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'r~npI<br />
140 C. LtVI~STBAUSS<br />
Nao reivindicam urn direito A vida; 0 simples fato de sabreviver<br />
lhes parece uma esmola imerecida, mal perdoada pela<br />
homenagem prestada aDs poderosos.<br />
Nao pensam, pois, em se considerar iguais. Mas, meSillO<br />
de s~res humanos DaD se pode suportar essa pressao incessante,<br />
essa engenhosidade sempre alerta em nos enganar,<br />
em nos tapear para obter alguma colsa por trapac;a, mentira<br />
au ronbo. E, entretanto, como endurecer-nos'? Pois - e e<br />
aqui que nao encoutramos saida - todos esses procedimentos<br />
sao modalidades diversas da ora~ao. E e por ser a atltude<br />
fundamental, com rela~o a n6s, a da ora~o, mesmoquando<br />
nos roubam, que a situa~ao e tao perfeltamente, tao totalmente<br />
insuportavel e que nao P0880, por mais envergonhado<br />
que isso me deixe, resistir em confundir os refugiados - que<br />
eseuto 0 dia inteiro, das janelas do men palacio, gemer e chorar<br />
11 porta do Primeiro Mlnlstro em lugar de nos expulsar dos<br />
nossos quartos, que alojariam diversas famflias - com os<br />
corvos negros de mur~a cinzenta que crocitam sem parar<br />
nas arvores de Karachi.<br />
Essa altera~o das rela!:iles humanas parece, de lmclO,<br />
incompreensivel a urn espirito europeu. Concebemos as oposl!:iles<br />
entre as classes sob a forma de luta ou de tensao, como<br />
se a sltua~ao Inlcial - ou Ideal - correspondesse 11 resolu~o<br />
desses antagonismos. Mas aqui, 0 t~rmo de tensao jn nao<br />
tern sentido. Nada esta tenso, ha multo tempo que tndo 0<br />
qne poderla estar tenso ja se rompeu. A ruptura ocorreu no<br />
com~~o, e essa farta de urn "born tempo" a que nos possamos<br />
referir para encontrar-Ihe os vestlglos, ou para desejar 0<br />
seu ret6rno, deixa-nos presa de uma s6 convi~o: t6das essas<br />
pessoas que se cruzam nas ruas estao se perdendo. Para segura-las,<br />
urn momento, na queda, seria suficiente que nos<br />
despojassemos?<br />
E, se se quiser pensar em t~rmos de tensao, 0 quadro a<br />
que se chega nao e menos sombrlo. Porque entiio· seria preciso<br />
dlzer que tudo esta tao tenso que ja nao M equilibrio<br />
possfvel; nos t~rmos do sistema e a menos que se comece<br />
por destruf-Io, a sltua~o se tornou irreversivel De repente,<br />
verno-nos em desequiIibrio diante de suplicantes que e necessario<br />
repelir, nao porque os desprezemos, mas porque nos<br />
aviltam com a sua venera~o, desejando-nos mais majestosos,<br />
mals poderosos alnda, na convlc~o extravagante de que cada<br />
infima melhoria de sua sorte 56 pode provir da nossa, cern<br />
TlUSTES TBOPICOS 141<br />
vezes multlplicada. Como se esclarecem as fontes da crueldade<br />
asiatica1 Essas fogueiras, essas exeeu~es e ~sses suplicios,<br />
essas armas cirurgicas concebidas para infligir ferimentos<br />
incuraveis, nao resultam de um j6go atroz, embelezamento dessas<br />
rela~es abjetas em que os humildes nos transformam<br />
em coisa, por se quererem coisa, e reclprocamente? 0 desnivel<br />
, entre 0 excesso de Iuxo e 0 excesso de miseria estilhaga a<br />
\ dimensao humana. Resta sbmente uma sociedade em que os<br />
.que nao sao capazes de nada sobrevivem 11 espera de tndo<br />
(que sonho bern oriental os genios das Mil e Uma Noltes!)<br />
e em que os que tudo exigem nada oferecem. Nessas condi<br />
~es, nao e surpreendente que rela~es humanas incomensuraveis<br />
as que nos comprazemos em imaginar (com demasiada<br />
freqii~ncia, de forma ilus6ria) que definem a civiliza!;ao<br />
ocidental, nos apa.r~am alternativamente inumanas e subumanas,<br />
como as que observamos ao nivel da atividade infantil.<br />
Pelo menos sob certos aspectos, ffise povo tragico nos parece<br />
infantil: a com~ar pela gra~a dos seus olhares e dos seus<br />
sorrisos. HA tambem a indiferenga a apresenta~ao e ao<br />
lugar, evidente em tOdas essas pessoas sentadas, deitadas<br />
em qualquer sltua~ao; 0 amor pela bugiganga e pelos ouropeis;<br />
a conduta in~nua e complacente de homens que passeiam de<br />
maos dadas, que urinam acocorados em pUblico, e mamam a<br />
fuma~a af;ucarada de seus lichilam"; 0 prestfgio magico dos<br />
atestados e das certidoes, e a crenga comum de que tndo<br />
e possivel, traduzindo-se entre os cocheiros (e mais geralmente<br />
entre todos os empregados) por pretensoes desmedldas<br />
logo satisfeitas com a quarta ou a decima parte. "De que se<br />
queixam?" perguntou urn dia, por intermedio de seu interprete,<br />
0 governador da Bengala oriental aos Indfgenas das<br />
colinas de Chlttagong, roidos pelas doenc;as, pela sub-alimentatao,<br />
pela pobreza e maliciosamente perseguidos pelos mu<br />
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