denuncia ele esses homens que perdem dias inteiros<br />

. em se fazer pintar, esquecidos da ca~a, da pesca e de suas<br />

familias. "Par que sois tao estlipidos?" perguntavam aos missionarios.<br />

"E por que somos estlipidos?" respondiam estes<br />

11ltimos. "Porque voces nao se pintam como os Eyiguayeguis".

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