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320 o. LEVI-STRAUSS<br />

TBISTES TR6PICOS 321<br />

donar OS cuidados necessarios, e fui, com dois homens e alguns<br />

animals, ate a esta~ao de Campos Novos, em cuja vizinhan~a<br />

diversos bandos indfgenas tinham sido notados. Ali passei<br />

15 dias em meia ociosidade, empregada em colher, mal maduros,<br />

os frntos de um pomar que se tomara selvagem: goiabas cujo<br />

acre sabor e textura pedrenta sao sempre inferiores aD seu<br />

perfume; e cajns tao vivamente coloridos como papagai4?s,<br />

cuja polpa aspera esconde nas ceIuIas esponjosas urn sueD adstringente<br />

e de g5sto forte; para as refei~oes, bastava ir de madrugada<br />

a um bosque distante algumas centenas de metros do<br />

acampamento, onde pombos selvagens fh~is aD encontro se deixavam<br />

facilmente abater. Foi em Campos Kavos que encontrei<br />

dois bandos vindos do norte, atraidos pela esperan~a dos meus<br />

presentes.<br />

~sses bandos estavam tao mal dispostos entre s1 como com<br />

rela~ao a rolm. Desde 0 inicio, mens presentes foram exigidos<br />

mais que solicitados. Durante os primeiros dias, urn<br />

linico bando ali se encontrava, juntamente com urn indfgena de<br />

Utiariti que viera na minha frente. Guardava He demasiado<br />

interesse por uma jovem pertencente ao grnpo dos seus anfitriOes?<br />

Creio que sim. As rela~oes azedaram-se quase imediatamente<br />

entre os estranhos e seu visitante, e este ultimo<br />

tomou 0 habito de vir ao meu acampamento procurar uma<br />

atmosfera mais cordial, onde partilhava, tamMm, das mlnhas<br />

refei~5es. 0 fato foi observado e um dia em que ele estava<br />

na ea~a, recebi a visita de quatro indigenas formando uma<br />

especie de delega~ao. Num tom amea~ador, convidaram-me a<br />

misturar veneno no alimento do men conviva ; traziam-me,<br />

de resto, tudo 0 que era preciso; quatro pequenos tubos amarrados<br />

com urn fio de algodao e cheios de urn p6 cinzento.<br />

Fiquei atrapalhadissimo: reeusando francamente, expunha-me<br />

it ho>rtilidade do bando, cujas inten0es maleficas me fncitavam<br />

a prndencia. Preferi, pois, exagerar a minha ignorftncia da<br />

lingua e fingi uma incompreensao total. Depois de varias<br />

tentativas, durante as quais me repetiam incansavelmente que<br />

o meu protegido era kakore, muito mau, e que era preciso<br />

desembara~ar-me dele 0 mais depressa possfvel, a delega~ao<br />

se retirou, manifestando 0 seu descontentamento. Preveni 0<br />

interessado, que imediatamente desapareceu; nao devia reve-Io<br />

senaa muitos meses mais tarde, quando voltei a regiao.<br />

Felizmente, 0 segundo bando chegou no dia seguinte e os<br />

indfgenas nele descobriram outro alvo para a sua hostilidade.<br />

o encontro verificou-se no meu acampamento, que era ao mesrno<br />

tempo urn terreno neutro e 0 fim de todos esses deslocamentos.<br />

En estava, pois, de palanque. Os homens vieram<br />

s6s; imediatamente uma longa conversa~ao se entabolon entre<br />

seus respectivos chefes, consistindo antes numa sucessao de<br />

mon610gos alternados, num tom choroso e fanhoso, que en<br />

jamais ouvira anteriormente. "Estamos muito irritados!<br />

Voces sao nossos inimigosJ" gemiam nns; ao que os outros<br />

respondiam mais ou menos: "Nao estamos irritados! Somos<br />

sens irmaos! Somos amigos! Amigos! Podemos entender-nos!"<br />

etc. Terminada essa troea de provoca0es e de protestos, um<br />

aeampamento comum se organizou ao lado do meu. Depois de<br />

alguns cantos e dan~as durante as quais eada grupo depreciava<br />

a sua propria eXibi!';ao comparando-a com a do adversario ­<br />

"Os Tamainde cantam bern! N6s cantamos maU" - a discussao<br />

reacendeu-se e 0 tom nao tardou em se elevar. A TIoite<br />

ainda nao estava muito avanf;ada quando as diseussoes mistnradas<br />

aos cantos faziam urn barulhao extraordinario, enjo<br />

significado me escapava. Gestos de amea~a se esbo~avam, as<br />

vezes, e mesmo ocorriam rixas, enquanto outros indigenas se<br />

interpunham como mediadores. Todas as amea~as consistem<br />

em gestos referentes as partes sexuais. Lm Nhambiquara<br />

demonstra a sua antipatia agarrando 0 membro com as duas<br />

maos e apontando-o para 0 adversario. :f':sse gesto preludia<br />

uma agressao contra a pessoa visada, como para arrancar·lhe<br />

o tufo de palha de buriti amarrado na frente da cintura,<br />

acima das partes sexuais. Estas "estao escondidas pela palha"<br />

e "briga-se para arrancar a palha". Tal a!';ao e puramente<br />

simb6lica, porque 0 estOjo peniano masculino e feito de materia<br />

tao fragil e se reduz a tao pouca coisa que nao garante nem<br />

prote~ao, nem mesmo a dissimula~ao dos 6rgaos. Procuram,<br />

tambem, tomar 0 areo e as fleehas do adversario e jogA-Ios<br />

ao chao. Em tOdas essas condutas, a atitude dos indfgenas<br />

e extremamente tensa, como num estado de c6lera violenta<br />

e contida. Essas brigas degeneram eventualmente em conflitos<br />

generalizados; desta vez, porem, acalmaram-se de madrugada.<br />

Sempre no mesmo estado de irrita~o aparente, e com<br />

gestos rudes, os adversarios passaram entao a examinar-se<br />

miltuamente, apalpando os brincos, os braceletes de algodao,<br />

os pequenos ornamentos de penas, e resmungando palavras<br />

rapidas: "da... da... veja... isso e bonito!", enquanto 0<br />

proprietario protestava: "E feio velho... estragadoL .."<br />

Essa inspeQao de reconciliagao marea 0 fim do conflito.<br />

Com efeito, introduz ela ontro genero de rela!';Oes entre os<br />

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