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334 C. LEVI-STRAUSS 'l'BISTES rn6Plcos<br />
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m~os sao as vitimas principals dessa situa~ao e se v~em condenados,<br />
ou a permanecer solteiros durante muitos arros, OU<br />
a casar-se com viuvas ou velhas repudiadas pelos maridos.<br />
Os Nhambiquara resolvem tamMm 0 problema de outra<br />
maneira: pelas rela~5es homossexuais a que chamam poeticamente:<br />
tamindige kihandige, i8tO e, 0 "amor-mentira".<br />
Tais rela~es sao freqiientes entre as jovens e Gcarrem<br />
com uma pUbIicidade bern maiar que a das rela{;oes normals.<br />
Os pareeiros Dad se retiram para 0 mata, como os adultos de<br />
sexos opostos. Instalam-se junto da fogueira, sob 0 olhar divertido<br />
dos eircullstantes. 0 incidente dB. Ingar a gracejos<br />
geralmente discretos; essas rela~es sao consideradas infantls,<br />
e quase DaD se lhes presta ateo{;3.o. Resta saber se tais exercicios<br />
sao levados ate a satisfa~ao compIeta, ou se se limitam<br />
a efusoes sentimentais, acompanhadas de jogos er6ticos, como<br />
os que caracterizam, em sua maioria, as rela~es entre conjuges.<br />
As rela0es homossexuais somente sao permitidas entre<br />
adolescentes que sejam primos cruzados, isto e, dos quais urn<br />
estA normalmente destinado a casar-se com a irma do outro, a<br />
qual, por conseqliencia, 0 irmao serve provisoriamente de snbstituto.<br />
Quando se procura saber, junto de urn indigena, das aproxima~es<br />
desse tipo, a resposta e sempre a JPesma: "Sao primos<br />
(ou cunhados)' que fazem amor". Na idade adulta, os cunhados<br />
continuam a manifestar uma grande liberdade. Nao e<br />
raro ver dois ou tres homens, casados e pais de familia, passear<br />
de tarde, ternamente enla!:'Ldos.<br />
Quaisquer que sejam essas solu0es de sUbstitul~o, 0 priviIegio<br />
poligftmico que as torna necessarias representa uma<br />
concessao importante feita pelo grupo ao seu chefe. Que signlfica~ao<br />
tern para ~ste ultimo? 0 acesso a jovens e belas<br />
m~as traz-Ihe, antes de mais nada, uma satisfa~o, nao tanto<br />
fisica (pelas rawes jll. expostas) quanta sentimentals. Em<br />
particular, 0 casamento poli@.mico e seus atrlbutos especlficos<br />
constituem 0 melo pIlsto pelo grupo a disposi~o do chefe<br />
para ajudll.-lo a cumprir oS seus deveres. Se f6sse s6, diflcilmente<br />
poderia fazer mais do que os outros. Suas mulheres<br />
secundarias, liberadas pelo estatuto particular das servid5es<br />
do sen sexo trazem-lhe assistencia e reconforto. Elas sao, ao· - __ ;.<br />
mesmo tem~, a recompensa do poder e 0 sen instrnmento. L\', "f,..<br />
Pode-se dizer, do ponto de vista indigena, que 0 premio valer ,r<br />
a pena? Para responder a essa pergunta, temos de encarar 0 j<br />
problema sob urn lingulo mais geral e procurar saber 0 que ~t<br />
o bando nhambiquara, considerado como uma estrntura social<br />
elementar, nos ensina sobre a origem e a fun~ao do poder.<br />
Passaremos rApidamente sobre uma primeira observa~ao.<br />
Os fatos nhambiquara juntam-se a outros para refutar a velha<br />
teoria sociol6gica, temporariamente ressuscitada pela psicanalise,<br />
segundo a qual 0 chefe primitivo encontraria 0 seu prot6tipo<br />
num Pai simMlico, as formas elementares do estado<br />
tendo-se desenvolvido progressivamente, nessa hip6tese, a partir<br />
da familia. Na base das formas mais grosseiras do poder, '<br />
discernimos um passo decisivo, que introduz um elemento novo<br />
com rela~o aos fen6menos biol6gicos: essa dilig~ncia consiste<br />
no consentimento. 0 consentimento e, ao mesmo tempo; a->7)' ~<br />
origem e 0 limite do poder. Rela0es em apar~ncia unilate:' ,'/'/}'<br />
rais, tais como se exprimem na gerontocracia, na autocraci.!:l. '/_A:"'~/......-~<br />
ou qualquer outra forma de governo, podem constituir-se em~~<br />
grupos de estrutura ja complexa. Elas sao inconcebiveis em<br />
formas simples de organiza~ao social, tais como a que tento<br />
aqui descrever. Neste caso, ao contrario, as rela~es politicas (<br />
se reduzem a uma especie de arbitragem entre, por urn lado.<br />
os talentos e a autoridade do chefe, por outro, 0 volume, a<br />
coerencia e a boa-vontade do grupo; todos ~sses fati'>res exercem<br />
uns sobre os outros uma influencia recfproca.<br />
Gostariamos de poder mostrar 0 apOio consideravel que a<br />
etnologia contemporlinea traz, quanto a isso, as teses dos<br />
fil6sofos do seculo XVIII. Sem duvida, 0 esquema de Rousseau<br />
difere das rela~s quase contratuais que existem entre 0<br />
chefe e seus companheiros. Rousseau tlnha em vista urn fe~<br />
nomeno completamente diferente, a saber, a rennncia, pelos<br />
individuos, de sua autonomla pr6pria, em favor da vontade<br />
geral. Nem por Isso e menos verdadeiro que Rousseau e seus<br />
contemporlineos deram prova de uma intui~ao sociol6gica profunda<br />
quando compreenderam que atitudes e elementos culturais<br />
como 0 "contrato" e 0 Hconsentimento" DaO sao forma<br />
~es secundarias, como pretendiam os seus adversArios, e partlCularmente<br />
Hume: Sao materias-primas da vida social, e e<br />
impossivel imaginar uma forma de organiza~o polftica na<br />
qual nao estejam presentes.<br />
Uma segunda observa~ao decorre das considera0es precedentes:<br />
0 consentimento e a base pslcol6gica do poder, mas<br />
na vida cotidiana ele se exprime e encontra a sua medida<br />
num jogo de presta0es e contra-presta0es que se desenrola<br />
entre 0 chefe e seus companheiros, e que faz da no~ao de<br />
reciprocidade outro atributo fundamental do poder. 0 chefe<br />
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